O Papa defendeu hoje em Nápoles uma “teologia do acolhimento e diálogo” que transforme o Mediterrâneo, promovendo o encontro entre pensadores católicos, judaicos e muçulmanos.
“O Mediterrâneo sempre foi um lugar de trânsito, trocas e, às vezes, até mesmo de conflito. Este lugar hoje levanta várias questões, muitas vezes dramáticas”, advertiu Francisco, que encerrou uma conferência de dois dias sobre o tema ‘Teologia depois da Veritatis Gaudium no contexto do Mediterrâneo’, promovido pela pontifícia faculdade teológica do sul da Itália.
Os especialistas de diversos países debateram perspetivas de coexistência pacífica e tolerante, a partir de temas como migrações, confrontos culturais, religiosos, muros, guerras ou lugares de diálogo como a arte, o discernimento, o conhecimento histórico, o respeito inter-religioso e a renovação da teologia.
Francisco propôs uma reflexão teológica capaz de solidariedade com “todos os náufragos” da história, aprendendo com os “erros e críticas” do passado e rejeitando qualquer “tentação de reconquista e de fechamento identitário”.
“O Mediterrâneo é precisamente o mar de miscigenação, um mar geograficamente fechado em relação aos oceanos, mas culturalmente sempre aberto ao encontro, ao diálogo e à inculturação recíproca”, aponto o Papa.
Francisco começou a sua intervenção, que durou mais de 30 minutos, com a questão do acolhimento de quem é “diferente” e o papel dos teólogos como promotores de “formas de fraternidade em vez de muros de separação”.
“Os estudantes de teologia devem ser educados em diálogo com o judaísmo e o islamismo para entender as raízes e diferenças comuns de nossas identidades religiosas e, assim, contribuir mais efetivamente para construir uma sociedade que valorize a diversidade e promova o respeito, a fraternidade e a coexistência pacífica”, sustentou.
A teologia, particularmente neste contexto, é chamada a ser uma teologia do acolhimento e a desenvolver um diálogo autêntico e sincero com instituições sociais e civis, com universidades e centros de pesquisa, com líderes religiosos e com todas as mulheres e homens de boa vontade, para construir na paz uma sociedade inclusiva e fraterna e para a custódia da criação”.
O Papa sustentou uma atividade de “discernimento”, atenta aos sofrimentos das populações, com “compaixão” pelas pessoas e pela “capacidade de interpretar cristãmente a realidade”.
Francisco abordou alguns dos temas que têm marcado o seu pontificado, como o alerta contra o “proselitismo”, entendido como uma imposição agressiva das próprias convicções de fé, ou a proposta de “não-violência como horizonte e conhecimento do mundo”.
A intervenção, que tinha o Mediterrâneo como pano de fundo, destacou a necessidade de narrativas “renovadas e partilhadas”, atentas à realidade “multicultural e multirreligiosa” e às “enormes injustiças sofridas por tantos pobres que vivem nas margens deste mar comum”.
O Papa advertiu para uma visão estática da tradição, defendendo a “liberdade teológica” num trabalho interdisciplinar e transdisciplinar, em rede.
“Na pregação ao Povo de Deus, por favor, não firam a fé do povo de Deus com questões disputadas. Estas são apenas para os teólogos, é a vossa missão, mas para o Povo de Deus substância que alimente a fé, que não a relativize”, apelou, numa passagem improvisada do discurso.
Os trabalhos partiram da constituição apostólica ‘Veritatis Gaudium’, assinada por Francisco em 2017, sobre as universidades e as faculdades eclesiásticas.
O pontífice recordou os “critérios evangélicos” apresentados por este documento, no qual se procura promover “uma teologia de discernimento, misericórdia e acolhimento, que se coloca em diálogo com a sociedade, culturas e religiões para a construção da coexistência pacífica de pessoas e povos”.
No final do encontro, o Papa cumprimenta os membros da Faculdade e a comunidade jesuíta, antes de regressar ao Vaticano, pelas 15h00 locais (menos uma em Lisboa).
Os trabalhos contaram com uma intervenção de Donatella Abignente, docente do curso e-learning ‘Pensamento Social Cristão: memória e projeto’ da Faculdade de Teologia da UCP sobre “o diálogo no contexto do Mediterrâneo”.
(Com Ecclesia)