Por Renato Moura
À entrada em férias dos nossos supostos representantes, aproveitando a desatenção do Verão, também a Assembleia da República legislou no sentido de elevar de 4000 para 10 000 (só mais 150%!) o número necessário de signatários para uma petição ser discutida em plenário do Parlamento. A iniciativa é do PSD (pretendia que passasse a ser de 15 000!), é de novo surpreendente, mudando o funcionamento da Assembleia, por idênticas e más razões às aqui referidas há quinze dias.
Votaram a favor o PSD e o PS; e contra os restantes partidos, deputadas não inscritas e Ana Paula Vitorino (PS).
O Presidente da República vetou o diploma, reenviando-o à Assembleia da República. Desta feita dignou-se tomar posição, argumentou e decidiu bem, considerando, nomeadamente, “sinal negativo para a democracia” e pedindo ao Parlamento “que pondere se deve dar o passo proposto”.
A petição apenas obriga à abertura de discussão sobre um tema candente. É tão só exercício da democracia participativa. E a democracia representativa está descreditada e em crise profunda.
Seria expectável os deputados procurarem recolher abundante informação sobre a opinião dos eleitores acerca de temas importantes. Como não o fazem frequente e alargadamente, então seria natural receberem de bom grado petições onde porventura se formulem dúvidas, revelem juízos ou até expressem divergências.
O Parlamento tem de ser a caixa de ressonância da opinião pública, resultado não só de concordâncias e aplausos, mas sobretudo de desacordos e críticas, sejam elas de atitudes governamentais, ou de iniciativas e tomadas de decisão dos deputados, ou das diatribes promovidas pelas cúpulas partidárias.
Muitas estações de televisão e rádio promovem debates sobre temas relevantes, abertos à participação em directo dos cidadãos, em muitos dos quais se manifestam, com discernimento e coragem, doutas opiniões, merecedoras de audição e recolha pelo pessoal de apoio político dos governantes e deputados. Deveriam ser canalizadas para quem as pudesse analisar, ponderar e responder, não apenas com esclarecimentos, mas com tomadas de decisão e soluções.
A opinião pública deve ser sempre tida em conta. O povo não é lobo mau! A votação da Assembleia da República justifica a pergunta: Quem tem medo da opinião pública?
Resta agora aguardar se PSD e PS estão disponíveis para repensar, no sentido de evitar, usando as palavras do Presidente da República, o fechamento da Assembleia da República à participação dos cidadãos e à vitalidade da própria democracia.