Por Renato Moura
Estamos a atravessar um tempo especial. Um Inverno com tanto vento e chuva, com frio e muita humidade, reduz os percursos ao ar livre. A pandemia limitou a convivência e fechou-nos em casa. Quaresma para os católicos. Estamos assim mais sós e logo impulsionados para a reflexão. Isso pode ser pesado, mas útil.
Um tempo de espiritualidade, para os crentes de qualquer religião, ou também para os não crentes, permite sempre uma avaliação da nossa vida, no seu todo ou cada parte: opções, acções e omissões, sejam elas no campo pessoal, familiar, profissional, ou de responsabilidade a qualquer nível.
Um tempo de paragem recolhimento e silêncio, é condição essencial para a fluência da memória e da consciência. Viveremos todos entre o bem e o mal: um e outro fizemos ou fazemos; ou julgamos que os outros fazem, louvando com parcimónia e condenando sem interpretar e logo sem ajuda para perdoar.
Costumamos dizer «para baixo todos os santos ajudam»: mas provavelmente subimos muito mais facilmente para o alto das nossas convicções, certezas e razões, do que descemos para a humildade de não ter certezas inabaláveis, de ouvir, de ter a paciência de reflectir e intuir a atitude dos outros, de reorientar o caminho. W. Churchill afirmou: “Valor é o que é preciso para levantar e falar, mas também é necessário para sentar e escutar”. Sentir o comprazimento do bem praticado, sem nos impedir de escutarmos a consciência do mal infligido.
Na Quaresma os católicos são convidados a reflectir mais, a estar com Deus em ritos de Lausperene, para O louvar e Lhe falar. Frente a Deus, na hóstia consagrada exposta, certamente louvarão, pedirão, talvez reclamem amargamente; e creio que Deus só lhes agradecerá a franqueza, pois mesmo querendo escondê-la não conseguiriam. Aliás o Santíssimo Sacramento está sempre em cada Igreja, vendo-nos do Sacrário como se estivesse exposto e cada cristão o pode visitar quando quiser, sem horas marcadas, em oração ou silêncio. Sem medo da sinceridade. O Papa Francisco, com a clarividência habitual, acaba de esclarecer: “As crises de fé não são faltas contra a fé”.
Somos seres com virtudes e fraquezas. Seja quem ou como, importaria aproveitarmos este tempo para reflexão. Bom seria se ao menos servisse: para doravante a prudência ajudar a escolher os meios de fazer o bem e vencer o mal; em vez da precipitação, se escolher a reflexão; encontrar forma de praticar e reparar a justiça; ter a força de lutar pela verdade e pelas causas justas; e com a conversão interior do espírito construir.