O documento ‘A face mutante do presbítero e as metamorfoses eclesiais em curso’, divulgado no congresso internacional sobre os seminários que decorre em Braga, sustenta que o atual modelo de formação está “esgotado” e exige mudanças.
“Esse modelo está claramente esgotado”, diz à Agência Ecclesia Manuel Pinto, da Universidade do Minho – Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade, relator do texto.
O documento foi construído pelo grupo de professores que fazem parte da comissão científica do congresso internacional sobre a problemática dos seminários católicos, intitulado ‘Erguendo os olhos e vendo’, que decorre desde quarta-feira até sábado – Alexandre Palma, Luís Miguel, Fabrizia Raguso, Manuel Pinto, João Duque, Alfredo Teixeira, Joaquim Félix.
Os autores, ligados a áreas como a teologia antropologia, psicologia e comunicação, ligam o texto ao que foi apresentado em 2010, por ocasião do congresso internacional sobre o presbítero, intitulado ‘À escuta da Palavra’.
Manuel Pinto admite que tem havido um esforço, desde o Concílio Vaticano II (1962-1965) no sentido de “aperfeiçoar, melhorar, inovar nalguns aspetos importantes”, mas há “fatores que ultrapassam a própria Igreja”, como a crise demográfica.
“São questões societais, multifatoriais, e isso leva a que tenha de haver uma busca de novos caminhos”, precisa.
O entrevistado alerta, em particular, para o modelo tridentino de uma formação “separada”, que não foi mudado, desejando um maior “entrosamento com a vida das comunidades” e com as “situações normais da vida”.
“É sempre a partir de uma cultura da separação que esse contacto ocorre”, insiste.
Manuel Pinto refere que os seminários ainda são “bolhas”, apesar dos esforços de introduzir outras dimensões na formação dos futuros padres e de reforçar a presença das mulheres ou casais neste percurso.
“Estamos numa fase em que, ou tomamos a iniciativa, ou a realidade acabará por condicionar a nossa situação, obrigando a uma nova agenda”, acrescenta.
O congresso assinala os 450 anos do Seminário Conciliar de Braga, fundado após o Concílio de Trento (1545-1563) por São Bartolomeu dos Mártires.
O relator do novo documento sobre a figura dos sacerdotes assinala que, apesar de novos documentos orientadores sobre formação de sacerdotes, a nível nacional e da Santa Sé, se corre o risco de “continuar a falar como se a realidade não tivesse mudado”.
“Os seminários não vivem desligados das comunidades cristãs, portanto aqui é que se coloca o problema da sinodalidade”, indica.
“Estamos diante de uma excelente oportunidade, com este dinamismo lançado à Igreja, que mexe com as bases, para tentar aproveitar a viagem do Povo de Deus e procurar novos caminhos, indo de encontro ao que as comunidades precisam”.
Para Manuel Pinto, é importante evitar que o discurso sobre a vocação sacerdotal se restrinja à “experiência subjetiva” de quem se sente chamado à vida presbiteral.
“Se calhar, há outros caminhos para explorar. Por exemplo, uma comunidade pode – tal como faz já hoje, em relação aos diáconos permanentes -, na sua própria dinâmica, sugerir que um membro seu se prepare para prestar um serviço a essa mesma comunidade”, afirma.
O debate, prossegue, exige “seriedade” e a “salvaguarda da qualidade da formação”.
“Ninguém põe em causa a importância do presbítero, o que se coloca muitas vezes em causa é o tipo de presbítero que temos tido”, refere.
O relator do documento, apresentado esta quinta-feira, sublinha que é necessário explorar outras possibilidades, neste campo, com base em experiências noutros países.
As “múltiplas realidades” existentes exigem “caminhos diferentes”, incluindo a discussão de assuntos mais problemáticos, como a ordenação de homens casados, os sacerdotes dispensados do ministério ou o diaconado feminino.
“Estamos diante de provocações da realidade, temos de ponderar, discernir que futuro queremos para a Igreja, para as comunidades”, conclui Manuel Pinto.
A Arquidiocese de Braga no Auditório Vita este congresso internacional, preparado por uma comissão científica em coordenação com o Centro Regional de Braga da UCP, contando com a presença de responsáveis católicos e investigadores de Portugal, França e Itália.
Na sessão de abertura o arcebispo de Braga, D. José Cordeiro sublinhou que o Seminário representa para a Igreja local um dos bens mais preciosos e que os Seminários “requerem atenção apurada”.
Para o arcebispo primaz, “os padres de hoje são aqueles a quem cabe gerir a fase pós-conciliar e pós-moderna”.
“A sociedade, a família, o Seminário estão a passar momentos de grandes mudanças, que exigem um repensamento e sentido de pertença e identidade”, assinalou, numa intervenção citada pela página online da Arquidiocese minhota.
‘Onde nos poderiam levar estes 450 anos?’ foi o mote para uma conversa acerca do futuro dos seminários que, na tarde de quarta-feira, reuniu o bispo de Leiria-Fátima e presidente da Conferência Episcopal Portuguesa, D. José Ornelas, o superior da Casa de Escritores da revista Brotéria, José Frazão Correia, e o escritor e diretor pedagógico do Colégio Luso-Francês, José Rui Teixeira.
“Não somos uma Igreja perfeita, mas uma Igreja que não se resigna a ser imperfeita e não teme buscar caminhos novos”, disse D. José Ornelas.
Na Assembleia Plenária de Novembro, a Conferência Episcopal Portuguesa aprovou, na generalidade, o novo texto orientador sobre formação de sacerdotes, a nível nacional, tendo por base o documento da Santa Sé publicado em 2016.
D. António Augusto Azevedo, presidente da Comissão Episcopal das Vocações e Ministérios, apresentou a nova ‘Ratio Nationalis Institutionis Sacerdotalis’, intitulada “O Dom da Vocação Presbiteral”, estruturada em três partes: contexto sociológico e pastoral vocacional, formação inicial para o sacerdócio e desafios para o acompanhamento no pós-seminário.
(Com Ecclesia)