Pe. Carlos Cabecinhas inaugurou ciclo de conferências comemorativas do 60º aniversário do Santuário diocesano do Senhor Santo Cristo dos Milagres
O reitor do Santuário de Fátima, o Pe. Carlos Cabecinhas, afirmou este domingo, na conferência inaugural de um ciclo que assinalará o 60º aniversário da elevação do Santuário do Senhor Santo Cristo dos Milagres a santuário diocesano, que os Santuários além de lugares próprios de oração podem ser verdadeiras escolas de oração pessoal e comunitária. Para tanto será necessário adequar o seu espaço e simultaneamente cuidar dos vários subsídios de oração que nele se disponibilizam, “nutrindo-os” da palavra de Deus.
“Podemos rezar em toda a parte e em qualquer lugar; porém, é importante cuidar do lugar para a oração, se a quisermos realmente valorizar” afirmou o sacerdote destacando que a oração é um “estímulo constante na vida de todo o cristão que queira participar plena, ativa, consciente e piedosamente na Liturgia, bem como de todo o cristão que queira viver o serviço aos irmãos”.
O sacerdote, responsável pelo mais importante santuário português e um dos mais importantes do mundo- lembrou que os santuários, para serem verdadeiras escolas de oração, têm de apresentar propostas de oração “nutridas da Palavra de Deus” e por isso com uma “forte inspiração e conteúdos bíblicos”; essas propostas de oração devem harmonizar-se com a liturgia, acompanhando o ritmo do ano litúrgico e devem partir da realidade da vida quotidiana do próprio Santuário, tendo em conta a especificidade da sua mensagem.
“Os santuários cristãos, enquanto lugares em que o Espírito fala através da mensagem específica ligada a cada um deles e reconhecida pela Igreja, são também lugares em que as celebrações litúrgicas, os exercícios de piedade e a oração assumem uma particular importância” afirmou o sacerdote numa sessão que teve lugar na própria igreja do Senhor Santo Cristo em Ponta Delgada.
“Claro que se sublinha o quanto a oração pessoal e as manifestações de piedade popular devem nutrir-se da Palavra de Deus, mas a grande acentuação é o primado da Liturgia, que deve inspirar as restantes expressões de oração” esclareceu o Pe. Carlos Cabecinhas, doutor em liturgia.
O sacerdote, que se deteve mais do que uma vez nos documentos da igreja sobre liturgia e santuários, lembrou que os santuários, como lugares especiais de oração, devem ser cuidados. E deu exemplos do que se pode fazer para melhorar o acolhimento dos peregrinos e facilitar o ambiente de oração.
“Por vezes temos de rezar “contra o espaço”, e facilmente compreendemos o quanto dificulta a expressão orante e a concentração. Cuidar dos espaços, para que sejam aptos e adequados à oração – comunitária ou individual, litúrgica ou não – é fundamental nos nossos santuários. E não pensemos apenas em obras de monta: preparar o espaço para a oração tem que ver com a limpeza, a ornamentação, o ambiente…”, disse.
Além dos espaços físicos, há um outro “elemento determinante: o silêncio”.
“Vivemos num mundo acelerado e ruidoso. Vivemos tão envolvidos em ruídos, que quase já nem sabermos viver sem alguém a dizer não importa o quê, sem um rádio a tocar, ou sem uma televisão ligada” afirmou o sacerdote.
“A visita aos santuários deveria ser um convite ao silêncio, porque não há oração onde não há silêncio. E aqui reside uma das nossas maiores dificuldades, hoje. Tem-se vindo a perder a capacidade de fazer silêncio e já se perdeu a perceção dos espaços sagrados e das atitudes a assumir em tais lugares. Hoje é frequente, em qualquer igreja, ouvir falar em voz alta, como se nos encontrássemos na rua, no meio de uma praça. Conseguirmos preservar o ambiente de oração nos santuários é um enorme desafio! Mas é condição para a oração” completou.
O reitor falou, ainda, da peregrinação como “itinerário de oração”, que nos vários documentos da igreja é apresentada como uma caminhada de oração, que se adequa a cada etapa do caminho, desde a partida da igreja paroquial até à chegada à meta final.
O reitor apresentou o exemplo de Fátima e deixou pistas para o santuário do Senhor Santo Cristo.
“A mensagem própria de um santuário e a sua especificidade condicionam necessariamente toda a pastoral desenvolvida pelo santuário, também a nível da oração e da celebração” afirmou o Pe. Carlos Cabecinhas.
“Não pode ser indiferente ou neutra a celebração da fé ou a oração que se faz no santuário, como se tivesse lugar em qualquer outro lugar. Há uma riqueza própria do lugar, um “carisma” de cada santuário, que tem que ver com a mensagem, com o acontecimento que lhe está na origem, com a invocação a que está consagrado… E isto tem que necessariamente marcar e enriquecer toda a ação que nele se desenvolve” acrescentou ainda.
Apresentando Fátima como um lugar de oração, cuja característica mais marcante é o silêncio e o terço, o reitor do Santuário da Cova da Iria, que no ano passado viveu a festa do Centenário das Aparições de Nossa Senhora, identificou a devoção dos cinco primeiros sábados como algo “especificamente fatimita”.
Os elementos que constituem esta devoção são: a confissão, com sentido reparador que, não sendo possível fazer-se no próprio dia, pode fazer-se antes ou depois; a comunhão no primeiro sábado; a oração do terço; e quinze minutos de companhia a Nossa Senhora, meditando os mistérios do Rosário.
“Como se vê, esta devoção conjuga a dimensão sacramental das práticas litúrgicas com os exercícios de piedade”, concluiu o Reitor.
“Quando falamos de Fátima, temos uma mensagem específica e exortações e indicações de oração explícitas. Trata-se da tal especificidade, que marca a vida de oração do santuário e a espiritualidade daqueles que se deixam guiar pela mensagem” esclareceu interpelando os presentes sobre o caso do Santuário diocesano do Senhor Santo Cristo, cuja especificidade no seu entender é a veneração da imagem do Senhor Santo Cristo e a grande procissão anual.
“Estes são apenas dois elementos que marcam a especificidade da oração neste santuário. Mas há outros, de especial importância” disse o Pe. Carlos Cabecinhas.
Um ciclo exigente
Esta foi a primeira de quatro conferências que se estenderão ao longo do próximo ano, que também viverá um simpósio de dois dias sobre a religiosidade popular, centrado no Culto do Espírito Santo e do Senhor Santo Cristo e que reunirá especialistas de várias áreas de saber.
O objectivo deste programa festivo é promover o culto e fazer as pessoas a repensarem a sua fé à luz de Cristo, afirma o reitor do Santuário, cónego Adriano Borges.
A segunda conferência tem lugar em Vila Franca do Campo e será proferida pelo padre Alexandre Palma, docente da Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa. Falará sobre “Jesus, Ecce Homo”.
No dia 19 de Março, o padre José da Silva Lima, de Coimbra, falará sobre o “Santuário, arte de cuidar”. A última conferência será protagonizada por D. Carlos Azevedo, do Conselho Pontifício para a Cultura e debruçar-se-á sobre o tema “Viver em Cristo: pleno humanismo de santidade”. Será no dia 12 de Julho, último dia do Simpósio que abordará a temática da religiosidade popular, centrada nos cultos ao Espírito Santo e ao Senhor Santo Cristo dos Milagres.
“O Espírito Santo e também o Santo Cristo têm uma presença em todas as ilhas e por isso falar sobre eles é falar também um pouco de nós”, afirmou o cónego Adriano Borges, em declarações ao Igreja Açores .
O programa festivo do Santuário conta ainda com a festa dos Espinhos, no dia 23 de Março e, no dia 22 de Abril, será celebrada uma Missa de acção de graças pelo 60º aniversário da criação deste Santuário diocesano.
No dia 24 de Maio realiza-se o primeiro Encontro de Reitores dos Santuários Diocesanos dos Açores, que precede o fim-de-semana da festividade maior deste lugar de culto em Ponta Delgada
O culto ao Senhor Santo Cristo dos Milagres foi impulsionado a partir dos séculos XVII e XVIII, dentro dos princípios adotados pela Igreja Católica no Concílio de Trento, no sentido da defesa da importância do culto e da veneração de imagens, um dos princípios de divergência em relação à Reforma protestante.
Na atualidade, aquando das festas em honra do Senhor Santo Cristo, uma multidão acorre ao Campo de São Francisco e ao Convento da Esperança para viver e celebrar uma das maiores manifestações de devoção, fé e respeito. Além de se prestar homenagem à imagem do Senhor, são pagas as promessas feitas.