Pelo Pe. Hélder Miranda Alexandre
Quando a vocação se faz carne acontece algo que toca o mistério.
Uma vida entregue a Jesus, qualquer que seja a vocação, é sempre um caminho de felicidade. Existem sinais que não se explicam, vivem-se simplesmente no momento, prolongam-se para o futuro e entranham as vísceras da memória. São histórias numa História, cujos detalhes por vezes se esquecem, mas aquecem o coração do que é mais sentido e recordado. São sinais com tons de eternidade, através de uma pintura que vislumbramos de soslaio, sem nos apercebermos realmente o que vemos, sabendo, no entanto que ali há algo de especial.
Ver entrar pela porta de um Seminário um jovem com este sonho comove-me profundamente e dá um sentido único ao sacerdócio que o Senhor colocou neste vaso de barro, tão quebradiço. Dá razão de ser a esta Casa, independemente do tipo de cozedura ou do resultado obtido.
Vemo-los depois sacerdotes de Jesus a começar, outros em “meio dia”, e outros já no crepúsculo. Uma grande parte incompreendidos, mas amados desde sempre… Ninguém melhor do que Paulo soube descrever: “Trazemos este tesouro em vasos de barro, para que se veja que este extraordinário poder é de Deus e não é nosso. Em tudo somos atribulados, mas não esmagados; confundidos, mas não desesperados; perseguidos, mas não abandonados; abatidos, mas não aniquilados. Trazemos sempre no nosso corpo a morte de Jesus, para que também a vida de Jesus seja manifesta no nosso corpo” (2 Cor 4, 7-10).
Isto é Mistério! Chama-se também vocação.
Nestes dias tivemos a graça de congratularmo-nos com Padres que realizaram bodas de prata, de ouro e diamante. “Obrigado irmão pela tua entrega!” Ser padre é ter um pouco de louco para uma aventura sem par, numa ousadia sem barreiras para amar comunidades inteiras.
Agora chegou a vez do Jacob. Vimo-lo entrar com quinze anos no Seminário! De uma simpatia contagiante, uma vontade férrea e uma fé profunda, deixa uma marca única (como únicos são os seus colegas!). Daqui a uns dias será o seu amigo Nelson.
Por agora apenas escrevo do que vejo na Ilha das Flores. Comunidades pequenas apostadas em trabalhar para um sonho comum. Afinal já passaram 33 anos desde que o último foi aqui ordenado! Muito se deve ao trabalho pessoal, da sua família e amigos, mas penso que ninguém se sente obrigado. Uma Ilha envelhecida e pequena não poderia dar mais. Recorda-me a minha própria história e a de tantos outros. Afinal uma semana de ordenação e missa nova nunca mais se esquece. Não se trata, como dizia um amigo meu (que muito admiro), de um domingo de ramos. É Páscoa!
Na Quinta Feira Santa deste ano o Papa Francisco explicou que Deus ungiu os sacerdotes com o óleo da alegria e esta unção convida-os a receber e cuidar deste grande dom: a alegria sacerdotal; e elencou três características. A primeira é a unção, uma alegria que não torna o padre presunçoso, mas penetra no íntimo do seu coração. A segunda é o fato de ser incorruptível, pois é a integridade de um dom que ninguém pode tirar ou acrescentar nada. Por fim, é também missionária, colocada em íntima relação com o povo fiel de Deus. Trata-se de uma felicidade que flui somente quando o pastor está em meio ao seu rebanho.
As mãos ungidas são isso tudo, por isso merecem ser beijadas, porque, por meio delas, Jesus se faz sacramento! Por isso, nenhum merece o esquecimento, porque afinal é amado desde sempre. Que aconteça a festa!
(O Pe. Hélder Miranda Alexandre é reitor do Seminário Episcopal de Angra)