O Papa alerta sua mensagem para o Dia Mundial das Comunicações Sociais, que se celebra hoje, para os perigos de uma manipulação de informação nas plataformas digitais.
“Tornaram-se evidentes, para todos, os riscos duma comunicação social não verificável. Há tempo que nos demos conta de como as notícias e até as imagens são facilmente manipuláveis, por infinitos motivos, às vezes por um banal narcisismo”, indica.
A mensagem para o 55.º Dia Mundial das Comunicações Sociais tem como tema ‘«Vem e verás» (Jo 1, 46). Comunicar encontrando as pessoas onde estão e como são’.
Francisco defende uma comunicação “transparente e honesta”, “tanto na redação dum jornal como no mundo da web, tanto na pregação comum da Igreja como na comunicação política ou social”.
O texto destaca a importância de “maior capacidade de discernimento e a um sentido de responsabilidade mais maduro”, na difusão e receção de conteúdos.
“Todos somos responsáveis pela comunicação que fazemos, pelas informações que damos, pelo controlo que podemos conjuntamente exercer sobre as notícias falsas, desmascarando-as”, precisa.
O Papa admite que a tecnologia digital permite uma informação “em primeira mão e rápida”, oferecendo mesmo a possibilidade de acompanhar acontecimentos que “seriam negligenciados pelos meios de comunicação tradicionais”.
A mensagem alerta, no entanto, que “na comunicação, nada pode jamais substituir, de todo, o ver pessoalmente”.
“O intenso fascínio de Jesus sobre quem se encontrava com Ele dependia da verdade da sua pregação, mas a eficácia daquilo que dizia era inseparável do seu olhar, das suas atitudes e até dos seus silêncios”, recorda.
O Papa questiona o que chama de “eloquência vazia” nas várias esferas da vida pública, destacando que, mais do que os recursos técnicos usados na comunicação, é a experiência humana que faz a diferença.
“Há mais de dois mil anos que uma corrente de encontros comunica o fascínio da aventura cristã. Por isso, o desafio que nos espera é o de comunicar, encontrando as pessoas onde estão e como são”, aponta.
Uma perspectiva nacional, vinda academia
Numa entrevista à Rádio Renascença/Ecclesia, no âmbito deste dia, Felisbela Lopes, docente da Universidade do Minho, apresentou um estudo onde os jornalistas são referenciados como uma âncora em momentos de grande ansiedade”.
A investigadora em jornalismo Felisbela Lopes disse que a “palavra ‘amigo’ é perigosa”, valorizou a “enorme responsabilidade social” dos jornalistas durante a pandemia e afirmou que a informação não pode “olhar sempre para a mesma realidade”.
“O Papa diz aos jornalistas que é preciso ‘ir aonde ninguém mais vai’. É um sublinhado muito pertinente, porque nós, através da informação, às vezes estamos a olhar sempre para a mesma realidade”, afirmou.
Felisbela Lopes considera que, em Portugal, a informação “não deixa de ser centralizada a partir de Lisboa”, em torno de redações centrais e de “certas fontes de informação”.
“Acontece o mesmo com a informação internacional, estamos sempre a iluminar determinadas partes do mundo”, disse a professora universitária, lembrando que há locais que não deixam de ser “espirais do silêncio”.
“Temos o dever de olhar para estes cantos, estas periferias, estas espirais do silêncio, que nem sempre estão no topo dos alinhamentos. ‘Ir onde ninguém mais vai’, como diz o Papa”, comentou Felisbela Lopes.
O Estudo sobre a cobertura mediática da Covid-19, coordenado por Felisbela Lopes, mereceu também a análise da convidada da Renascença e da Agência ECCLESIA, na entrevista deste domingo, considerando que o tempo pandémico corresponde a um “período de qualidade ao nível do trabalho jornalístico”.
“Os jornalistas em tempos de pandemia não conseguiram ir a todos os sítios onde gostariam de ir ou onde deveriam estar, mas isso não implica que se faça um balanço negativo da cobertura mediática, pelo contrário”, afirmou
Felisbela Lopes considera que “se as pessoas ficaram confinadas em casa, isso também se deveu, de certo modo, ao trabalho jornalístico”.
“Os jornalistas tiveram um papel importantíssimo, numa literacia, em ser âncora em momentos de grande ansiedade, de grande incerteza”, sublinhou.
“Este assumir, por parte da classe jornalística, que quiseram mesmo ajudar as pessoas, que olharam mesmo para a informação como serviço público, e que sentiram o jornalismo como o exercício de enorme responsabilidade social, a mim, que sou professora de jornalismo, encheu-me de uma enorme satisfação”, afirmou.
A professora de jornalismo lembra que a informação foi essencial para encontrar orientações num “quotidiano muito imprevisível, muito desconhecido”.
“De repente ficámos sem chão e uma das âncoras que nos puxou para um sítio mais seguro foi o jornalismo”, sublinhou.
Para a investigadora universitária, é necessário ter a consciência de que “é preciso pagar pela informação” e “sem meios o jornalismo não tem qualidade”.
Questionada sobre a relevância das redes sociais no contexto mediático, Felisbela Lopes alertou para os perigos de “ver o mundo “tal e qual” é partilhado.
“O mundo não é assim. Aliás, nas próprias redes sociais a palavra ‘amigo’ é perigosa. Nós não temos cinco mil amigos, isso não existe”, afirmou.
A professora da Universidade do Minho sublinhou a “enorme atualidade” da mensagem do Papa Francisco para o Dia Mundial das Comunicações Sociais, que se assinala este domingo.
“Penso que cada jornalista se revê naquilo que o Papa Francisco diz nesta mensagem, esta necessidade de estar com as pessoas, de as ouvir para chegar à realidade. O encontrar as pessoas nos sítios onde elas estão é um desafio de uma enorme atualidade”, afirmou.
Um olhar regional, a partir de uma redação generalista
Lilia Almeida, jornalista da Antena 1 Açores, que participou num debate organizado pelo Secretariado Nacional das Comunicações Sociais, na passada sexta-feira, destaca o desafio da desinstalação em nome de uma melhor informação.
“sabemos que ir aos locais, ir entrevistar as pessoas, ver pessoalmente, faz com que a informação seja mais fidedigna. Porém há inúmeras dificuldades: a pressão do tempo, a escassez de recursos humanos, por vezes poucos recursos financeiros e isso faz com que muitas vezes nos sentemos à secretária e que a informação seja produzida à frente do écran, com entrevistas telefónicas que não permitem o encontro com a notícia”, refere a jornalista.
“’Vem e verás’ (Jo 1, 46). Comunicar encontrando as pessoas onde estão e como são” é o tema proposto pelo Papa para o 55º Dia Mundial das Comunicações Sociais, que se assinala este domingo.
O Dia Mundial das Comunicações Sociais foi a única celebração do género estabelecida pelo Concílio Vaticano II, no decreto ‘Inter Mirifica’, em 1963; assinala-se, em cada ano, no domingo antes do Pentecostes.
(Com Ecclesia)