Painel “Lamentação sobre Cristo Morto” já está recuperado

Obra ímpar do maneirismo português, pintada por  Diogo Contreiras , regressa à Matriz de Vila Franca a 5 de Abril.

O Painel “Lamentação sobre Cristo Morto”, pintado na segunda metade do século XVI por Diogo Contreiras e propriedade da Igreja Matriz de São Miguel Arcanjo, Vila Franca do Campo, regressa a casa no próximo dia 5 de abril, ao fim de cinco anos de permanência no centro de restauro da ilha Terceira.

 

“É uma enorme alegria porque se trata de um verdadeiro milagre, no sentido de termos conseguido recuperar uma pintura com mais de quinhentos anos, com um inestimável valor histórico” disse ao Portal da Diocese o Pároco da Matriz de Vila Franca, Pe José Borges.

 

“Além disso esta pintura, porque nos transporta para a vida de Jesus – Cristo descido da cruz nos braços da mãe-, é uma excelente catequese viva para o momento que vivemos, que é a Quaresma”, acrescenta ainda o sacerdote que se empenhou pessoal e particularmente no acompanhamento deste restauro.

 

O painel tem uma dimensão “considerável” e um valor artístico “inestimável”, mas durante muito tempo esteve votado “ao abandono”, colocado na Capela direita do Cruzeiro da Matriz de Vila Franca do Campo, num espaço pouco iluminado.

 

Luís Bernardo Leite de Ataíde, historiador e diretor de artes do Museu Carlos Machado, em Ponta delgada, foi o primeiro a dar nota da importância desta obra de arte quer no âmbito do património artístico nacional quer no que respeita à conservação do património regional.

 

Mas “o valioso painel vivia esquecido até ser redescoberto em 2009” como salienta uma nota do professor e etnógrafo Rui de Sousa Martins, diretor do Museu de Vila Franca do Campo, num texto escrito para o jornal A Crença, a que o Portal teve acesso.

 

Nessa altura, a pintura foi objeto “de aturadas análises descritivas, comparativas e estilísticas, assim como de criteriosos trabalhos de conservação e restauro, apoiados no estudo da moldura, das oito tábuas de madeira de carvalho, provenientes do norte da Europa e da superfície original pintada, com recurso às modernas técnicas laboratoriais, entre as quais se destaca o contributo do Instituto José de Figueiredo de Lisboa”, acrescenta ainda o historiador que juntamente com José Borges, acompanhou de perto o processo de restauro.

 

“Os trabalhos efetuados revelaram o contributo iconográfico que se insere no ciclo comemorativo da Paixão e Morte do Senhor, representando, de forma primorosa e qualidade relevante a descida da cruz”, sublinha ainda  Rui de Sousa Martins no referido texto.

 

A pintura tem como imagem central Cristo amparado pela Mãe, tendo Maria Madalena ajoelhada à esquerda, mais duas Mulheres e três figuras masculinas (São João, José de Arimateia e Nicodemos) à direita, enquanto em segundo plano foram representadas as cruzes do Calvário, alguns soldados, assim como um conjunto arquitetónico simbolizando Jerusalém, sobre um céu carregado.

 

Sobre este painel, no decorrer do seu processo de conservação e restauro, Vítor Serrão, historiador da arte e docente da Faculdade de Letras de Lisboa, dizia, num artigo de opinião, que “ esta peça é uma das obras-primas da pintura antiga nos Açores, e uma das excelentes peças do Maneirismo em Portugal”.

 

O autor da obra, Diogo Contreiras, viveu no século XVI, entre 1521 a 1567, e é considerado uma das mais criativas personalidades da pintura quinhentista portuguesa e um dos iniciadores do Maneirismo em Portugal.

 

Senhor de um gosto muito personalizado, cedo se libertou das receitas da geração precedente e soube evoluir. Além da Lamentação sobre Cristo Morto, pintou também a excecional ‘Pregação de São João Batista’ exposta no Museu Nacional de Arte Antiga, em Lisboa.

 

De referir que os exigentes processos de conservação e restauro da obra, suportados na íntegra pelo Governo Regional dos Açores, serviram também de base à primeira tese de mestrado em Património, Museologia e Desenvolvimento, da autoria do conservador-restaurador terceirense Raúl Gregório, técnico da Oficina de Pintura da DRC, defendida na Universidade dos Açores , em 2012.

 

Lamentação sobre Cristo Morto regressa no próximo dia 5 de abril à sua “casa mãe”, permitindo aos vilafranquenses e a todos os que ali se desloquem, uma verdadeira fruição do espirito, conjugando a arte com a fé.

 

O regresso será assinalado com uma cerimónia solene na Igreja, que começa às 21h00 e que constará de uma apresentação da obra, com um enquadramento técnico, histórico e artístico, seguindo-se um momento musical com Svetlana Pascoal, Natália Ferraz, Ana Ferreira e o Coro da Matriz de Vila Franca do Campo.

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