Por Carmo Rodeia
Dentro de uma semana, os Açores vão ter um novo parlamento e um novo governo, que abrem um novo ciclo político no arquipélago. As eleições do passado mês trouxeram um outro xadrez parlamentar, com a estreia de três novos partidos; roubaram a maioria ao PS e permitiram a criação de uma nova maioria de direita na Assembleia Legislativa dos Açores.
O voto popular é soberano e o resultado eleitoral claro: o PS venceu, com mais votos e com mais mandatos no parlamento. Mas não os suficientes para conseguir viabilizar sozinho o programa de Governo, que tem de ser votado no parlamento para prosseguir caminho. Se buscou entendimentos, pelos vistos não o conseguiu, ao contrário dos partidos da direita que se entenderam numa solução governativa, com dois acordos de incidência parlamentar, que viabilizarão a passagem do programa de governo liderado agora pelo PSD.
Mantenho, como há cinco anos, a mesma opinião: quem ganha as eleições deve governar, com a responsabilidade acrescida, se não tiver maioria absoluta, de ser capaz de encontrar os parceiros necessários e suficientes para garantir a tão desejada estabilidade.
Por outro lado, sendo absolutamente contra os extremismos, não posso considerar os eleitores dos partidos mais radicais como filhos de um Deus menor. Da direita à esquerda! Aliás, creio mesmo que a melhor forma de combatermos esses partidos, como devem ser combatidos, não é ignorando-os mas dando-lhes uma resposta adequada e assertiva, denunciando a sua nocividade e mostrando que muitas das suas propostas- ideológicas ou, simplesmente, oportunistas- não passam de retórica que, na maioria da vezes, representam um atraso civilizacional. Isto não ameniza um sentimento de tristeza por ver partidos personalistas, profundamente humanistas e partidários dos valores civilizacionais em que cresci, de braço dado com populismos emergentes.
Mas muito mais importante do que tudo isto é discutirmos o que é que a nova realidade política açoriana trará aos açorianos. Sobretudo porque sabemos que a que nos trouxe até aqui, durante 24 anos, não conseguiu melhorar a nossa vida. Aliás, facto muito salientado na caracterização sócio-económica que a Diocese acabou de fazer na sua Assembleia Sinodal, que reuniu os membros dos conselhos pastoral e presbiteral, no inicio de outubro em Ponta Delgada.
Continuamos a ser a região mais pobre do país: temos os piores indicadores nacionais em termos de educação, seja no nível de escolaridade, abandono escolar ou retenção; temos a maior percentagem de beneficiários do país de Rendimento Social de Inserção (mais de 10% da população depende desta prestação para viver); o nível de emprego é dos mais baixos e o do desemprego acima da média nacional; o acesso à saúde também é deficitário, sobretudo no que toca às ilhas mais pequenas em relação às ilhas que possuem cuidados diferenciados e a esperança média de vida no arquipélago é menor; um sector publico empresarial falido mas do qual dependem milhares de açorianos; uma iniciativa privada demasiado concentrada nas mãos de dois ou três grupos com efetiva solidez. E poderia continuar com outros indicadores que mostram bem a nossa vulnerabilidade.
Lembro-me que quando questionado sobre a eleição de Trump, nos Estados Unidos há quatro anos, o papa Francisco afirmou: “Eu não emito juízos sobre pessoas ou homens da política; a única coisa que quero entender é como é que a sua forma de proceder pode afectar ainda mais os pobres e os excluídos”.
Qualquer cristão tem sede de Deus, mas tem de ter também sede de justiça, de verdade e de paz, que é como quem diz de desenvolvimento e equilíbrio social. Qualquer política que não assente na construção do bem comum e não promova o desenvolvimento humano integral, do “homem todo e de todos os homens”, como sublinhou Paulo VI, na Populorum Progressio, ficará sempre aquém.
Era bom, que nos próximos dias em vez de discutirmos pessoas falássemos de políticas, mas para isso precisamos de as conhecer.
Tal e qual!, como diria o alentejano pouco dado a evangelhos e a coisas da Igreja, mas sempre atento à política.