Por Carmo Rodeia
As parábolas são textos fantásticos. Não sou teóloga mas na minha maneira de ver a do Filho Pródigo é quase uma parábola síntese do essencial da verdade de Deus: o Amor.
Volto ao tema não por qualquer estado de alma, mas porque sim. Gosto das parábolas. De umas mais do que de outras, embora não tenham sido feitas para que nós gostássemos essencialmente delas.
Uma parábola é uma história que tem sentido até um determinado ponto mas que depois, à luz do nosso tempo, perde alguma lógica, sobretudo porque nos desconcerta.
Importa, também, dizer que a linguagem das parábolas não é a do catecismo e ainda bem. Mais do que nos ensinar as boas maneiras, as palavras que as parábolas contêm são uma provocação, que põe em causa, desde logo, todas as formulações e certezas que cada um de nós tem, em cada momento da sua vida. E, talvez, por isso, as parábolas contêm sempre algo de subversivo, tal como todas as palavras de Jesus.
A do filho pródigo não é exceção, embora faça quase sempre sentido.
Um pai que tem dois filhos; um problema familiar que gera um conflito, e um deles, o mais novo, mais impulsivo, que decide partir. Até aqui nada de novo. A história faz parte da vida das famílias. Contudo, quando o filho volta o pai toma uma atitude absolutamente inédita, e é aí que a história deixa de ser comum. E, se calhar de fazer sentido, aos olhos humanos. Ele abre os braços e até o permeia, para desconforto e incompreensão do filho bem comportado, que ficou ao lado do pai.
Os dois filhos somos nós, os homens e as mulheres que numa lógica humana temos dificuldades em compreender que o mal seja premiado e o bem seja preterido.
Esta é a parte em que Jesus nos desinstala do nosso conforto e por isso somos levados a pensar que a história deixa de fazer sentido. É aqui que entra a essência da parábola: o reino de Deus é diferente e pede de nós uma atitude diferente.
Através das parábolas Jesus desafia-nos a sairmos do conforto através de um discurso “extravagante” como lhe chamava Paul Ricoeur e essa extravagância é de uma simplicidade desconcertante, que no caso desta parábola, é o Amor. Não julgar, abrir o coração, aceitar sem reservas, acolher, incluir, não rejeitar, não censurar… são verbos que conjugam bem com este Amor que Deus nos desvenda através da parábola do Filho Pródigo, uma parábola escrita no século I, tão bem interpretada por um pintor do século XVII, Rembrandt e que nos convoca de uma forma tão especial neste século XXI, onde estamos manietados por julgamentos, tabus e preconceitos que nos impedem de Amar, mesmo quando instados especialmente pelo Jubileu da Misericórdia.
A mensagem desta parábola é consoladora porque nos conta uma história, uma verdadeira história de Amor. Um Amor que não é um prémio para os bem comportados, segundo um conjunto de convenções. Um Amor que é antes de mais um convite para a grande festa de Deus, revelada em gestos.
É tão bom sabermos que Deus está sempre pronto para encontrar uma fenda na nossa armadura e mudar a nossa visão das coisas.
As parábolas também criam essa oportunidade, porque nos convidam à transformação, a única atitude que nos pode levar à conversão. Prometo não falar mais sobre o assunto, embora ainda me sinta nesta festa.