Os bens culturais “têm de estar ao serviço da pastoral” refere Diretora do Secretariado Nacional dos Bens Culturais da Igreja

Foto: Igreja Açores/CR

Fátima Eusébio apresenta esta noite o livro sobre a paróquia das Capelas, uma edição de textos que recuperam a memória de uma das mais antigas paróquias da ilha de São Miguel

Os bens culturais da Igreja comunicam uma identidade que vai muito para além do valor histórico e da beleza estética, que deve e tem de ser colocada ao serviço da evangelização, afirmou esta tarde, em declarações ao sítio Igreja Açores, a diretora do Secretariado Nacional dos bens Culturais da Igreja.

“Os bens culturais são o que nos torna presentes e visíveis em toda a sociedade, de crentes e não crentes e infelizmente não temos sabido tirar partido disso, o que é mais surpreendente numa altura em que cada vez mais o património da Igreja é procurado” refere Fátima Eusébio.

“Hoje o turismo é cada vez mais uma realidade e os bens da Igreja, com inegável valor artístico, são cada vez mais procurados e vistos. Vemos filas às portas das catedrais, de basílicas, de santuários… e não estamos a tirar partido disso. Será que não podemos dar mais ao turista para além da beleza e da história? Poderíamos utilizar este turismo para comunicarmos essa identidade”, refere a responsável que é também a diretora do Departamento dos Bens Culturais da Diocese de Viseu desde 2007.

“Temos muito caminho a fazer. Desde logo, as dioceses têm de se dotar de recursos humanos que possam trabalhar esta área e possam acrescentar valor à informação que é dada nas Igrejas e nos espaços museológicos” refere ainda a responsável sublinhando alguns passos que podem ser dados de imediato na valorização pastoral ao serviço da missão evangelizadora da Igreja a partir do seu património móvel e imóvel.

“A sinalética, por exemplo, que é tão deficiente não se deve limitar à identidade do autor ou à data da peça mas deve explicar a sua função no contexto daquele espaço; temos de aprender a fazer a musealização do sagrado de forma a que esteja ao serviço” explicita sublinhando a importância da Igreja ter guias formados e preparados para acompanhar as visitas guiadas a igrejas ou espaços museológicos próprios.

“Um museu diocesano, de arte sacra, não é um museu do estado; tudo na Igreja tem uma função que vai para além do adorno estético e é essa função que explica aquela peça, aquele espaço e lhe dá uma identidade diferente”, refere.

“Não se trata de transformar visitas guiadas em sessões de catequese mas de dar elementos identificativos da fé cristã através da explicação da funcionalidade ou da presença daquele elemento naquele contexto. É claro que temos de continuar a inventariar o património, temos de o estudar e preservar mas temos de lhe dar uma narrativa colocando os bens culturais ao serviço da pastoral e da evangelização”, conclui Fátima Eusébio, que lamenta nem sempre haver esta compreensão, “até ao nível do Vaticano que, estranhamente, na nova orgânica perdeu a Comissão Pontifícia para os Bens Culturais, agora integrada noutros dicastérios”.

“Temos de voltar mesmo dentro das comunidades a dar uma nova significação às nossas imagens; as pessoas devem perceber que o seu património, cada elemento está ali porque fala de Deus e tudo nos remete para Ele”.

Por outro lado, defende um maior diálogo entre o passado e o presente na comunicação e integração do património.

“Também aqui temos caminho a fazer pois, até agora, nem sempre houve a capacidade de mostrar as virtudes do diálogo da arte contemporânea com o passado. Cada tempo tem a sua linguagem própria e o desafio é integrar essa linguagem com outras linguagens já existentes. É da sua articulação que se faz a história. Não podemos continuar presos apenas a uma linguagem que foi do passado” diz,  recordando que a Igreja através das encomendas que fazia foi uma grande patrona das artes, o que infelizmente “se perdeu”.

“Deixámos de ser o motor, e afastamo-nos daquilo que era o posicionamento da arte no diálogo com o mundo. Às vezes parece que perdemos a vontade de nos abrirmos ao novo, deixando que o Espírito Santo opere neste ou naquele artista”.

A diretora do Secretariado Nacional dos bens Culturais da Igreja, que olha para os Santuários como espaços onde o silêncio e o acolhimento são duas traves mestras, vai estar hoje nas Capelas para a  apresentação do livro “Paróquia das Capelas – História, Património e Vivências”.

O livro é composto por duas partes: estudos e testemunhos e integra um amplo conjunto de textos que explora a interseção entre história, arte, património e vivências religiosas da paróquia. Por isso, constitui-se também como uma forma de celebração dos elementos identitários que moldam e enriquecem esta comunidade secular ao longo do tempo. Ao nível dos estudos, há dez textos escritos por autores, com vínculos institucionais distintos.

A segunda da parte do livro é composta por vinte e três testemunhos.

“É um livro feito de histórias que transmitem os afectos daquela comunidade entre si e para com a Igreja de que fazem parte e por isso, só por isso, este livro já valeria a pena, porque nos coloca em presença da memória da comunidade sobre a sua paróquia, que é sempre viva” refere Fátima Eusébio.

“O livro coloca nomes às pessoas que ao longo dos séculos estiveram no anonimato mas contribuíram para a vida da comunidade. Mas, é ao mesmo tempo, um livro que vai para além da paróquia pois este livro insere-se também na perspetiva da elaboração da história religiosa dos Açores e esta história faz-se de muitas histórias” que juntas, contam “a identidade da própria diocese”, conclui.

 

Scroll to Top