Vaticano propõe “revolução” para devolver os idosos a um ambiente doméstico

O Vaticano defende, num documento divulgado hoje, uma “revolução” na forma de tratar os idosos, devolvendo os mais velhos a um ambiente doméstico e familiar, após a pandemia.

“Precisamos de uma nova visão, um novo paradigma que permita à sociedade cuidar dos idosos”, refere o texto da Academia Pontifícia para a Vida (APV), organismo da Santa Sé, sublinhando que o impacto da Covid-19 nos lares alertou para a necessidade de “humanizar” a assistência aos idosos.

O organismo cita o ensinamento do Papa Francisco sobre os mais velhos e propõe “um novo modelo de atenção e assistência aos idosos mais fragilizados”.

“Existe, antes de tudo, o dever de criar as melhores condições para que os idosos possam viver esta fase particular da vida, tanto quanto possível, no seu ambiente familiar, com as amizades habituais”, sustenta a APV, num documento intitulado ‘A velhice: o nosso futuro. A situação dos idosos após a pandemia’.

O Vaticano convida as comunidades religiosas e a sociedade civil a “sugerir e apoiar” esta “revolução coperniciana”, promovendo uma “viragem cultural”.

Em causa, pode ler-se, estão “medidas novas e incisivas para permitir que os idosos sejam acompanhados e assistidos em ambiente familiar, no domicílio” e, seja qual for a sua situação, em “ambientes domiciliares que se pareçam mais com uma casa do que com um hospital”.

“A pessoa, portanto, deve ser o coração desse novo paradigma de assistência e cuidado aos idosos mais fragilizados”, acrescenta o organismo da Santa Sé, destacando que, durante a primeira onda da pandemia, “uma parte considerável das mortes causadas pela Covid-19 ocorreu em instituições para idosos”.

D. Vincenzo Paglia, presidente da APV, mostrou-se particularmente crítico da situação, durante a conferência de imprensa de apresentação do documento: “Infelizmente, a Covid mostrou a tragédia de uma sociedade que faz viver mais, mas descarta mais ainda. Os dados são terríveis, em todos os continentes”.

“Até ao momento, fala-se em mais de 2,3 milhões que morreram de Covid-19, a maioria com mais de 75 anos; e a maior parte destes, falecidos nas instituições que os recebiam. Podemos falar verdadeiramente de um massacre de idosos”, disse o arcebispo italiano.

A APV alerta para os efeitos da “cultura do descarte”, denunciada pelo Papa, que se manifesta “na preguiça e na falta de criatividade para procurar soluções efetivas, quando a velhice também significa falta de autonomia”.

“Se alguns idosos escolhem, por conta própria, mudar-se para asilos e ali encontrar companhia, quando estão sozinhos, outros fazem-no porque a cultura dominante os leva a sentir-se um fardo e um incómodo para os seus filhos ou família”, afirma.

O Vaticano considera “impressionante” o número de mortos entre pessoas com mais de 65 anos e alerta para o impacto da “solidão e o isolamento” entre os mais velhos.

O documento propõe que os lares de idosos ofereçam serviços “diretamente no domicílio dos idosos” para promover “um atendimento integrado e de qualidade”.

A mensagem destaca o impacto de “barreiras arquitetónicas” e da “desadequação de instalações sanitárias” nas casas dos idosos, convidando a uma “aliança de gerações”.

“É importante inverter a tendência, mesmo com planos cuidadosos que promovam a atenção e o cuidado tanto no aspeto civil como no eclesial, para que quem envelhece não fique sozinho”, refere a APV.

O Vaticano convida os idosos a ver nesta fase da sua vida “a idade propícia para o abandono a Deus” e destaca que a fragilidade dos mais velhos é “provocadora”, desafiando os mais novos a “aceitar a dependência dos outros como forma de enfrentar a vida”.

O documento foi apresentado em conferência de imprensa, online, na qual se alertou para os impactos psicológicos dos sucessivos confinamentos provocados pela pandemia.

D. Vincenzo Paglia foi nomeado em 2020, pelo ministro da Saúde da Itália, como responsável por uma comissão para a “reforma sanitária e assistência social e de saúde da população idosa”.

 

 

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