“Se as coisas não partem da comunidade em si não podem ter bons resultados” diz padre Manuel António das Matas
A participação e a comunhão “são essenciais” para a vida da Igreja e o caminho da sinodalidade parece ser uma resposta para este tempo mas, na verdade, esta caminhada que a diocese vive há três ainda não despertou o entusiasmo do Congresso de Leigos no inicio da década de 90, do século XX. A opinião é do ouvidor de São Jorge que recorda com saudade “o entusiasmo” e a vivência desse tempo, distinta da forma como as comunidades estão hoje a viver esta proposta de sinodalidade, definida “quase a uma só voz e que ainda persiste” na diocese e agora também vinda de Roma.
“Esta questão da sinodalidade não foi bem percebida, eu próprio não a percebi bem. Procurei perceber melhor o que era e até perguntei se seria o tempo oportuno para isso” recorda reportando-se ao Conselho Presbiteral que decidiu este percurso, iniciado há três anos na diocese de Angra.
“Tenho esperança que surja alguma luz nesta questão. Vivi muito intensamente o congresso de leigos nesta diocese- de são Jorge levámos 14 leigos- correu muito bem porque houve uma preparação muito boa para o congresso. O que era a paróquia, falou-se da vida paroquial, dos novos dinamismos; agora com esta caminhada não vejo o mesmo entusiasmo e ainda não vejo grandes iniciativas a partir do povo e se as coisas não partem da comunidade em si não podem ter bons resultados” esclarece.
“Vamos ver, percebo que não podemos parar”, enfatiza deixando uma sugestão: “Nós estamos a viver um tempo muito engraçado do Espírito Santo e Ele não está ausente da nossa Igreja nem da nossa vida. Tenhamos fé na sua ação. O nosso povo percebe muito bem a ação do Espírito, embora a igreja esteja sempre com reservas em relação a estas festas…Temos de estar atentos à força do Espírito Santo para percebermos a ação que Ele vai fazendo junto das comunidades e daí interpretarmos” diz ainda.
“As coisas quando partem do povo permanecem e quando vêm de cima, impostas, vão-se esvaindo” conclui o sacerdote numa entrevista ao programa de Rádio Igreja Açores que vai para o ar este domingo no Rádio Clube de Angra e na Antena 1 Açores, depois do meio-dia.
Sobre a Igreja local reconhece que os movimentos de apostolado estão moribundos na ilha de São Jorge, por falta de pessoas e de capacidade de renovação de alguns que foram bem ativos há três décadas atrás.
“Neste momento não temos movimentos. Há 33 anos, quando para cá vim éramos 9 sacerdotes para servir mais de 13 mil pessoas. Hoje somos seis para oito mil pessoas…Não temos movimentos porque não temos pessoas” avança.
“Os movimentos não tiveram capacidade de se renovar, por falta de jovens, creio. Como não nos renovamos não temos movimentos de pastoral” afirma sublinhando, no entanto, “que o tempo hoje também é diferente, marcado por uma grande indiferença e, por isso, é necessário encontrar novos caminhos e novos movimentos de apostolado que dêem resposta às necessidades de hoje”.
“Mesmo a pastoral juvenil com retiros e com atividades, desde que começou a pandemia nunca mais conseguimos fazer nada” lamenta ao destacar o entusiasmo momentâneo que depois não se manifesta no compromisso mais duradoiro dos jovens. E exemplifica: “Não basta dizer que acredito; é preciso dar o passo seguinte. Quando fazemos um retiro de jovens, no final, saem entusiasmados mas depois talvez não encontrem os movimentos adequados para se inserir; há aqui qualquer coisa que está a falhar” afirma reconhecendo que há um grande desafio que a Igreja tem de abraçar e que é fazer com que este entusiamo “não esmoreça e tenha continuidade”.
“Uma igreja com jovens é diferente; é sempre melhor termos jovens a participar e eles participam mas falta depois a continuidade”, insiste.
Depois da pandemia veio a crise sismo-vulcânica na ilha e a participação da população continua adiada.
“A ocupação das igrejas está muito aquém de outros tempos” refere.
“Temos de encontrar novos caminhos de fé porque os tempos são outros”, acrescenta.
“Como vai ser? Não sei, mas todos juntos iremos encontrar este novo caminho. Não somos só nós os sacerdotes que o desejamos são as próprias comunidades”, afirmou.
A entrevista do ouvidor de São Jorge pode ser ouvida na integra este domingo no Rádio Clube de Angra e na Antena 1 Açores, a partir do meio-dia.
Na entrevista fala ainda do Santuário diocesano do Santo Cristo da Caldeira- um lugar que proporciona o encontro com o transcendente e por isso deve ser acarinhado-, dos desafios da igreja local e deste período de sede vacante que, a partir de São Jorge, até pode nem ser uma questão premente.