O Serviço da Pastoral juvenil começou as suas atividades no domingo. Este ano o desafio é ligar as ilhas através dos jovens. Em entrevista ao Sítio Igreja Açores, o responsável, Pe Norberto Brum, identifica prioridades e deixa desafios aos jovens para serem os “caminheiros da fé” Sítio Igreja Açores- A grande novidade do arranque deste ano pastoral no serviço que dirige são “As conversas caFÈ”. O que é que elas pretendem, concretamente?
Pe Norberto Brum- Na Exortação Apostólica “A Alegria do Evangelho”, o Papa Francisco lança-nos grandes e profundos desafios, sendo o maior, o da “saída” missionária da Igreja, uma “saída” que “não pode deixar as coisas como estão”, como afirma. Para isso, ele mesmo nos convida a sermos ousados e criativos no estilo e nos métodos evangelizadores e, é neste contexto de ousadia e criatividade, que surge a iniciativa das “conversas caFÉ”: é uma forma de “saída”! Respondendo ao desafio de uma Igreja e de uma pastoral em “saída” missionária, que não fica à espera que se aproximem, mas que é toda ela que sai e vai ao encontro, pretendemos fazer “sair” a nossa ação pastoral dos espaços e dos tempos convencionais, como sejam as celebrações, encontros, retiros, formações e outros, nos quais servimos quem nos procura ou participa, e irmos ao encontro, irmos, usando a linguagem do Papa, às periferias: não queremos ficar à espera que venham ou nos procurem mas queremos ser nós a ire a procurar. Pretende-se, desta forma, levar e partilhar a nossa alegria de cristãos, de jovens que pautam a sua vida pelo Evangelho, que se comprometem com a Missão, suscitando interrogações e interpelações; é levar a boa notícia de Jesus, do seu amor e misericórdia, da Sua Palavra, isto num ambiente completamente diferente dos habituais e convencionais, pois o projeto de Jesus é para todos os ambientes: não se trata de uma igreja, um salão ou de outro espaço conotado como de “igreja”, mas num espaço completamente diferente, o de um Café/Bar. Podemos dizer que é ir a quem não vem!
Sítio Igreja Açores- Que modelo vai ser seguido na sua organização e quem são os convidados que orientam as conversas?
Pe Norberto Brum- Tudo se quer de uma forma natural, espontânea e simples, de algo que brote da própria vida e do coração, sem grandes fórmulas ou estruturas… sem artificialismos: queremos, e pretendemos, a verdade de cada um, a paixão por Jesus… o encontro com o outro: não vamos apenas “falar” mas, sobretudo, escutar, acolher… conversar, abrir pontes de diálogo e partilha deixando, sem dúvida, uma mensagem que se quer de Boa Nova. Para cada “conversa” teremos um tema chave, um fio condutor, uma palavra que abra caminhos a um diálogo aberto, fraterno e franco. Não se trata de conferências ou reflexões “piadosas”, nem de catequeses, trata-se apenas e só de conversas… diálogos. Não vamos numa atitude de “impor” o que quer que seja, mas apenas dialogar… partilhar…conversar! Estas conversas desenrolar-se-ão num Café/Bar, à volta da mesa, numa total e perfeita descontração. Para orientar cada “conversa” convidamos dois ou três jovens: serão eles que darão o mote à conversa, que lançarão o tema. Também teremos presentes outros convidados, jovens, padres, consagrados, casais que, distribuídos pelas diferentes mesas, ajudarão à conversa, despontando testemunhos, interrogações e partilhas. Nestas “conversas” convidamos também jovens músicos que vão intercalando o diálogo com momentos musicais. Assim teremos uma mistura de música, diálogo, partilha e vivências.
Sítio Igreja Açores- Estas conversas, tanto quanto percebi, têm sempre por base a exortação do Papa- A Alegria do Evangelho-. Nela, o Papa reconhece que as “estruturas ordinárias não respondem aos jovens, aos seus problemas às suas feridas e inquietações”. O seu lema tem sido inovar. Que balanço faz dessas inovações como esta ou como outras que desenvolveu o ano passado?
Pe Norberto Brum- Sempre que se propõe e se realiza algo de novo e de diferente, surge logo muita espectativa, e, por vezes, alguma apreensão, para além das críticas que sempre se levantam, umas mais positivas que outras. Por vezes, sente-se uma certa resistência à novidade, à mudança… o medo de arriscar, mas reconhecemos que não podemos permanecer no “fez-se sempre assim”, ou no “nunca se fez isso”! Existe sempre a preocupação natural se vai resultar, se os jovens vão aderir… mas não podemos ficar na nossa zona de conforto, não somos, não devemos, nem queremos ser, como a “Gabriela” de uma telenovela: “nasceu assim, viveu assim… é sempre assim”. Até ao presente, o balanço das iniciativas inovadoras e mais arrojadas que desenvolvemos tem sido, francamente, positivo. Por exemplo: há já dois anos que realizamos o “Jesus na cidade”, que tem sido um verdadeiro “sucesso”: em dia de Nossa Senhora da Conceição, 8 de dezembro, percorremos as ruas da Cidade de Ponta Delgada, cantando, dando testemunho, ostentando cartazes com mensagens, distribuindo abraços em nome de Jesus, vestindo t-shirts com frases significativas, conversando com as pessoas, fazendo “flashmob”, para além de convidarmos todos os comerciantes a colocarem uma Imagem do Menino Jesus nas suas montras. A princípio houve algum receio ou medo e até alguma vergonha de nos “expormos” de uma forma tão visível, mas logo se converteu num sucesso e num espaço de evangelização, que iremos repetir este ano. A iniciativa foi tão bem acolhida e julgada oportuna que recebemos convites para a realizarmos em outros locais que não em Ponta Delgada e até um pedido de ajuda na organização de um evento similar para uma Paróquia do Continente, o que nos deixa sobremaneira, felizes! Foi uma aposta ganha mas não está concluída: há sempre que aperfeiçoar! Quanto às “conversas caFÉ”, embora ainda não se tenha feito a primeira experiência, o facto é que já está a gerar muita expectativa entre alguns jovens, e não só, o que é, sem dúvida, um bom presságio. Vamos deixar as coisas acontecerem naturalmente, claro que a primeira vez é sempre uma incógnita e só a partir da primeira experiência é que poderemos aperfeiçoar e melhorar, mas tudo aponta para um bom resultado. Não estamos preocupados com os resultados que possam advir do evento, preocupamo-nos sim em semear, acolher, e deixar uma mensagem e uma interrogação… deixar uma marca, o resto deixamos ao cuidado de Jesus!
Sítio Igreja Açores- Apesar da importância e da originalidade de algumas destas ações, não seria necessário tornar mais estável a participação destas iniciativas no âmbito da pastoral de conjunto da igreja?
Pe Norberto Brum- Sem dúvida! Apesar da nossa ação estar vocacionada e dirigida aos jovens, não podemos, nem devemos fechar-nos ao todo da Igreja e da pastoral de conjunto, por isso, nestas, como noutras iniciativas procuramos envolver outros sectores da pastoral. Embora sendo esta, como outras, iniciativas da Pastoral Juvenil, estamos abertos à envolvência de outros âmbitos da pastoral. O envolvimento de todos será sempre um bem maior, e desejável, por isso mesmo, nestas “conversas caFÉ”, convidamos consagrados, famílias, movimentos e não apenas jovens. Estamos a preparar um encontro com todos os Movimentos, Congregações e organismos que trabalhem pastoralmente com jovens, tal como tem acontecido todos os anos, precisamente no sentido de agilizarmos a nossa ação pastoral, de convergirmos para os mesmos objetivos e de delimitarmos pontos concretos de comunhão e de ação.
Sítio Igreja Açores- Que protagonismo deve a igreja reservar aos jovens?
Pe Norberto Brum– O Papa na sua Exortação, nos nºs 105 a 108, fala do mundo juvenil e reconhece a urgência de que eles tenham um protagonismo maior na vida da Igreja. O jovem é o grande evangelizador do outro jovem! Este é o nosso princípio orientador e é este, pensamos nós, que deve ser o grande protagonismo dos jovens: sentirem-se, em Igreja, evangelizadores, protagonistas na missão e da missão e não apenas “objeto” da evangelização. Por vezes sentimos a tentação de “fazermos” coisas para os jovens quando devemos, sim, fazer coisas com os jovens. O jovem não pode, nem deve ser apenas um recetor, mas o protagonista, é o primeiro agente da sua própria evangelização. Na Igreja não deve haver “protagonismos”, mas serviço e entrega e temos de ter a coragem de oferecer aos jovens oportunidades de serviço, de entrega, dar-lhes espaço e oportunidades para colocarem a sua criatividade ao serviço do bem comum, da comunidade e da Igreja. Não basta dizermos que os jovens são generosos é preciso aproveitarmos e canalizarmos esta generosidade. Devemos ter a preocupação de os escutarmos, de sabermos dos seus anseios, preocupações e necessidades e torna-los protagonistas da sua própria evangelização, do seu crescimento na fé, tendo em vista um compromisso crescente, não apenas com a Igreja, mas também consigo próprios, com o mundo e, particularmente, com Deus.
Sítio Igreja Açores- Mas nem sempre é isso que acontece e como refere, pensa-se mais em trabalhar para os jovens do que fazer coisas com eles…
Pe Norberto Brum- Os jovens devem ser envolvidos na vida pastoral das Comunidades, dando espaço à sua criatividade, não tendo medo de assumirmos as suas formas de ser e estar, as suas formas de rezar e viver a fé; envolve-los nos processos de decisão e escolhas: o jovem tem também uma palavra a dizer, caso contrário podemos cair no risco de estamos a fazer coisas que nada lhes diga ou que não corresponda às suas necessidades.
Sítio Igreja Açores- Os jovens hoje, apesar da dificuldade para o compromisso, podem ser verdadeiros caminheiros da fé?
Pe Norberto Brum- Não só podem como devem ser caminheiros da fé! Caminheiro é o que faz caminho, o que se põe em marcha, aquele que não estagna nem cruza os braços mas, apesar do cansaço e das dificuldades, continua a caminhar e neste caminho da fé que o jovem vai trilhando vai testemunhando, pelo próprio caminhar, a sua fé, a sua alegria de acreditar, por isso afirmamos que “o jovem é o evangelizador do outro jovem”. Esta tem sido uma nossa preocupação crescente: tornar os jovens capazes de, pela sua vida, serem testemunhas de Jesus. Há dificuldades de compromisso? Há! Mas isso não acontece apenas e só nos jovens, é transversal a toda a sociedade, mas quando um jovem descobre a alegria de Jesus e da pertença à Igreja, vai assumindo gradualmente um compromisso. Quedas e desânimos existem, mas a coragem do seguimento torna-nos ainda mais caminheiros da fé e fortalece o próprio caminhar. Quando se dá espaço e oportunidade o jovem entrega-se!
Sítio Igreja Açores- A igreja tem sabido ouvir os jovens?
Pe Norberto Brum- Uma coisa é ouvir e outra é escutar. Penso que durante algum tempo ouviu-se os jovens, ouviu-se as suas lamentações, as suas críticas, as suas queixas, os seus desejos e anseios e ficou-se por aí, mas passou-se gradualmente de uma atitude de ouvinte a uma atitude de escuta, uma escuta atenta e preocupada, uma escuta acolhedora, embora nem sempre tenha as respostas mais adequadas, ou que os jovens querem ouvir. A Igreja tem procurado escutar os jovens e tem aprendido a escutar continuamente. Não tendo soluções mágicas, a Igreja tem uma proposta: a de Jesus Cristo. Existe uma preocupação crescente na Igreja em escutar os jovens, seus anseios, preocupações e necessidades. Penso que o problema não foi nem é o de saber ou não escutar os jovens, o problema é, por vezes, não saber dar-lhes as oportunidades e as respostas adequadas, não saber cativa-los, propor-lhes, motiva-los, convida-los e integra-los.
Sítio Igreja Açores- Quais são os grandes desafios da pastoral da juventude para este ano que agora se inicia?
Pe Norberto Brum- O grande desafio é, sem dúvida, o de capacitar os nossos jovens para a missão, para a tal “saída” missionária, o de formar agentes de pastoral juvenil, nomeadamente animadores de grupos de jovens e animadores juvenis, daí que a nossa aposta vai na linha da formação, de uma formação cada vez mais sólida e substancial, uma formação que não pode ser apenas técnica ou pedagógica mas também espiritual, bíblica e litúrgica, uma formação integral. Formar formadores! O ano passado iniciamos uma formação, em módulos, com a duração de um ano. Graças a Deus muitos são os participantes. Mas não podemos restringir-nos a esta formação; queremos chegar a um número cada vez maior de jovens, daí toda a restante programação pastoral e iniciativas. Não temos dúvida que o nosso grande desafio neste ano pastoral é o da formação e da espiritualidade, para além da coordenação de toda a pastoral juvenil. Sentimos, cada vez mais, a necessidade de uma coordenação e de uma convergência cada vez maior. Não podemos trabalhar isoladamente, cada um para si e para os seus mas temos de fazer uma pastoral juvenil cada vez mais concertada, assertiva e unificada: sentimos que existe alguma dispersão e a dispersão desorienta. A missão não é pertença de A ou B mas de todos e está ao serviço de todos e é com todos que ela se concretiza e quanto mais coordenada e agilizada, mais frutífera se torna. Ao nível da formação, estamos a criar dois subsídios de apoio: um guia de formação de animadores de grupos de jovens e um guia de oração. Estamos a começar a fazer um levantamento de tudo o que existe ao nível da pastoral juvenil em todas as paróquias, levantamento que já iniciámos em São Miguel e que se vai estender a todas as paróquias da diocese, no sentido de vermos o que temos e aferirmos quais as reais necessidades e urgências e, deste modo, podermos dar respostas concretas e o apoio devido. Um dos projetos que queremos colocar em marcha, é a realização de um congresso diocesano de jovens, que seja representativo da juventude das nossas nove ilhas, no sentido de escutarmos os jovens, os seus anseios, as ideias e propostas, para que sejam os jovens a apontarem objetivos, prioridades e meios. O que os jovens pedem, esperam e querem da Igreja e da diocese é a grande questão. Estamos a constituir uma equipa de trabalho que prepare e desencadeie todo este processo, um processo de reflexão, estudo e auscultação que irá culminar com a realização do congresso. Com este trabalho pretendemos elaborar um verdadeiro plano diocesano de pastoral juvenil.
Sítio Igreja Açores- Vivemos numa diocese dispersa, com dificuldades para por em prática a pastoral. Sente que o seu serviço acaba por ser mais de ilha do que diocesano?
Pe Norberto Brum- O facto de vivermos numa diocese dispersa, constituída por ilhas, pode trazer algumas dificuldades para por em prática a pastoral. Sentimos que, tal como acontece com todos os Serviços Diocesanos, estes Serviços acabam por ter um papel mais preponderante e efetivo na ilha onde estão sedeados. São as contingências do vivermos em ilhas, mas isso não deve constituir um impedimento para que a pastoral se desenvolva e se concretize. Tal como nos diz o nosso Bispo, dada a nossa condição geográfica, temos de encarar cada ilha como uma unidade pastoral. Os Serviços Diocesanos são estruturas de apoio, de coordenação mas cada ilha é que tem de tornar a ação pastoral efetiva no terreno, pois, dadas as contingências, não podemos circular por toda a diocese como era desejável. Como o serviço de apoio à pastoral juvenil está sedeado em São Miguel, é o serviço diocesano que assume a pastoral juvenil da ilha, contudo, em cada ilha existe uma equipa coordenadora da pastoral juvenil e é esta equipa que torna efetiva no terreno este campo de ação pastoral. Melhor do que nós, serviço diocesano, são as equipas de pastoral juvenil de cada ilha que sabem e sentem as necessidades reais da juventude da sua ilha e quais as prioridades a dar. A nós, serviço diocesano, cabe-nos a tarefa de, dentro das nossas limitações, prestarmos o apoio que cada equipa de ilha julgar conveniente, oportuna e necessária.
Sítio Igreja Açores- Como é que, no quadro das nossas próprias circunstâncias, poderíamos fazer diferente?
Pe Norberto Brum- Não é fácil responder a esta questão. Este é um segredo que ainda não descobrimos, contudo julgamos que podemos dar alguns passos no sentido de haver uma maior comunhão e unidade, de uma maior partilha. No nosso caso, anualmente realizamos um encontro com todos os coordenadores de pastoral juvenil de todas as ilhas. É um momento privilegiado de partilha e comunhão, de traçarmos objetivos e estratégias comuns, tendo sempre presente as especificidades e contingências de cada ilha. Para este ano estamos a preparar uma série de iniciativas que possam envolver todas as ilhas, ao nível da música e da arte; envolver os jovens de todas as ilhas em projetos comuns.