Na sequência do recente Sínodo dos Bispos, muito se tem especulado acerca das situações irregulares na família, nomeadamente da questão da comunhão aos divorciados recasados.
A questão é complexa e não se pode cair em demagogias pastorais fáceis e sem sentido, nem muito menos esquecer os sofrimentos por que passam tantos casais. Uma das soluções apontadas seria a de facilitar os processos de nulidade matrimonial de modo a torná-los mais ágeis e adaptados aos desafios de uma pastoral comprometida. Nisso, parece-me, estamos todos de acordo. Sonha-se inclusive com a realização de processos administrativos em que se resolve o caso em poucos dias. No entanto, este carácter demasiado célere e tempestivo pode não ser verdadeiro!
Uma semelhante opção, que queira apressar um processo sem ponderação, apresenta sérios riscos a precaver. Por um lado, a Igreja nunca pode contradizer o princípio da indissolubilidade do matrimónio, como advém da Revelação, nem o seu carácter sagrado. Por outro, não pode ser indiferente ou insensível aos verdadeiros problemas pastorais. Convém recordar que pastoral não é demagogia, mas verdade e caridade! Ajudar uma pessoa não é dizer o que ela gostaria de ouvir, mas fazer-se verdadeiro e companheiro de viagem, mesmo que isso provoque algum confronto. Por isso, há que ter em conta que a problemática pastoral das pessoas separadas, divorciadas ou recasadas não se reduz às causas de nulidade. Não se pode carregar este âmbito judiciário de expectativas exorbitantes e excessivas frente à vastidão e variedade de situações matrimoniais difíceis ou irregulares.
Portanto, não se podem contrapor atividade pastoral e dimensão jurídica na disciplina eclesial. No dia 24 de Janeiro de 2014, o Papa Francisco dirigiu-se à Rota Romana, na sua primeira alocução: «a dimensão jurídica e a dimensão pastoral do ministério eclesial não estão em contraposição, porque ambas concorrem à realização das finalidades e da unidade de ação, próprias da Igreja. A atividade judicial da Igreja, que se configura como serviço à verdade na justiça, possui uma conotação profundamente pastoral, porque finalizada para o bem dos fiéis e para a edificação da comunidade cristã».
Os processos matrimoniais tornam-se mais eficazes e céleres, quanto mais competência e dedicação houver. Uma pastoral que prescindisse de quanto é justo, não poderia construir-se senão na base da arbitrariedade e do subjetivismo. Por isso, a procura e o respeito pela verdade, paradigma de um processo de nulidade, constituem o ponto de equilíbrio de uma pastoral autêntica. Só na verdade se podem propor caminhos pastorais e espirituais sensatos, que pretendam favorecer um crescimento autêntico das pessoas: “justos… sempre; severos… nunca! Deixem as almas respirar!” (P. F. Cappello)
Pe Hélder Miranda Alexandre
Reitor do Seminário Episcopal de Angra