Estudo revela números preocupantes e respostas sociais no terreno são insuficientes
Nove em cada dez idosos têm alterações cognitivas que sugerem demência, segundo um estudo integrado no projeto VIDAS – Valorização e Inovação em Demências.
Os lares não estão preparados para cuidar das pessoas com demência, denunciou o responsável da União das Misericórdias pela área da saúde, que defende uma mudança de paradigma com mais formação, mudanças arquitectónicas e apoio domiciliário mais forte.
O psiquiatra Manuel Caldas de Almeida apontou que o envelhecimento da população é um facto, do qual decorre que algumas pessoas tenham demência e outras grandes dependências físicas.
Um estudo da União das Misericórdias Portuguesas (UMP), integrado no projecto VIDAS – Valorização e Inovação em Demências, concluiu que 90% dos idosos nos lares tem alterações cognitivas que sugerem demência, sendo que dentro deste grupo, 78% tem efectivamente demência.
O estudo, que demorou cerca de dois anos, envolveu 1.503 idosos de 23 instituições, avaliados por psicólogos e neurologistas para detectarem a existência de demências e o seu grau.
Caldas de Almeida enfatizou que não é o facto de um idoso estar num lar que provoca demência, já que se trata de uma doença crónica, mas apontou que a evolução da doença e a velocidade a que ela se faz “pode ter a ver com ambientes estimulantes”.
“Se nós tivermos lares em que as pessoas não são trabalhadas, não têm ambientes estimulantes, em que não há actividades lúdicas, actividades de estimulação, então as pessoas que têm demência podem parecer estar numa fase mais avançada, podem ficar mais lentificadas, mais tristes, podem ficar com a demência mais avançada”, apontou o psiquiatra à agência Lusa.
Nesse sentido, defendeu uma aposta em ambientes estimulantes, com neuropsicologia adaptada e onde haja profissionais competentes para que as pessoas com demência tenham melhor qualidade de vida e a doença evolua mais lentamente.
Mudar o paradigma
Sustentou, por isso, que “é urgente” mudar o paradigma dos lares, apostando num apoio domiciliário “mais forte”, ao mesmo tempo que se fazem mudanças arquitectónicas nas instituições que acolhem estas pessoas.
Segundo Caldas de Almeida, são duas as prioridades: renovar tecnicamente os lares para ficarem adaptados às pessoas com demência e apostar na formação.
“Sabe-se que profissionais qualificados, profissionais com competência relacional para tratar as pessoas com demência, previnem em 90% as reacções secundárias, que são a agitação e a agressividade, as alucinações”, apontou.
Acrescentou que é possível, sem medicamentos, melhorar muito a qualidade de vida destas pessoas se, quem estiver com elas, souber estar, o que faz com que a formação seja uma “arma fundamental”.
“Se não fizermos isto, há muita gente a sofrer em Portugal porque estamos a prestar cuidados inadequados”, apontou Caldas de Almeida.
Admitiu, por outro lado, que há uma percentagem muito elevada de pessoas com demência em fase inicial a quem não é reconhecida a doença e explicou que isso acontece não só porque quem as acompanha não está alerta para os sinais iniciais, mas também porque as pessoas com demência tentam esconder os seus problemas.
O responsável referiu que no decorrer do projecto VIDAS foi dada formação a 480 pessoas, durante mais ou menos um ano, entre auxiliares, médicos, terapeutas e dirigentes, vindos de 23 instituições.
Além disso, foi também feito um trabalho de levantamento das necessidades arquitectónicas e a conclusão foi a de que só uma das 23 instituições não era adaptável às necessidades das pessoas com demência.
(Com RR e Lusa)