Seminário de Angra completa 161 anos com novo modelo formativo

Foto: Igreja Açores

Aniversário é celebrado no contexto da Semana dos Seminários, em que se reza especialmente pelas vocações. No próximo dia 10 estão agendadas duas vigílias de oração nos Ginetes, em Ponta Delgada e na Fajã Grande, nas Flores

O Seminário de Angra completa esta quinta-feira, dia 9 de novembro, o seu 161º aniversário, num ano particularmente desafiador em que pôs em marcha um novo modelo formativo. Além da separação das diferentes etapas formativas, a própria equipa formadora é composta, pela primeira vez, por leigos: um casal e uma psicóloga.

Para o reitor do Seminário, “esta nova dinâmica pretende alargar os protagonistas na caminhada, isto é, ter mais gente a contribuir para o discernimento dos candidatos ao sacerdócio e, simultaneamente, mais condições para os próprios candidatos poderem crescer humana e espiritualmente”, refere o padre Emanuel Valadão Vaz, o novo Reitor do Seminário Episcopal de Angra.

Esta é, de resto, uma das reflexões feitas na primeira Assembleia do Sínodo dos bispos sobre sinodalidade, que decorreu em Roma em outubro e que resulta da própria proposta da nova Ratio Fundamentalis aprovada pelo Papa e adaptada pela Conferência Episcopal Portuguesa.

No relatório da Assembleia sinodal propõem-se diversas sugestões a ter em conta na formação dos candidatos a padres para que estes possam servir melhor “uma igreja mais próxima das pessoas, menos burocrática e mais relacional”. Os participantes na Assembleia do Sínodo  propõem às dioceses que “repensem os estilos e percursos formativos” dos candidatos ao sacerdócio. Por isso, avançam: “os seminários não deverão criar um ambiente artificial, separado da vida comum dos fiéis”, mas “diretamente ligados á vida concreta do povo de Deus”.

“O povo de Deus deve estar amplamente representado na formação dos futuros ministros ordenados”, propondo-se mesmo o “contributo feminino e a cooperação das famílias” nesse percurso formativo.

“Insiram-se as mulheres nos programas de formação e ensino nos Seminários de forma a favorecer uma melhor formação para o exercício do ministério ordenado”, pode ler-se ainda.

“Esta solução é muito desafiante e pode dar frutos:  é preciso que o Seminário esteja mais no imaginário dos jovens e, quanto mais pessoas estiverem envolvidas, melhor” acrescenta, o reitor na entrevista dada ao Igreja Açores no inicio deste ano letivo, que arrancou com a menor comunidade residente de sempre: seis alunos.

“Esta opção pela presença na equipa formadora de uma família insere-se na perspetiva de que o Seminário é um espaço onde existem comunidades idênticas às que existem na vida lá fora,  que nos possam ajudar a ver e a ter algumas perspectivas que nós padres podemos não ter”, enfatiza.

O Seminário tem dois alunos externos, por assim dizer, que iniciaram o ano propedêutico mas a residir fora da instituição, cuja formação e processo de discernimento é assegurado pelo pároco da paróquia onde residem e a equipa formadora do Seminário. Também os três alunos candidatos ao diaconado residem fora do Seminário sendo acompanhados pelos sacerdotes das paróquias onde desenvolvem trabalho pastoral.

Os novos alunos terão algumas aulas no Seminário de forma presencial e a maioria por zoom, em casa. Continuarão a desenvolver a sua atividade em são Miguel, de onde são naturais, nomeadamente das paróquias da Covoada e da Fajã de Cima, ambas na ouvidoria de Ponta Delgada.

Já os seis alunos que frequentam o curso de Teologia, no terceiro e quinto anos, têm a acompanhá-los a equipa formadora que será composta pelo Reitor, pelo diretor espiritual, padre Nelson Vieira, por uma psicóloga- Raquel Oliveira- e por uma família- Lúcio Sousa e Andreia Rocha-, que dia-a-dia acompanharão todos os seminaristas, internos ou externos.

“Este trabalho conjunto é importante para nos sintonizar com o mundo concreto e real e, sobretudo, com o nosso papel que é de escuta mas também de preparação para a escuta e essa preparação faz-se de um aprofundamento da nossa condição humana, de pessoas” explica o padre Emanuel Valadão Vaz.

“Todo o processo vocacional tem de ser um processo evolutivo; nós não podemos querer pessoas no seminário apenas por questões numéricas; quem está no seminário tem de estar disponível para fazer esta caminhada, procurando a conversão” refere ainda, lembrando que a presença dos vários carismas vocacionais pode facilitar um melhor conhecimento do mundo e da realidade que espera um jovem sacerdote, depois da formação no Seminário.

“Os padres não são super homens e neste caminho podemos ir trabalhando e discernindo a melhor forma de conseguirmos responder às situações que se nos deparem. No fundo, temos que nos ir desconstruíndo, retirando o que está a mais e acrescentando aquilo que são Paulo nos diz para sermos homens novos, aqueles que se aproximam mais de Jesus”, esclarece.

Ciente de que a maioria católica, “muitas vezes, não passa de estatística”, o momento que afecta os seminários é igual ao que acontece na Igreja em geral: “secularização e diminuição da prática dominical e, por isso, hoje, a referência que antes era passada no meio familiar já se esbateu”, afirma ainda o sacerdote.

“Temos de ser capazes de criar atração pelo serviço a Jesus. Ser padre é uma consequência desta atração por Jesus que se vai gizando à medida que vamos descobrindo e personalizando”, acrescenta o padre Emanuel Valadão Vaz.

A História sempre num diálogo com a sociedade açoriana

O Seminário Episcopal de Angra foi inaugurado no dia 9 de Novembro de 1862 no Convento de S. Francisco de Angra, passados 328 anos da fundação da Diocese. Dava-se assim cumprimento à norma tridentina e ao desejo do clero quanto à fundação de um Seminário nesta Diocese.

No entanto, já um século antes D. Frei José da Avemaria, bispo de Angra, exigia que “sem a competente certidão de frequência, aproveitamento e capacidade dos pretendentes, não podiam ser admitidos às Ordens, neste bispado…”.

Volvidos 161 anos o Seminário Episcopal de Angra, formou diversas gerações de alunos. E, daqui saíram sete bispos, praticamente todos os sacerdotes açorianos e muitos dos que foram enviados para as missões.

O reconhecimento do trabalho do Seminário foi de resto feito a nível nacional com a atribuição da Insignia da Ordem de Mérito pelo Presidente da República, para além da Medalha de Ouro do Município de Ponta Delgada e do Diploma de Reconhecimento, da Câmara de Angra do Heroísmo, por ocasião do 150º aniversário.

Por outro lado, durante muitos anos foi a principal e única escola de formação superior de centenas de homens, que influenciaram a cultura e a sociedade açorianas. Antes da criação da Universidade dos Açores, esta era a única Instituição de ensino superior do Arquipélago.

À sombra do Seminário nasceu o Instituto Açoriano de Cultura, que promoveu as Semanas de Estudo dos Açores, um dos momentos mais altos de reflexão política, social, cultural e económica dos Açores e alguns dos fundadores da própria Universidade ensinaram no Seminário.

O esforço por uma formação de qualidade constitui, de resto, um dos distintivos desta Instituição.

O aniversário do Seminário é celebrado no contexto da Semana dos Seminários, com várias iniciativas a decorrer em diferentes sítios da diocese. No sábado, o Santuário de Nossa Senhora dos Milagres, na Serreta, ilha Terceira acolheu uma vigília de oração, com testemunhos dos seis seminaristas que integram a comunidade residente. Em Ponta Delgada, nos Ginetes e nas Flores, na Fajã Grande, serão celebradas mais duas vigílias de oração no próximo dia 10, às 20h00 e 10h00, respetivamente.

 

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