Por Tomaz Dentinho
O referendo da Grécia é um passo fundamental para os gregos e para os europeus. Trata-se de um passo tremendo de um povo que, por erros de política nacional e europeia, tem que decidir entre dois males: o sacrifício de curto e médio prazo para permanecer no euro, ganhar credibilidade nos mercados da dívida e manter-se ao nível dos mais desenvolvidos; ou, alternativamente, o sacrifício no curto prazo saindo do euro passando a um segundo nível de desenvolvimento e prontificando-se a servir os turistas a preços baixos para estrangeiros e altos para gregos.
Termina assim, na Grécia e na Europa, o período da demagogia orçamental em que governos e oposições, com a conivência e palmas dos votantes e abstenção de eleitores, podiam prometer e até cumprir mundos e fundos para ganhar eleições; só que tudo à custa do aumento da dívida pública; para bem de uns tantos fornecedores estrangeiros, para ilusão dos votantes e ilusão dos contribuintes. De agora em diante quando nos disserem que vão fazer isto e aquilo depois das eleições, ou quando nos oferecerem isto e aquilo antes das eleições, ficamos desconfiados e desejosos de saber de onde vem o dinheiro para tão estranha generosidade de darem com a nossa dívida.
Há décadas ultrapassámos a demagogia da inflação quando percebemos que os aumentos salariais indexados à inflação do ano anterior resultavam invariavelmente em mais inflação no ano seguinte e maior redução do poder de compra. Também estamos ultrapassando a demagogia de que os funcionários públicos são melhores ou piores que os restantes empregados; basta que uns e outros tenham uma remuneração condigna e sejam estimulados pelo bom desempenho, para naturalmente servirem melhor.
Com o tempo vamos percebendo os males das más gestões urbanas que criaram cidades com inundações, custos de transportes elevados, bairros degradados, ruas insalubres e praças inseguras. São erros mais difíceis de corrigir mas não há dúvida de que, como a assunção dos erros, está aberto um espaço maior para o exercício da cidadania e a busca do bem comum. Também os técnicos começam a ser mais responsáveis e menos medrosos ou corruptíveis.
Sobretudo vamos percebendo que a culpa da situação em que nos encontramos, e em que os gregos se encontram, é nossa e dos gregos. Quando votámos em promessas e obras feitas com o dinheiro dos nossos filhos, quando batemos palmas ou nos calámos quando alguma coisa nos parecia estranho, quando aceitamos que nos inundem com a dicotomia do sim ou não à austeridade (que é não ou sim a mais dívida) e não nos confrontem com as verdadeiras opções de afectar bens públicos aos novos ou aos velhos, aos produtivos ou aos pensionistas, ao norte ou ao sul, aos exportadores ou aos importadores.
Numa campanha da internet ao nível global contribui com 10 Euros para pagar a dívida grega. Gesto simbólico que multiplicado por 1/3 dos europeus daria para pagar os compromissos próximos da dívida grega. Se pensássemos em cada passo que demos depois da entrada no euro teríamos evitado uma história que só não foi igual à dos gregos porque conseguimos que acreditassem em nós; até ver. Em democracia a culpa é nossa. Viva a democracia que nos responsabiliza.