Jovem maestro do Coro da Sé, Gualter Silva, deixa testemunho sobre a participação no coro da JMJ
Será sempre complicado demonstrar o sentimento vivido nesta Jornada Mundial da Juventude 2023, pois só quem lá esteve é que conseguiu sentir a força e a fé que lá se viveu, tentarei nestas breves palavras, relatar a minha experiência. A minha história com a Jornada Mundial da Juventude, começa muito tempo antes de se saber que esta viria para Portugal. Tendo sido desde muito cedo, sempre ligado às causas católicas na minha paróquia de Santa Cruz da Praia da Vitória, o meu ingresso no grupo de jovens local foi algo natural. Sempre estive ciente que deveria contribuir para a minha religião com a minha vocação, a música. Assim sendo, comecei a animar as missas locais. Na escolha do repertório a utilizar, sempre com um caráter mais juvenil, deparo-me com as primeiras canções compostas para as jornadas, e interesso-me logo por este movimento de pessoas e começo, então, a ver e tentar perceber o que era este aglomerado de pessoas que aparentavam estar em sintonia na sua fé. E aí descubro toda a história e a carga espiritual que a jornada tinha para todos os jovens, começando a ganhar a esperança de um dia poder participar.
Os anos foram passando e nunca houve possibilidade de conseguir participar neste evento tão importante para a Igreja, digo até que é o ponto mais alto da vida cristã de um jovem, onde realmente somos elevados espiritualmente, mas também como seres humanos e até como profissionais.
Em 2019 é desvendado que as jornadas viriam para Portugal e, sendo eu estudante em Lisboa, fiquei logo empolgado para poder ajudar no que fosse necessário. Queria mais uma vez, poder dar a minha vocação à minha religião, e ajudar o meu país a acolher todos estes peregrinos que com fé se deslocaram dos seus países, para em conjunto vivermos este grande momento de paz, alegria e confraternização.
Foi passando algum tempo, e de facto não tinha contribuído em nada para esta jornada como o queria fazer.
O senhor padre e amigo cónego Hélder Fonseca Mendes ofereceu-me um terço das jornadas e esse gesto despoletou novamente o interesse de querer contribuir e dar algo. Por ironia do destino, ou um sinal de Deus, uma colega informa-me que estavam abertas as provas para o coro das jornadas. Entrei, ensaiei e experienciei este sentimento maravilhoso que é o sentimento da jornada.
Mas, nem tudo foi tão linear e ambicioso; tive dúvidas, incertezas e receios com esta experiência. Primeiro que tudo senti medo pela opinião pública que todo o evento estava a ter. De seguida, pelas sucessivas acumulações que tive no meu trabalho que me impedia de estar de corpo e alma com todos os meus colegas.
Organizei-me, e consegui estar nas Jornadas Mundiais da Juventude 2023, de corpo e alma. Mas somente na missa de abertura, é que realmente senti o peso e a carga emocional que acarreta uma jornada. 300 mil pessoas em celebração…
O que mais me comoveu foi ver países que são institucionalmente divergentes, mas que ali estavam juntos, a viver em alegria e a celebrar.
Sublinho que todas as celebrações tiveram um silêncio sepulcral, que só a fé autoriza. Mesmo assim, estando já a ser contagiado pela fé que emanava de todas aquelas pessoas, faltava-me algo, faltava sentir o que é ser peregrino. Nós músicos, pelo contato tão próximo que tínhamos com o Santo Padre, não podíamos estar à nossa vontade como os peregrinos, tínhamos algumas limitações.
Entretanto surge o nosso pastor, Dom Armando Esteves Domingues e junto com ele, conseguimos furar a bolha que nos protegia e fomos caminhar junto dos peregrinos. O nosso bispo quis contactar com os peregrinos Açoreanos e eu quis experienciar esse lado da peregrinação.
Não me lembro de ter tido algo tão regenerador e sentir a fé que aquelas pessoas emanavam fez de mim, sem dúvida, uma pessoa melhor.
Profissionalmente foi algo extremamente aliciante, com arranjos com uma harmonia extremamente complexa, melodias de uma beleza ímpar, e orquestrações que procuraram cores e sonoridades que toda gente conseguiu sentir.
A competentíssima maestrina que nos conduziu fez com que os momentos vividos no coro e orquestra fossem de contribuição, mas onde também era retribuído com um enorme conhecimento dos melhores músicos que temos atualmente em Portugal. O Papa Francisco diz: “Um artista é um apóstolo da beleza, que ajuda os outros a viver” (2023) e foi esse o meu espírito de missão nesta jornada: ajudar os outros a viver a sua fé, tocando nos seus sentimentos mais profundos para que pudessem brotar e melhor viverem em igreja.
Por isso, afirmo que este evento foi algo nunca visto em Portugal- um milhão e meio de jovens, ordeiramente organizaram-se- e fizeram de Lisboa um centro de paz e amizade. Mostrando assim, que há esperança na juventude, ao contrário do que muitos auguram. Aos meus jovens amigos, conhecidos e população em geral, aconselho a não ligarem a opiniões públicas, nem julgamentos de valor seja pelo que for, e que sejamos construtores, atentos e com questões, como nos aconselha o Papa Francisco, mas não tenhamos medo de fazer e construir, só assim poderemos conhecer um mundo com mais fé, um mundo com mais amor, um mundo que anseia pela paz. Obrigado.
*O testemunho foi partilhado na missa da Sé, do passado dia 13 de agosto