“Não terás outros Deuses além de Mim”

Esta é a segunda reflexão feita pelo Bispo de Angra sobre a Quaresma.

IMAGENS DE DEUS (2)

«Não terás outros deuses além de Mim» (Dt 5, 7)

A expressão faz parte do credo da fé bíblica no AT. Contra os falsos deuses. É uma advertência também contra as falsas imagens de Deus, que O transformam igualmente em ídolo. A caminhada quaresmal de conversão a Deus deve levar-nos a ultrapassar as Suas falsas representações, para nos aproximarmos cada vez mais da imagem do Deus de Jesus Cristo.

1. Antes de mais, não existe o Deus dos fanáticos, hoje em voga. Deus não é «propriedade» de ninguém. Não está só do «meu lado». Está em toda a parte.

 

2. Também não existe o Deus masculino das nossas representações. Nem feminino. Nem neutro. Não é pai, nem mãe, nem uma espécie de chefe de família. É tudo isso, mas de forma diferente. Reúne o que de melhor tem o homem e a mulher. «Deus é síntese, auge, plenitude: o Outro».

 

3. É igualmente falsa a imagem de um Deus aristocrata, sempre ao lado dos poderosos e influentes. «O Deus dos privilegiados não existe… Se o leitor(a) desfrutar de algum privilégio, não procure aí Deus…, cuja essência é ser e não ter» (José Luís Cortés, Um Deus Chamado Abba, Estrela Polar, 2003, p. 28).

 

4. O Deus de Jesus Cristo não é propriamente o Deus dos filósofos e dos teólogos. Só com a inteligência, não se chega ao Deus vivo e verdadeiro. Geralmente, o Deus dos filósofos é frio e distante. Mais um derivado lógico, do que um ser vivo e pessoal. «A História ensina-nos que o verdadeiro Deus também escapa (em parte) aos teólogos, como não podia deixar de ser, pois ninguém se torna milionário por vender a lotaria… Ninguém tem o exclusivo da questão de Deus» (Ibid, p. 38).

 

5. Também não existe o Deus que os ateus negam. Só o que está para além da imagem do que chamamos «Deus» é que é Deus. «Que imagem de Deus rejeitas, irmão ateu? Esforça-te por defini-Lo e veremos se esse é o meu Deus … É claro que, se Deus existe – como creio que exista – não pode ser o Deus, que os ateus negam… Mas pode ser – isso sim – (…) um convite a não pararmos, a continuarmos a nos interrogar sobre tão grande Mistério…, a não ficarmos tão tranquilos, declarando que Deus não existe» (Ibid, p. 46).

 

6. Mais próxima de nós crentes, estará, porventura, a atitude dos agnósticos. Não se pronunciam sobre algo que transcende a realidade humana. Não dizem nem que sim, nem que não. Abstêm-se. Só que essa atitude só poderá ser transitória. Não saberemos dizer grande coisa de Deus. Temos de continuar à procura. Por que Ele existe. Isso é fé. Como também a crença do agnosticismo e do ateísmo.

 

7. E o Deus das religiões existe? Diz-nos S. João: Ninguém jamais viu Deus. O Filho Único é que O deu a conhecer (Jo 1, 18). Esta é a originalidade do Cristianismo: a revelação divina. A Encarnação é um movimento descendente: Deus vem ao nosso encontro. As religiões são um movimento ascendente: do humano ao divino. Mas não deve haver, necessariamente, contradição, entre a máxima revelação do Alto e o máximo esforço humano. Os dois movimentos, ao fim e ao cabo, entrecruzam-se. As religiões podem tornar-se caminhos, que levam a Jesus, plenitude da revelação divina.

 

Quanto mais perto da vida dos homens, tanto mais a religião terá a ver com Deus.

+ António, Bispo de Angra

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