Pelo Pe. Marco Luciano Carvalho*
Em mais um ano somos convidados a viver o Tempo Litúrgico do Advento, que nos prepara para celebrar o Mistério da Encarnação. Neste tempo, somos convidados à vigilância e à alegre expectativa do Senhor que continua a vir à nossa história e a conduzir a sua Igreja pelos caminhos da Vida e da Esperança. No decorrer desta caminhada, lembramos sempre a segunda vinda de Cristo que acontecerá quando formos um com todos e todos em Cristo. Assim, estas verdades não podem ser vividas apenas e só como um conteúdo doutrinal, mas como pilares que nos devem inspirar e dar sentido à nossa vida. Daí a necessidade de sermos missionários dessa Boa Nova de verdade, anunciadores de que a vinda de Cristo está próxima, por palavras e com o testemunho de quem vive essa certeza. E é, sobretudo, num tempo de “crise de fé”, de falta de horizontes de uma Igreja desmotivada e arrefecida, de aparente vitória do consumismo sobre a mensagem do verdadeiro Natal, que se torna mais urgente acender e renovar o ânimo da esperança cristã. Fazendo um diagnóstico à nossa realidade insular, deparamo-nos com uma série de doenças que afectam as nossas comunidades: desintegração galopante das nossas famílias, dificuldade na educação das novas gerações, dificuldades económicas e ausência de valores morais e éticos, demissão dos pais no acompanhamento dos filhos, falta de cuidados primários em alguns sectores da sociedade, falta de trabalho e de uma habitação condigna para algumas famílias, etc… tudo isto são problemas e chagas sociais perante as quais a Igreja não pode ficar alheia e de braços cruzados.
Infelizmente, deixámo-nos há muito de viver o Tempo Litúrgico do Advento em toda a sua plenitude. O mundo oferece-nos uma cultura completamente diferente. O consumismo toma conta do Advento e as campanhas de Natal já parecem outra forma de consumo a par de um ambiente verdadeiramente materialista que se verifica nesta época do ano.
Neste degradante cenário, impõe-se uma voz que seja verdadeiramente sinal de contradição. Não bastarão as Campanhas de Advento que se fazem nas nossas catequeses, os cabazes distribuídos pelos grupos da pastoral social das nossas paróquias e as imensas iniciativas que decorrem nas nossas comunidades para assinalar mais uma caminhada de Advento. O desafio da nossa Diocese em reflectirmos a nossa realidade de Igreja como “Povo de Deus”, “Corpo de Cristo” e “Templos do Espírito Santo”, vem-nos colocar perante a encruzilhada da necessidade de trilhar um caminho com vista a uma Igreja cada vez mais missionária e coerente com os valores que anuncia.
Em cada Advento, ao mesmo tempo que preparamos o nascimento de Cristo, tentamos projectar no hoje da nossa vida aquilo que a Palavra nos pede, para que possamos corresponder e estar em sintonia permanente com a certeza que Cristo virá e que continua a vir ao nosso mundo através do nosso “testemunho cristão” e da forma como nós o tornamos presente naquilo que somos e fazemos. O sentido da Esperança Cristã, dá-nos a certeza que Ele continuará sempre a sentar-se connosco na mesa da História, para connosco partilhar o alimento da Palavra e do Pão Vivo que alimenta o viandante neste mundo passageiro e cheio de enganos.
Chamados a sermos missionários desta Boa Nova, é neste contexto de crise de fé e de falta de compromisso cristão que a Igreja não se pode contentar com algumas iniciativas de carácter pastoral para dinamizar o Tempo do Advento nas nossas paróquias. Urge escolher entre o mais do mesmo e aquilo que realmente pode mudar a vida cristã das nossas comunidades. A oração, a liturgia, a prática da caridade, o testemunho cristão são vias de esperança para cristãos renovados pela força da Palavra de Deus. É muito importante que os nossos cristãos participem nas campanhas que vão ter lugar nas nossas comunidades, nas novenas de Natal, nas iniciativas dos mais variados sectores de pastoral da nossa Ouvidoria; mas para haver verdadeiro Advento e verdadeiro Natal, é do nosso interior que devemos tratar e cuidar em primeiro lugar no decorrer desta caminhada. Para uma boa vivência do Natal, tenhamos presente a necessidade de nos abrirmos a um caminho de conversão, que nos faz ver para além das iluminações do Natal, que nos faz escutar para além das músicas natalícias colocadas nas zonas de comércio das nossas cidades e que nos faz agir para além das acções esporádicas de caridade sujeitas a um tempo específico do ano.
A necessidade de fazer Advento lembra-nos a urgência de pararmos e nos abstrairmos daquilo a que o mundo nos tem convidado e a não perdermos de vista o essencial deste tempo, que nos convida a um verdadeiro e importante encontro com Cristo, a principal razão de ser do Natal.
A todos uma boa caminhada de Advento e um Feliz e Santo Natal.
*Ouvidor da Horta