“Não era acomodado, não me metia em política partidária mas queria coisas concretas e por isso vivi alguns problemas” refere padre Francisco Dolores

 

Foto: Site História e memória

Sacerdote mariense foi ordenado a 19 de abril de 1974 e representou a diocese na primeira reunião da conferência Episcopal pós 25 de abril

O Padre Francisco Dolores, natural de Santa Maria, cónego emérito da Sé de Angra, foi o último sacerdote açoriano a ser ordenado pelo Bispo Manuel Afonso de Carvalho a 19 de abril de 1974 e a revolução apanhou-o em trânsito entre a ilha natal, onde foi ordenado e celebrou a sua Missa Nova, e o regresso à Terceira para a primeira colocação.

“Estávamos impedidos de viajar e o meu regresso foi marcado para o dia 25, sem sabermos o que estava a acontecer. Quando cheguei ao aeroporto para embarcar disseram-me que era impossível chegar às Lajes porque se tratava de um aeroporto militar e tinha havido uma intentona militar em Lisboa”, recorda em entrevista ao programa de Rádio Igreja Açores.

“Foi um período de muitas incógnitas sem termos a informação toda sobre o que se estava efetivamente a passar e apesar de algumas ilhas serem mais abertas que outras, sobretudo as mais pequenas que não gostavam de ser mandadas pelas maiores, a verdade é que não sabíamos para que lado  a revolução ia pender” reconhece o padre Francisco Dolores.

“Sempre tive um grande sentido de liberdade, de vigilância e de acutilância e embora não me metesse com partidos políticos, pois queria era resolver coisas das pessoas, enfrentei alguns problemas”. Um deles foi na base das Lajes. A sua primeira colocação foi na Vila das lajes, paredes meias com a base.

“Estávamos fartos das formalidades do aeroporto militar e havendo instalações vazias porque não construirmos uma aerogare civil? Então eu e o Francisco Bettencourt, que foi um dos primeiros deputados regionais, e que conhecia a base porque trabalhava com os americanos, ocupámos o hangar da navy e fomos presos e levámos uma valente reprimenda, mas a verdade é que conseguiu-se a criação de uma aerogare civil” recorda com entusiasmo. O mesmo que o levou a Lisboa para representar a diocese na reunião anual da Conferência Episcopal Portuguesa.

“Era o único padre entre bispos e tinha sido enviado pelo D. Aurélio, bispo coadjutor de Angra que não quis deslocar-se ao continente com medo de represálias. Era um entusiasta da acção católica, muito conotada com o anterior regime e, vendo o que que estava a acontecer nalguns lugares como Braga onde o arcebispo foi detido pelas forças revolucionárias, não quis arriscar e enviou-me a mim. Foi muito bom. Estive em lisboa, em Fátima, em Coimbra e no Porto e pude constatar como decorriam as movimentações e trouxe-lhe esse feedback”, adianta ainda.

“Houve muitos excessos; muita gente que se radicalizou nessa altura. Nos Açores foi tudo mais calmo, dependendo de ilha para ilha. São Miguel ofereceu mais resistência à mudança; a Terceira era mais aberta, por via da convivência com os norte-americanos. Mas sempre houve alguma tensão, adiantou.

“Sempre agi com muita liberdade e sem ter modelos fixos de sacerdote. Criei o meu estilo com base na liberdade: de pensar, de afirmar e de discordar” adianta ainda lembrando o tempo em que era seminarista e obteve pela primeira vez a chave do Seminário, dada pelo reitor.

“Saia para as paróquias e para as comunidades. Fundei o grupo de jovens da Ribeirinha e o dos Escuteiros da Sé. Foram momentos de grande atividade”.

O Padre Francisco Dolores completa este ano 50 de sacerdócio e serviu sempre na ilha Terceira, em várias comunidades. Atualmente ajuda na santa Casa da Misericórdia de Angra, depois de se ter aposentado. Até à hora da saída, foi Reitor do Santuário Diocesano de Nossa Senhora da Conceição, em Angra.

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