Por Carmo Rodeia
Há cerca de um mês entrevistei o Professor Eduardo Lourenço para um trabalho no âmbito do meu serviço no santuário de Fátima. Para além de várias coisas, quando lhe perguntei o que pensava de Deus ele respondeu-me prontamente que o importante não era o que ele pensava de Deus mas sim o que Deus pensava dele. E eu acrescentaria de nós.
É uma pergunta que às vezes faço, se calhar erradamente, mas tem a ver com o meu sentido de vida e sobretudo com uma necessidade compulsiva de revisão permanente de vida não tanto centrada no que fiz de errado (que também é importante) mas do que posso fazer para melhorar. Sem ter a pretensão de não voltar a errar, e sempre muito consciente da minha miséria. E também que Deus me ama como sou, com as minhas imperfeições.
Aos 50 anos, acabadinhos de chegar, são mais as interrogações do que as respostas. Por isso, às vezes, colocando-me no lugar de um jovem de 17 ou 18 anos, que deve fazer uma escolha, por vezes um pouco até fora da corrente, julgo que não seja fácil. E muito menos para quem decide entregar uma vida aos outros e viver da partilha dos outros.
Vem isto a propósito da chamada vocação. E, neste caso concreto, da vocação sacerdotal.
Na verdade, o significado da palavra vocação é bastante amplo e tem a sua origem no verbo latino vocare, que significa “chamar ou chamamento”. No âmbito religioso, trata-se de um chamamento que provém de Deus. Portanto, compreender a vocação como um dom é reconhecer que, em todas as circunstâncias, Deus nos chama a viver e realizar o seu projeto de amor. Não com uma voz pequenina como a da consciência tantas vezes ridicularizada nos filmes animados mas com uma voz grossa e doce que diz preciso de ti; é aqui que és preciso.
Por isso, vocação é dizer sim a Deus, pela fé, descobrir o próprio lugar no mundo, na Igreja de hoje e no serviço aos irmãos.
É este sentir da vocação que faz a diferença no Nelson Pereira e que também fez a diferença no Jacob Vasconcelos e em todos os outros que têm sido ordenados.
A igreja necessita destes jovens: gente arejada, inserida no mundo mas suficientemente livre para hoje estar num lugar e amanhã estar noutro, nessa enorme arte do desprendimento, em que o que fica de cada vez que vão embora é o que deram e o que receberam.
Em 2015, no final de um encontro que celebrou os 50 anos da promulgação de dois decretos Optatam totius (sobre a formação sacerdotal) e Presbyterorum ordinis (sobre o ministério e vida dos presbíteros), o Papa Francisco sublinhava que “a vocação sacerdotal é um presente que Deus dá a alguns para o bem de todos”.
Ele expôs o seu pensamento em três partes, inspiradas na Carta aos Hebreus: “tirado do meio dos homens”, “constituído em favor dos homens”, “em meio aos irmãos”.
Ao recordar que a família é, por excelência, o fundamental “centro de pastoral vocacional”, Francisco disse que um bom padre é, antes de tudo um homem com a sua própria humanidade, que conhece a sua própria história.
“Um padre não pode perder as suas raízes, permanece sempre um homem do povo e da cultura que o geraram. As nossas raízes ajudam-nos a recordar quem somos e onde Cristo nos chamou”, reforçou o Pontífice. E prosseguiu: “Nós sacerdotes não caímos do céu, mas somos chamados por Deus, que nos tira do meio dos homens, para nos constituir em favor dos homens”.
“Aí está um ponto fundamental da vida e do ministério dos presbíteros. Respondendo à vocação de Deus, se tornam padres para servir aos irmãos e irmãs”, recordou o Papa.
“Torna-se sacerdote para estar no meio do povo. O bem que os padres podem fazer nasce, sobretudo, da sua proximidade e de um tenro amor pelas pessoas. Não são filantropos ou funcionários, mas pais e irmãos”.
O Nelson, daquilo que conheço, personaliza este dom de forma discreta mas atenta. Promove a relação e o encontro deixando espaço para o outro. Não tenho dúvidas de que será um bom pastor que saberá, em cada momento, cheirar as suas ovelhas e entranhar-se desse cheiro.
O resto virá com o tempo, com a experiência e com tudo o resto.
Parabéns ao Nelson, a partir de amanhã Pe. Nelson.