Por Carmo Rodeia
Hoje, quando se fala de padres, a ideia que nos vem à cabeça é a de crise. Pela redução do número de vocações sacerdotais, mas também pela forma como se olha para este ministério, que perdeu muito do seu poder simbólico. Até a própria maneira como os padres olham para si próprios se alterou e reflete, naturalmente, novas interrogações e caminhos distintos dos percorridos até agora, embora mais na forma que na substância.
Tenho para mim que à medida que a representação sociológica do padre diminui, cresce, por outro lado, a dimensão humana, a procura de alguém para dialogar e para nos confrontar com a vida, sempre num contexto de uma enorme presença.
O Padre é, ao contrário do que se possa pensar, cada vez mais chamado a ser o homem da palavra com conteúdo e sentido, numa altura em que as palavras estão desqualificadas. Ou a exercer uma espécie de “paternidade espiritual” cada vez mais intensa, diria quase obrigatória.
Vem isto a propósito do aniversário que se assinala na diocese de Angra esta terça feira, dia 30 de junho.
O Bispo D. António completa 19 anos de episcopado.
Natural da ilha de Santa Maria, cedo saiu de casa para procurar o seu rumo que passou primeiro pelo Colégio dos Padres do Sagrado Coração de Jesus no Funchal, depois Coimbra e finalmente Roma, com dúvidas, inquietações, e mesmo hesitações. Que o levaram, por exemplo, a protelar a ordenação, que acabou por acontecer em 1970 pela mão do beato Paulo VI.
Chegou aos Açores com 55 anos. Não vivia em terras insulares desde os 13. Não conhecia todas as ilhas e embora regressasse com regularidade, ficava-se por Santa Maria, onde nasceu.
Ao desembarcar em junho de 1996 na Região, já como Bispo, precisou de fazer quase tudo de novo. No bilhete de identidade trazia a responsabilidade de em 38 bispos desta diocese ser apenas o segundo de origem açoriana. Fez-se às ilhas, sem medo e carregando apenas uma enorme simplicidade partiu ao encontro do seu povo e aí permaneceu, “cheirando” sempre “ao rebanho”.
Quando, com a distância necessária, se fizer a história destes anos, compreenderemos porventura melhor o difícil papel que lhe coube e a generosa sabedoria com que o viveu, percebendo alguns dos desafios desta igreja diocesana, que por ser dispersa já tinha suficientes barreiras e espartilhos naturais, que ele paulatinamente conseguiu ir derrubando.
A sua simplicidade, humildade e proximidade, fazem de D. António de Sousa Braga um bispo do povo, junto dos açorianos, desde logo nos momentos de catástrofe que assolaram as ilhas, desde a tragédia da Ribeira Quente ao sismo do Faial e do Pico.
Um padre não é um homem como os outros, mas um homem para os outros.
A história julgará o seu episcopado, mas uma coisa é certa: a Igreja açoriana encontrou nele um pastor, próximo, atento e disponível, sempre ao serviço, conjugando a fé com a humanidade.
Naturalmente que nem todos se podem rever neste estilo, porque nessa comparação entra a natureza dos homens.
Ouvi da boca de um presbítero que D. António de Sousa Braga “escancarou a porta da igreja açoriana abrindo-a a todos”, olhando preferencialmente os mais pobres e desfavorecidos, sentando-se com eles à mesa. Como recomenda o Evangelho.
Esta é uma marca distintiva deste episcopado…quer se goste quer não.