Francisco pede medidas para proteção «da vida humana e da dignidade do trabalho»
O Papa apelou a uma transformação da humanidade, após o sofrimento provocado pela Covid-19, defendendo que se enfrente a “pandemia da pobreza”, com a consciência de que é insuficiente voltar ao que se vivia antes.
“Das grandes provas da humanidade, e entre elas a pandemia, saímos melhores ou piores. Não saímos os mesmos. E é por isso que hoje nos abrimos ao Espírito Santo para que seja Ele a mudar o nosso coração e nos ajude a sair melhores”, escreveu Francisco na sua conta do Twitter, assinalando a solenidade de Pentecostes, com que se encerra o tempo pascal no calendário católico.
Ainda hoje, o Vaticano divulgou a mensagem enviada pelo Papa para a celebração litúrgica de Pentecostes presidida pelo arcebispo de Cantuária (Igreja Anglicana), Justin Welby.
“O Espírito Santo oferece sabedoria e conselho. Nestes dias, invoquemo-lo sobre os que têm de tomar decisões delicadas e urgentes, para que protejam a vida humana e a dignidade do trabalho”, disse o Papa Francisco.
Francisco pediu investimento “na saúde, no trabalho, na eliminação das desigualdes e da pobreza”.
O Papa advertiu para a necessidade de não ficar “anestesiados diante do grito dos esquecidos e do planeta ferido”, perante o qual é impossível voltar ao antigo estilo de vida.
“Temos necessidade de estar unidos para enfrentar as pandemias que se alargam: a do vírus, mas também a fome, as guerras, o desprezo pela vida, a indiferença”, apontou.
O tema esteve presente também na mensagem de vídeo do pontífice para a CHARIS, Serviço Internacional do Renovamento Carismático Católico, por ocasião da vigília online de Pentecostes mundial, na noite de sábado.
“Se não trabalharmos para acabar com a pandemia da pobreza no mundo, com a pandemia da pobreza no país de cada um, na cidade onde cada um de nós vive, este tempo terá sido em vão”, alerta o Papa.
Francisco fala num mundo ferido, que sofre especialmente nos mais pobres, que “são descartados”, uma realidade que a pandemia fez viver de “forma muito mais dramática”.
“Precisamos que o Espírito nos dê novos olhos, abra a nossa mente e o nosso coração para enfrentar este momento e o futuro com a lição aprendida: somos uma só humanidade. Não nos salvamos sozinhos. Ninguém se salva sozinho. Ninguém”, frisou ainda.
O Papa considera que após a pandemia tudo tem de ser “diferente” e que não se deve “continuar a fazer” tudo como se fazia antes.
“Todo este sofrimento não terá servido para nada se não construirmos juntos uma sociedade mais justa, mais equitativa, mais cristã, não de nome, mas na realidade, uma realidade que nos leva ao comportamento cristão”, observa.
Antes, na Basílica de São Pedro e perante uma assembleia de algumas dezenas de pessoas falou da necessidade de a superar o pessimismo e o egoísmo, num momento de crise, apelando à unidade e à esperança, falando durante a Missa de Pentecostes, que encerra o tempo pascal no calendário católico.
“Pior do que esta crise, só o drama de a desperdiçar, fechando-nos em nós mesmos”, advertiu, na homilia da celebração a que presidiu na Basílica de São Pedro, com a presença de algumas dezenas de fiéis.
A intervenção centrou-se na necessidade de viver a vida como “dom”, apresentando três “inimigos” dessa perspetiva: o narcisismo, a vitimização e o pessimismo.
“Nesta pandemia, faz um mal imenso o narcisismo, o debruçar-se apenas sobre as próprias carências, insensível às dos outros, o não admitir as próprias fragilidades e erros”, advertiu.
Francisco sublinhou também que a lamentação constante e o ver “tudo negro” são travões ao recomeço, depois da crise provocada pela Covid-19, pensando que “nada voltará a ser como antes”.
“Encontramo-nos na carestia da esperança e precisamos de apreciar o dom da vida, o dom que é cada um de nós. Por isso, necessitamos do Espírito Santo, dom de Deus que nos cura do narcisismo, da vitimização e do pessimismo”.
A celebração o Pentecostes, 50 dias depois da Páscoa, evoca a efusão do Espírito Santo, terceira pessoa da Santíssima Trindade na doutrina católica.
O Papa deixou vários apelos para o interior da Igreja Católica, pedindo unidade e respeito pela diversidade dos vários carismas.
“Entre nós existem diversidades, por exemplo de opinião, preferência, sensibilidade. A tentação é defender, sempre de espada desembainhada, as nossas ideias, considerando-as boas para todos e pactuando apenas com quem pensa como nós. Esta é uma tentação feia”, alertou.
Francisco sublinhou que o anúncio da mensagem cristã não deve ser cultivada em grupos fechados, em cenáculos onde se tende a “fazer o ninho”, dado que a Igreja deve ser “comunidade” e “mãe”.
“O Espírito abre, relança, impele para além do que já foi dito e feito, mais além dos recintos duma fé tímida e cautelosa”, acrescentou.
“O mundo vê-nos de direita e de esquerda; o Espírito vê-nos do Pai e de Jesus. O mundo vê conservadores e progressistas; o Espírito vê filhos de Deus. O olhar do mundo vê estruturas, que se devem tornar mais eficientes; o olhar espiritual vê irmãos e irmãs implorando misericórdia”, afirmou.
O Papa questionou a forma como cada um entende Deus, fundamental na sua forma de viver a fé.
“Se tivermos em mente um Deus que toma e Se impõe, desejaremos também nós tomar e impor-nos: ocupar espaços, reivindicar importância, procurar poder. Mas, se tivermos no coração que Deus é dom, muda tudo”, apontou.
“O Espírito, memória viva da Igreja, lembra-nos que nascemos de um dom e crescemos doando-nos; não poupando-nos, mas dando-nos”, disse ainda.
Após a Missa, Francisco vai presidir à recitação da oração mariana do ‘Regina Caeli’ à janela do palácio apostólico, pela primeira vez desde que foram tomadas medidas de confinamento, em março, para travar a propagação do novo coronavírus.
(Com Ecclesia)