Por Carmo Rodeia
O papa voltou a elogiar o papel da mulher na igreja. Desta feita na Geórgia perante um rebanho pequeno, composto maioritariamente por mulheres- mães e avós- Francisco elogiou o papel das mulheres na transmissão da fé cristã, ao longo dos séculos.
E não é a primeira vez que o faz.
“Os dotes de delicadeza, sensibilidade e ternura peculiares, que enriquecem o espírito feminino, representam não apenas uma força genuína para a vida das famílias, para a propagação de um clima de serenidade e de harmonia, mas uma realidade sem a qual a vocação humana seria irrealizável. E isto é importante! Sem estas atitudes, sem estes dotes da mulher, a vocação humana não consegue realizar-se!” disse o Papa argentino, num vídeo sobre a importância das mulheres publicado em maio de 2016.
E, não é difícil compreender este papel se olharmos para a história da humanidade cristã: elas foram “as primeiras” testemunhas da ressurreição. Perante o túmulo vazio, os apóstolos e os discípulos não acreditavam [que Cristo tinha ressuscitado], mas as mulheres, sim.
A própria história do cristianismo tem sido uma história de criação, de reconhecimento, de espaço de liderança e de protagonismo, de histórias de vida e de renovação encabeçadas por mulheres. Se olharmos a história da igreja é impossível não ver os grandes marcos que o feminino tem representado no seu interior.
Basta pensarmos em Edith Stein, uma das grandes filósofas do século XX, mártir que morreu em Auschwitz, ou na frágil Teresa de Calcutá, testemunha da caridade e da esperança no mundo actual e por isso santa. Só para ficar em dois exemplos.
“Porque é que uma presença tão grande e significativa de mulheres na Igreja não incidiu nas suas estruturas?”
A pergunta não é minha. Foi feita pelo Pontifício Conselho da Cultura em janeiro, deste ano, ao que julgo.
“Porquê atribuir à mulher na prática pastoral só aquelas tarefas que lhes atribui um esquema algo rígido de resíduos ideológicos e ancestrais? O que é que não funciona hoje, quando a imagem de mulher que têm os homens da Igreja já não corresponde, em geral, à realidade?”, prosseguia o Pontifício Conselho da Cultura.
E a resposta veio do próprio Conselho: “o terreno está minado pelo preconceito e enraizado em posições ancestrais alimentadas com o combustível da tradição e de uma excessiva presença masculina, muitas vezes refratária a qualquer confrontação, que mais não faz do que propor soluções a partir de esquemas masculinos”.
Na última eucaristia a que presidiu na diocese de Angra, ainda como bispo diocesano, D. António de Sousa Braga referiu-se à necessidade de se encontrar um novo ministério para as mulheres.
O Papa Francisco não se cansa de o afirmar. E lança o debate, com frequência, na esfera pública. Nós é que, não raras vezes, assobiamos para o lado. Quando fazemos orelhas mocas é porque não nos interessa ou porque não concordamos e empurramos para a frente, à espera que o tempo resolva.
Quem sabe poderíamos começar um debate sério esforçando-nos por tratar de captar e compreender a especificidade feminina, ao considerar temas como função, papel, dignidade, igualdade, identidade, liberdade, violência, economia, política, poder, autonomia, etc. Não se trata de uma questão de cargos, nem de género…mas um caminho.