Pelo padre Hélder Miranda Alexandre
“Procuro uma alma para nascer de novo”, assim deseja Jesus no “sogno di Natale” de Pirandello. “Tu vês que morri por este mundo, que ainda tem a coragem de festejar o meu nascimento”.
Na verdade…
Enchem-se de luzes as noites frias, num combate gelado contra as noites invernias. Os enfeites quase hipnóticos e os adornos alegram as ruas e praças. Retomam-se as representações teatrais e os ritos fielmente repetidos, apesar da recorrente ameaça `covídica´. As rádios repetem indefinidamente canções renovadas que todos cantarolam. Não interessa inventar. Interessa repetir a tradição, sonhar um mundo de fantasia que macia a dureza do quotidiano. O retorno à infância privilegia o coração.
O simbolismo do Natal invade as emoções e as memórias, que daí derivam. Ainda que soprado por doce melancolia, pode aquecer o coração no contato com o bem, o sentido de união, a surpresa e o encanto…
O Natal dos sonhos, mais que onírico, mete em contacto com o sentimento, o sentido familiar, em que se evidencia aquilo que falta ou que inconscientemente se deseja. Mostra a necessidade de uma parte psíquica, daquele Natal que foi um dia. O aconchego de uma casa cheia, em que se era o centro das atenções, com surpresas de arregalar os olhos enormes e as bochechas boquiabertas. Era tudo tão simples….
O Natal dos sonhos realiza as necessidades mais simples e as alegrias aquecidas pelo calor do lar, de amor, de laços de intimidade, num código que só os da casa conhecem, mas também de nostalgia, e até de uma certa saudade, porque já cá não estão todos… Nenhuma época do ano tem esta fantasia. Pena quando se desvia para ilusões carnavalescas…
No entanto, a beleza da infância não pode ser criancice. Em todo este frenesi de ofertas, de ritos sacros e profanas representações, olvida-se o festejado. O Natal já não é muito cristão, é mais de mercados, de consumo compulsivo. No entanto, “Bom Natal” é o augúrio a realizar o salto decisivo: uma vida cheia de vida.
Na verdade, até sentimos compaixão. Uma catástrofe, acompanhada pela televisão ou pelo jornal, abate-nos na impotência, mas se ajudarmos alguém, apercebemo-nos da força do gesto concreto. O olhar gera opressão; a ajuda surpreende com a convicção de que podemos salvar uma vida. Aí salvamos a nossa mediocridade, nascemos de novo. O nosso é o nascimento de Jesus.