O Papa Francisco completa hoje 10 anos de pontificado, um dia de celebração do papado mas também de análises e comentários ao seu papel, ação e intervenção na Igreja Católica e também na sociedade.
“Estes 10 anos correspondem a dezenas de anos, noutros pontificados. Tudo aquilo que aconteceu, mas, sobretudo, o dom e a graça da sua pessoa e de ele ser dócil ao Espírito Santo para este tempo, ser um homem da coragem da esperança, de construtor de pontes, da fraternidade, da amizade, deste dilatar do coração, e que nos contagia a todos é inspirador no exercício do meu ministério”, disse o arcebispo de Braga à Agência ECCLESIA.
O cardeal Jorge Mario Bergoglio, então arcebispo de Buenos Aires, foi eleito como sucessor de Bento XVI a 13 de março de 2013, após a renúncia do Papa alemão, assumindo o inédito nome de Francisco; é também o primeiro Papa jesuíta e o primeiro pontífice sul-americano na história da Igreja.
“Como ele tanto sublinha nos encontros pessoais, e que nos anima na coragem, na confiança, na humildade da nossa própria missão e de propor o Evangelho a partir do próprio Evangelho, não é das nossas teorias ou das teses, ideias iluminadas, mas a partir do seguimento de Cristo”, sustentou D. José Cordeiro.
O arcebispo de Braga revela que, às vezes, quando sente “algum cansaço” se e lembra de imediato do Papa Francisco, que o renova “também nessa esperança” que lhe faz experimentar que “tudo é graça”.
D. José Cordeiro aponta à JMJ Lisboa 2023, como um momento de esperança para toda a Igreja.
“O Papa Francisco ao ser o primeiro peregrino a inscrever-se para a Jornada Mundial da Juventude, e na celebração do 10.º aniversário, marca um tempo novo, uma mudança de época”, refere.
O arcebispo de Évora começa por contextualizar que “na história da Igreja não é fácil haver marcas que fazem mudanças irreversíveis”, é uma a história “muito marcada pela continuidade”, e o Papa Francisco, sem quebrar a continuidade, “conseguiu com testemunho de vida sobretudo, e com sinais”, fazer uma marca de tal modo evidente que “a Igreja não vai ser mais a mesma no seu modo de estar e de fazer que vinha sendo”.
“Isso significa a nível de história da Igreja muitíssimo, é necessária uma grande capacidade de visão e, ao mesmo tempo, de compreensão do presente para deixar uma marca tão profunda, não digo que faz uma rutura, mas obriga a uma revisão tão profunda de ser Igreja”, assinalou D. Francisco Senra Coelho, em declarações à Agência ECCLESIA. O arcebispo, historiador da Igreja, explica que aquilo que caracteriza a Companhia de Jesus (Jesuítas), no contexto do Concílio de Trento (1545-1563), quando nasceu, na época das “reformas, que foram as Igrejas surgidas a partir de Lutero, Calvino, Zuínglio [Ulrico Zuínglio teólogo suíço e principal líder da Reforma Protestante na Suíça] e Henrique VIII, é de facto muito saliente neste Papa Jesuíta”. “Ele vai à grande dimensão do seu carisma que é a reforma da Igreja, e uma reforma não na sua epiderme, no seu exterior, mas no seu mais íntimo, a reforma na evangelização da Igreja. O que o Papa Francisco está a fazer é a evangelização na própria Igreja, que somos nós, exigindo a nossa conversão, num caminho de muita autenticidade e seriedade como ele próprio dá testemunho e dá exemplo”, desenvolveu. O arcebispo de Évora destaca também “sinais muito fortes”, que são a sua radicalidade na exigência da verdade, “na economia da Igreja, nomeadamente no Estado do Vaticano, e em todas as dioceses”, na questão da pedofilia, da violência sexual contra as crianças e os abusos contra as pessoas fragilizadas. “E compreendemos como a sua coragem é extraordinariamente importante para imprimir à Igreja um caminho de conversão. Só temos de pedir a Deus a sua saúde, a sua coragem, no sentido de vencer todas as dificuldades porque uma reforma da Igreja implica mexer com poderes instalados”, referiu D. Francisco Senra Coelho, apontando que o Papa Francisco, “só vai ser plenamente percebido daqui a muitos anos”, quando existir distância histórica. |
Para João Manuel Duque, pró-reitor da Universidade Católica Portuguesa (UCP), existe muita coisa a destacar de 10 anos de pontificado, “até do seu ponto de vista teológico, da sua posição”, são percursos teológicos já conhecidos, mas que “se tornaram agora mais no coração romano da Igreja através do Papa Francisco”.
“Muito pessoalmente, aprecio de uma forma especial a descontração, a sua mão firme também, é certo, mas a descontração com que assume a tarefa do Papado”, partilhou o teólogo do Centro Regional da UCP em Braga.
João Manuel Duque explicou que a “imagem demasiado estática, e até quase absoluta do Papado”, que se colocavam nos Papas em todos os anteriores, “em certa medida, são frutos do seu tempo”, tornou-se agora “mais descontraída”, o que “é muito benéfico para a Igreja que alivia o peso também da centralidade romana e do peso romano”.
Já o assistente do Serviço Nacional da Pastoral do Ensino Superior (SNPES) fala em “10 anos de grande relevância”, e o Papa Francisco “abanou a estrutura muito no seguimento, daquilo que o Papa Bento já vinha a fazer”, isto é, a colocar um sopro do Espírito Santo muito vivo, muito dinâmico na Igreja.
“É preciso abanar a Igreja. Eu creio que o Papa Francisco vem precisamente fazer isso ou veio precisamente e está precisamente com os diferentes sínodos. Recordo muito bem o Sínodo dos Jovens, em 2018, dedicado aos jovens, à fé e ao discernimento vocacional, em que ele convocou os jovens a participar, o que é que os jovens querem dizer à Igreja”, assinalou o padre Eduardo Duque.
O sacerdote da Arquidiocese de Braga destaca que Francisco convocou um sínodo “para ouvir o que é que os jovens têm a dizer”, e, agora, com o sínodo sobre a sinodalidade, que a Igreja Católica vive desde outubro de 2021, até ao mesmo mês de 2024, “ele quer uma Igreja comunhão”.
“Nós, muitas vezes, somos uma Igreja bastante enclausurada, em salas muito distantes, muito fechadas, muito egoístas. Isso é uma forma de escorregarmos quase para aquilo que a sociedade quer”, observou.
Neste contexto, o padre Eduardo Duque, professor na Faculdade de Filosofia e Ciências Sociais da UCP, no Centro Regional de Braga, afirma que a sociedade não está preocupada, “ou parte da sociedade, possivelmente não lhe interessam os valores da Igreja”, mas se a Igreja quer estar a acompanhar os tempos de hoje, “tem de falar a gramática dos jovens, tem que falar a gramática dos tempos contemporâneos”.
“Creio que é essa a linguagem que o Papa Francisco tem trazido. Tem trazido uma grande abertura de ar fresco à Igreja. Talvez seja necessário, agora, cada um de nós, perceber, entrar na dinâmica do Santo Padre, isto tem de ser uma dinâmica conjunta, isto não poder ser de uma, de duas, ou três pessoas, ou estruturas”.
Jorge Mario Bergoglio nasceu em Buenos Aires, capital da Argentina, a 17 de dezembro de 1936; filho de emigrantes italianos, trabalhou como técnico químico antes de se decidir pelo sacerdócio, no seio da Companhia de Jesus, licenciando-se em filosofia e teologia.
Tem como lema ‘Miserando atque eligendo’, frase que evoca uma passagem do Evangelho segundo São Mateus: “Olhou-o com misericórdia e escolheu-o”.
Ondina Matos, leiga da Diocese de Aveiro, considera que o Papa Francisco veio trazer “uma proximidade grande da Igreja em relação à figura do Papa”, uma Igreja mais próxima das pessoas, “que tem uma preocupação real com as pessoas”.
Em declarações à Agência ECCLESIA, explicou que a marca desta Papa é a de uma “Igreja que se preocupa verdadeiramente com as pessoas” e uma Igreja que olha para fora de si”.
“Duas marcas que vejo no Papa Francisco: Vê a Igreja muito preocupada com a realidade das pessoas e uma Igreja em saída”, sublinhou a entrevistada que integra o Comité Organizador Diocesano (COD) de Aveiro para a JMJ Lisboa 2023.
(Com Ecclesia)