Vigário Episcopal para o Clero desafia romeiros a “muscular a alma” para o perdão

Foto: Igreja Açores/CR

Retiro dos Romeiros de São Miguel reuniu duas centenas e meia de dirigentes para aprofundar a Teologia do Perdão

Os padres José Júlio Rocha, Vigário Episcopal para o Clero e Formação e Rui Silva, assistente do Movimento dos Romeiros de São Miguel, proferiram esta manhã duas reflexões sobre o perdão, durante o Retiro anual de preparação para as romarias quaresmais, que decorreu na Lagoa, em São Miguel e contou com a participação de cerca de duas centenas e meia de romeiros.

Mendigos do perdão foi o tema geral para as duas meditações centradas no perdão e no seu anúncio, como atitude evangelizadora.

“Há uma espiritualidade cristã em São Miguel iminentemente masculina que se expressa nestas romarias quaresmais. Esta espiritualidade viril que aguenta tudo- o frio, a noite, o vento, as dores, os pés e a intempérie, qualquer que ela seja- tem de vos dar uma alma musculada para perdoar” afirmou o padre José Júlio Rocha desafiando os romeiros a “perdoarem sempre” primeiro a “si próprios” e depois “aos irmãos”.

“O nosso maior inimigo, por vezes, somos nós próprios e só conseguimos perdoar os outros se nos perdoarmos a nós próprios”, conhecendo limites e abrindo o coração para amar.

O sacerdote terceirense, que já é uma das presenças mais regulares neste retiro que inicia a preparação para as romarias quaresmais dos 54 ranchos que saem anualmente em São Miguel, aos quais se juntam mais dois da diáspora açoriana, dos EUA e do Canadá, partiu do diálogo entre Pedro e Jesus sobre o perdão.

“Esta passagem da Bíblia, de que devemos perdoar 70X7, seria uma daquelas páginas que metaforicamente falando rasgaríamos de bom grado pois o nosso Cristianismo estaria facilitado” afirmou o padre José Júlio Rocha.

“Com esta resposta Jesus lança o substrato da humanidade para uma categoria de vida que não tem paralelo na condição humana e o que nos diz é que o perdão, seja na família seja na amizade, é a melhor forma de amar”.

“Amar é perdoar” enfatiza lembrando que, para isso, é preciso que os cristãos “se abram à graça de Deus” e mesmo sendo difícil “só o perdão liberta”.

“Não perdoar ou odiar é exatamente o mesmo que tomar o veneno para que outro morra”, disse ainda.

“Quem não tem capacidade de perdoar fica com um nó na alma; só quem perdoa vence” concluiu referindo que o perdão deve ser o primeiro ensinamento da Igreja, onde cabem “todos”, sem que se estabeleçam requisitos para o acolhimento.

O sacerdote terminou a sua reflexão pedindo aos romeiros para fortalecerem esta capacidade na Romaria de forma a que a possam anunciar ao mundo através de uma inserção plena  na vida comunitária.

A segunda reflexão a propósito da Teologia do Perdão foi proferida pelo padre Rui Silva, que é o assistente espiritual do Movimento.

“Todos nós somos mendigos do perdão e num mundo exausto de desamor é necessário, cada vez mais cristãos, que tenham a consciência da  importância do amor para o mundo” disse o sacerdote destacando que o perdão resulta do amor.

“Os romeiros são homens de garra, que sabem ultrapassar as dificuldades que encontram pelo caminho, as dores do corpo e da alma, mas aí aprendem a ser mais de Deus, do mundo e dos outros”, afirmou o sacerdote.

Ao falar do romeiro como “um anunciador de perdão” o padre Rui Silva lembrou que o movimento está cada vez mais comprometido com a vida comunitária e isso faz com que seja cada vez mais um movimento evangelizador.

“O romeiro é o que está no mundo, o que caminha e que pela sua experiência do caminho, se abre e partilha com o outro”, concluiu.

Este retiro anual, dirigido sobretudo aos responsáveis de grupo, realiza-se sempre no último fim-de-semana do mês de janeiro e marca o inicio mais formal da caminhada preparatória da Romaria, que sai para a estrada no primeiro sábado da Quaresma. Os últimos ranchos recolhem na quinta-feira Santa, para a missa da Ceia do Senhor, onde se repete esse gesto do lava-pés, como Jesus fez aos discípulos na Última Ceia.

As romarias quaresmais acabam de completar 500 anos e são uma das expressões da espiritualidade de São Miguel. Grupos de homens percorrem as estradas de São Miguel, de terço na mão, a rezar, tocando todos os lugares marianos e recolhendo as intenções que com eles vão sendo partilhadas ao longo da estrada, sobretudo dentro das localidades.

Durante uma semana, começando a andar antes do nascer do sol e terminando ao pôr do Sol, são acolhidos pelas famílias ou em suas casas ou em espaços improvisados para dormir.

Também já existem grupos de romeiros nas ilhas Terceiras, Graciosa e São Jorge e também já existem grupos de romeiras, embora esta forma de espiritualidade seja tradicionalmente masculina e de são Miguel.

 

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