Por Renato Moura
Recentemente deparei-me com uma notícia curiosa. A Deputada da Assembleia Nacional francesa Isabelle Attard, ora independente, percorreu a pé, de mochila às costas, 220 kms durante 16 dias, na Normandia, para ouvir a população, numa iniciativa que apelidou de “Democracia em Marcha”. Justificou-a no facto de as pessoas não irem às reuniões e debates políticos e assim é possível “ter um retorno sobre o que ando a fazer”, convencida que “outro modelo de sociedade é possível”.
No Dia da Autonomia, a Presidente da Assembleia Legislativa dos Açores fez um discurso que me surpreendeu pela positiva, revelador de uma evolução política significativa. Uma intervenção literariamente agradável, institucionalmente adequada ao órgão que representa e ao que se celebrava no dia, com análises realistas e temas para reflexão que importaria não ficassem sumidas entre algumas declarações infelizes ou pelo menos inoportunas, que nem o ano de eleições desculpa. Atenho-me só ao que tem relação directa com a partilha desta semana.
A Presidente Ana Luís afirmou a dado passo “É de trabalho árduo, dedicação e empenho que reza a história daqueles que nos antecederam, e que edificaram as bases do regime autonómico, tal como hoje o conhecemos” e mais adiante “Este é também o tempo para (…) restabelecermos os laços que devem basear uma relação de confiança e respeito entre eleitos e eleitores”.
Obviamente que não me parece necessário que os deputados percorram a pé, de mochila, os seus círculos eleitorais. Mas preocupa-me muito a perda de confiança nos políticos e a falta de ligação destes com a população.
A este propósito, quando outro dia um partido político me pediu uma palestra sobre a reforma da autonomia, entre muitas outras disse e ora reproduzo: “Sempre defendi a nobreza da actividade política e relevo o espírito de paixão, de serviço e até de sacrifício que tantos cidadãos se dispõem a dar à causa pública, quando ao serviço dos outros e sem buscar interesse próprio. Deplorável é ouvir argumentar que este ou aquele deputado, este ou aquele agente político, não intervém, não trabalha, só se relaciona com os eleitores durante as campanhas eleitorais, já não lhe colocam as questões pois que «eles não tratam de nada», mas não querem, como se acusa, «largar o tacho»!”
E também: “Mas terão de ser os políticos a reestabelecer a ligação com os eleitores. Convencerem-se de eleição por mérito e reduzirem a proximidade e a acessibilidade às campanhas eleitorais, é uma traição!”
Pelo dever, mudança? Quando?