Sacerdote Dominicano está a coorientar formação de leigos, agentes de pastoral e clero na Diocese de Angra
O Papa Francisco está a fazer uma “convocatória universal” que inclui sobretudo os leigos para operar as mudanças que ele considera necessárias, a partir de um programa de pontificado delineado e dado a conhecer na exortação apostólica, A Alegria do Evangelho, e que tem em vista a preparação de um novo concílio, disse esta sexta feira à noite Frei Bento Domingues, em Ponta Delgada.
Durante uma conferência destinada essencialmente a leigos e agentes de pastoral da ilha de São Miguel, o sacerdote dominicano afirmou que o Papa está a desencadear um processo de mudança, no qual quer implicar toda a igreja.
“Ele não quer resolver nada sozinho. O que pretende é atirar a pedra ao charco e corresponsabilizar as pessoas porque sabe que as verdadeiras mudanças não se operam por decreto”, disse o sacerdote dominicano que está nos Açores, no âmbito de uma ação de formação permanente inserida no programa comemorativo dos 800 anos da Ordem dos Dominicanos.
“Quem me dera que ele convocasse um concílio, mas este é um desejo intuitivo; também não há pressa porque se tudo andar demasiado rápido corremos o risco dele ser silenciado como aconteceu com João XXIII”, sublinhou Frei Bento Domingues.
A uma agenda centrada na igreja-marcada mediaticamente por “meia dúzia de assuntos” como a reforma da cúria, o combate à corrupção e à pedofilia dentro da hierarquia católica- Francisco respondeu com uma agenda social que “rebentou com tudo” em especial “com tabus”, disse o sacerdote.
O primeiro sinal começou pela escolha da residência –Santa Marta- uma casa na periferia do Vaticano; depois vieram as primeiras deslocações e audiências- visita a um centro de jovens delinquentes, ao “depósito” humano de Lampedusa, com centenas de imigrantes ilegais; a cerimónia de lava pés a reclusos ou o encontro com os movimentos populares da América Latina.
Na linha de João XXIII, “mas com outra visão das coisas”, diz Frei Bento Domingues, o Papa “devolveu a palavra às pessoas”, sobretudo “às periferias”.
“Na Exortação Apostólica- A Alegria do Evangelho- o Papa fala de uma igreja em saída missionária que veja a cúria a partir das periferias, dos excluídos”, diz o pregador dominicano que sublinha a “assertividade” e a “frontalidade” que o Papa usa “diariamente” quer nas homílias na Casa de Santa Marta, quer nos vários encontros que tem, seja no Parlamento Europeu, numa missa Campal com seis milhões de pessoas ou na Praça de São Pedro.
De acordo com Frei Bento Domingues, Francisco tem a consciência de que “só em conjunto a igreja pode dizer basta”, que “não compete à igreja apresentar um programa político”, mas o Papa, os Bispos, o clero e os leigos, “em conjunto podem denunciar e alertar” para as “periferias que o mundo atual produz”, porque o cristianismo é ”anti fatalista”.
“O Papa está a convocar a igreja mas não só a hierarquia. Ele sabe que precisa dos leigos para operar as mudanças que são necessárias”. De resto a escolha do nome Francisco, inspirado em Francisco de Assis, um leigo “é a prova de que lado está este papa”.
No entanto e apesar deste “génio que o faz derrubar tabus” como por exemplo “os da procriação ou das doenças que afetam a igreja”, o papa tem, no entender de Frei Bento Domingues, um “problema” entre mãos, “sem dúvida a maior periferia da igreja: as mulheres”.
Este é, segundo o sacerdote, “o maior desafio de Francisco: o que fazer com a maioria do laicado e que papel lhe dar dentro da hierarquia”, embora reconheça que a mensagem também aqui “seja relativamente clara”, mas implicará “necessariamente uma conversão” o que constituiria quase “um milagre”.
Segundo frei Bento Domingues, Francisco irá na linha do Evangelho: as mulheres “financiaram” o projeto de Jesus, acompanharam-no sempre desde a pregação ao sepulcro, foram testemunhas e nunca “Lhe pediram nada em troca”. Se calhar, diz Frei Bento Domingues, “é preciso olhar para esta questão e torna-las verdadeiras parceiras na vida cristã”.
Ainda no que respeita ao laicado, Frei Bento Domingues lembra que o tempo “de um modelo que responda a tudo está ultrapassado”; é preciso “parceria entre todos” e sobretudo, “evitar lutas de poder”.
Dentro da igreja “há uma hierarquia de ministérios”, bem delineada pelo Concilio Vaticano II, mas a igreja tem que “funcionar como uma comunidade de irmãos e aqui entra de novo a questão das mulheres”.
“Enquanto elas não forem parceiras em todos os momentos da vida cristã será difícil”, disse Frei Bento Domingues sublinhando, uma vez mais, o papel “ fundamental” dos leigos, não só na ação sócio caritativa- onde a igreja “mata a fome a muita gente” ou nos movimentos, que através da sua ação “devolvem dignidade ás pessoas”, mas na própria homília.
“Os leigos deveriam preparar algumas homílias com os padres porque a homília não é um momento para um padre fazer figura; é sobretudo um momento para cada um dos cristãos presentes na Eucaristia encontrar uma esperança para a semana que entra”, disse Frei Bento Domingues.
De resto a homília é um dos assuntos que Frei Bento Domingues e Frei José Nunes trazem à formação do clero, este fim de semana em São Miguel e depois na ilha Terceira. A iniciativa insere-se nas comemorações dos 800 anos da Ordem dos Dominicanos, que se realizam em 2016. Para assinalar a data o capítulo geral da Ordem decidiu, entre outras iniciativas, reacender a chama da pregação, concretamente da homilia, dinamizando escolas e cursos de pregação em todo o mundo. Angra é a sexta diocese portuguesa a receber a visita dos Frades Dominicanos, no nosso país.