Pelo padre Hélder Miranda Alexandre
Uma recente instrução da Congregação para o Clero – “A Conversão Pastoral” – apresenta-se como um convite dirigido às comunidades cristãs em ordem a uma conversão pastoral no sentido missionário. Identifica um conjunto de propostas, não certamente exaustivas (poderia ter ido mais além) para uma conversão pastoral em sentido missionário, para que as comunidades paroquiais saiam de si mesmas, “oferecendo instrumentos para uma reforma, também estrutural, orientada num estilo de comunhão e de colaboração, de encontro e de proximidade, de misericórdia e de solicitude para o anúncio do Evangelho” (n.2). Pode ser um ótimo mote para suscitar uma reflexão desafiadora no modo como somos Igreja nestas Ilhas.
Ora, um dos critérios pedagógicos para se entender se um aluno percebeu a matéria é convidá-lo a dar um exemplo concreto. Se ele não for capaz de concretizar dá um sinal claro ao professor que não percebeu ou que este não ensinou como devia. Seria presunção da minha parte querer dar orientações, mas estou convencido que as histórias concretas são eloquentes. Mais do que muitos projetos, indicam como poderemos concretizar e ser uma Igreja comunitária, integradora, missionária… Atentos aos sinais dos tempos descobrimos como o Espírito Santo nos ensina.
A surpreendente história de Carlo Acutis, que morreu em Monza no dia 12 de Outubro de 2006, com apenas 15 anos, beatificado no passado dia 10 de Outubro, põe-nos de sobreaviso que a santidade, ao pé da porta, é possível. Um enamorado do Cristo vivo, apaixonado pela Eucaristia. Carlo era um garoto absolutamente normal. Usava o computador, brincava com os amigos… A única grande diferença é que havia colocado no centro de seu dia o encontro com Jesus Eucarístico. Em cada dia dedicava-se à adoração antes ou depois da missa, na qual participava diariamente.
Experto nas novas tecnologias, lugar comum dos jovens mileniais, elaborou um site dedicado aos milagres eucarísticos: http://www.miracolieucaristici.org/it/Liste/list.html. Esta devoção tornou-se fecunda. Desde a infância mostrou uma grande caridade para com o próximo. Extraordinário foi seu amor, antes de tudo, pelos pais e depois pelos pobres, os sem-teto, os marginalizados e os idosos abandonados e solitários, usando as suas as economias para ajudar os mendigos e aqueles que dormiam ao ar livre. Organizava feiras na paróquia para ajudar as missões com os fundos arrecadados.
A santidade está por aí, santos ao pé da porta (Papa Francisco), nos pais e mães que se gastam num amor incondicional, nos jovens que estudam e brincam nas nossas escolas, nos trabalhadores, por vezes com dois empregos de ordenado mínimo, nos cristãos autênticos, anónimos, dedicados em serviço, mas conhecidos pelo Pai. Não são assim tão raros. Tenho-os encontrado em abundância. Essa é a Igreja que vive no terreno, mesmo que por vezes afastada dos centros e estruturas. Elie Wiesel, prémio nobel da paz de 1986, afirmava que os anjos, depois de aparecerem a Jacob descendo de uma escada que unia o céu e a terra, esqueceram-se de retirá-la. Essa é a escada musical que pode conduzir da terra ao céu.
Recentemente tivemos a oportunidade de nos reunirmos nos Conselhos Pastoral e Presbiteral. Realizaram-se análises e estudos, surgiram propostas, alimentaram-se sonhos. Acreditamos que temos muito a caminhar “sinodalmente”. Não faltam críticas, dedos apontados às suas debilidades, ou à sua ineficácia, que existe em parte e não se pode negar. Mas não se pode navegar num descrédito que se semeia, como joio, a que nos vamos acostumando, infelizmente. As oportunidades surgem e não acreditamos nelas. Outras virão e serão escorraçadas. Não será isto uma falta de fé tremenda? Eu não acredito numa Igreja que desconfia de si própria, nem quero fazer parte desse cinzentismo.
No fundo, tudo é tão simples. Quem quer avança! Nada nos impede. E isso não é assobiar para o lado, mas comprometer-se com alegria.