Pedro Strecht, o coordenador, apresentou esta tarde os nomes que integram a equipa
O psiquiatra Daniel Sampaio e o antigo ministro da Justiça Álvaro Laborinho Lúcio integram a Comissão Independente para o Estudo dos Abusos de Menores na Igreja, sob a coordenação do médico pedopsiquiatra Pedro Strecht, que foi hoje apresentada.
Numa conferência de imprensa realizada na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, o coordenador desta entidade criada pela Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) anunciou ainda os nomes da socióloga e investigadora Ana Nunes de Almeida, da assistente social e terapeuta familiar Filipa Tavares e, finalmente, da cineasta Catarina Vasconcelos, admitindo que venham a ser integrados mais profissionais no futuro.
“Em Portugal, nos últimos tempos e tal como em diversos países, registou-se uma saudável onda de indignação, movida pela procura de uma verdade histórica, sobre o que poderá ter acontecido a um número incontável de menores no campo dos abusos sexuais em diversos contextos da sociedade, em especial no seio da própria Igreja Católica”, começou por dizer o médico pedopsiquiatra.
E continuou: “É para isso que aqui estamos, neste momento, a dar início a um trabalho que naturalmente se prevê complexo, longo, difícil de definir quanto a resultados finais, mas que verdadeiramente teria que ser feito, mesmo que ainda assim venha a ser olhado como origem de outros que se lhe possam vir a seguir no futuro, procurando sempre a necessidade de reforço de verdadeiras políticas de proteção e promoção da infância e adolescência”.
Apelando às vítimas “destes crimes hediondos” para que falem sobre os abusos que sofreram, Pedro Strecht vincou a “utilidade” da partilha desses casos para evitar repetições futuras, sem deixar de assegurar o “absoluto respeito e sigilo”, bem como o anonimato das vítimas.
“Não podemos mudar o passado, mas podemos sempre construir um futuro melhor e livre da repetição deste tipo de situação junto dos vossos filhos, netos ou simplesmente de todas as crianças e adolescentes em que certamente podemos rever partes de nós mesmos”, afirmou.
O coordenador da Comissão Independente para o Estudo dos Abusos de Menores na Igreja assegurou , por outro lado, que a equipa agora constituída não vai fazer investigação de natureza criminal e realçou a vontade da Igreja de saber a verdade.
O médico explicou que a comissão “é, acima de tudo, uma equipa de estudo e não uma equipa de investigação”, pelo menos numa dimensão judicial, relegando essas matérias para a Polícia Judiciária (PJ), sem deixar de destacar o possível recorde deste ano em casos de violência sexual contra crianças.
“Muito provavelmente em 2021 estaremos à beira de bater um recorde de denúncias à PJ, só no primeiro semestre abriu mais de 1.300 investigações. A PJ tem imensa experiência nesse campo, mas é claro que vamos estar atentos a tudo o que possa ter acontecido retrospetivamente”, frisou o responsável pela comissão, precisando o limite temporal dos trabalhos na idade mais anterior de qualquer das vítimas que venha a ser referenciada.
Assumindo que a revelação dos arquivos históricos da Igreja tem sido abordada junto da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP), Pedro Strecht salientou a “óbvia e genuína” vontade da Igreja Católica Portuguesa em querer saber o que aconteceu ao nível do abuso sexual de menores dentro da instituição. No entanto, reiterou a total independência da comissão e a denúncia de eventuais obstáculos.
“O todo não pode ser tomado apenas a partir de parte. Contamos com a disponibilidade e o interesse da Igreja de conhecer a verdade. Se sentirmos dificuldades ao longo do caminho, estamos cá para isso e, se vier a acontecer, cá estamos para denunciar a outras estruturas competentes. Durante muito tempo, infelizmente, a Igreja protegeu e o Estado escondeu. Felizmente, as mentalidades mudaram”, explicou.
Para o coordenador, “o objetivo é provocar consequências e mudanças” na cultura instituída ao longo dos anos no seio da Igreja Católica, na qual muitas situações de abuso acabaram por ser alvo de encobrimento.
“Não nos interessa enquanto comissão chegar ao final deste trabalho e fazer apenas um relato mais ou menos pormenorizado do que encontrámos. Para nós todos interessa ainda concluir dando sugestões e traçando desafios que, obviamente, nos possam ajudar a todos e à própria Igreja a reconstruir-se”, observou.
De acordo com Pedro Strecht, o trabalho desta comissão independente vai decorrer ao longo de 2022, num espaço físico “descaracterizado” e “autónomo” da Igreja, estando prevista a apresentação de um relatório no final do próximo ano. O financiamento dos trabalhos será assegurado pela CEP, mas estará aberto a eventuais contribuições de outras instituições.
Já em relação ao financiamento da comissão, Pedro Strecht disse que tal estará a cargo da CEP, embora tenha recusado que isso possa representar um condicionalismo no seu trabalho. Sem adiantar números, o médico pedopsiquiatra resumiu apenas que não chegará aos meios colocados à disposição em França e que rondaram os 2,5 milhões de euros, num trabalho que se prolongou por dois anos e meio e que abalou a Igreja Católica francesa.
“O financiamento, os meios, material e trabalho está a cargo da CEP, sem que isso nos torne dependentes ou não livres de executar o nosso trabalho. Se outros elementos da sociedade civil quiserem ou puderem vir a contribuir, obviamente agradecemos”, afirmou.
Em representação da CEP, o bispo José Ornelas reforçou o interesse da Igreja em apurar a verdade, mas evitou traçar expectativas sobre as descobertas e conclusões da comissão, a quem garantiu que terá meios de trabalho.
“Não sei o que espero, se soubesse não precisava de tanto trabalho. Assusta-me mais não saber do que a realidade que vai surgir. E que surja o mais realisticamente possível e o mais certa possível: este é o nosso interesse. Não vamos negar os meios necessários para facilitar a própria investigação. Será feito de acordo com as sugestões e as necessidades da comissão para a realização do seu trabalho”, concluiu.
O trabalho desta comissão independente vai decorrer ao longo de 2022, estando prevista a apresentação de um relatório no final do próximo ano.
Por sua vez, o presidente da CEP, o bispo José Ornelas, reivindicou a importância de se trilhar “um caminho de verdade, sem preconceitos nem encobrimentos” para a Igreja Católica portuguesa.
“A continuação deste caminho e as transformações que forem necessárias têm de partir do conhecimento da realidade”, frisou, acrescentando: “É essa realidade que pretendemos conhecer, nas suas dimensões, mas também e sobretudo nos dramas que esconde, a fim de que se possa ir ao encontro das pessoas que sofreram estes dramas, oferecendo a oportunidade de ter vez e voz, para verem reconhecida a sua justiça e a sua dignidade”.
D. José Ornelas reforçou o interesse da Igreja em apurar a verdade, mas evitou traçar expectativas sobre as descobertas e conclusões da comissão, a quem garantiu que terá meios de trabalho.
“Não sei o que espero, se soubesse não precisava de tanto trabalho. Assusta-me mais não saber do que a realidade que vai surgir. E que surja o mais realisticamente possível e o mais certa possível: este é o nosso interesse. Não vamos negar os meios necessários para facilitar a própria investigação. Será feito de acordo com as sugestões e as necessidades da comissão para a realização do seu trabalho”, concluiu.
O trabalho desta comissão independente vai decorrer ao longo de 2022, estando prevista a apresentação de um relatório no final do próximo ano.
(Com Lusa)