Sacerdote açoriano foi nomeado cónego de Santa Maria Maior, a basílica onde o corpo de Francisco será sepultado por vontade própria

A devolução da dignidade aos mais pobres e frágeis, o diálogo do homem com a criação, uma atenção concreta e precisa à família e o diálogo inter-religioso como instrumento de paz são quatro aspetos destacados por Monsenhor António Saldanha, secretário do Dicastério das Causas dos Santos, sobre o legado do papa Francisco, que hoje faleceu em Roma, aos 88 anos de idade.
O sacerdote açoriano que foi nomeado cónego do Cabido da Basílica de Santa Maria Maior, o lugar escolhido pelo Papa para ser sepultado, recebeu esta notícia com consternação mas realça a coincidência, “que em Deus nunca é por acaso”, entre a primeira aparição de Francisco, quando foi eleito e a última vez que apareceu em público.
“Nós vemos partir um homem que, curiosamente, se despede, como chegou naquele dia em que se inaugurou o seu pontificado pedindo à multidão reunida na Praça de São Pedro que o abençoasse e parte abençoando, na importante bênção Urbi et Orbi, toda a humanidade, todas as pessoas”, refere, sublinhando a atenção “aos pobres, à sua dignidade”.
“O discurso da Igreja, ao longo da história, tem acompanhado sempre uma certa sensibilidade para com a pobreza, mas este Papa teve um carisma e um modo de falar sobre esta situação de uma forma que criou um impacto que não vimos no passado, pelo menos recente”, destaca.
Um outro aspecto importante foi o da ecologia, sublinha, destacando o “diálogo do homem com a criação, com a natureza. Ele procurou, com o seu discurso, alertar para uma espécie de intoxicação geral da natureza, promovida por certos interesses ligados a finanças, ou interesses políticos, que ditaram nos últimos anos uma grave poluição geral neste planeta, que é casa comum de todos nós”.
Para Monsenhor António Saldanha há, ainda, outro aspecto a ter em conta e que diz respeito à família, a célula da sociedade.
“Ele teve, não só o cuidado de simplificar os processos de anulação do matrimónio, e isso é muito importante, eu acompanhei vários processos que eram muito dolorosos, mas também de nos convidar a toda a igreja, a olhar para as pessoas nessas circunstâncias como cristãos, com igual dignidade, com igual potencial de colaboração na vida ativa da igreja”, afirmou ressalvando, por outro lado, o aspecto do diálogo inter-religioso.
“Deu grandes passos de aproximação com o mundo hebraico, com o mundo ortodoxo, e com o mundo, também ele, muito válido e importante das diversas confissões evangélicas”.
O sacerdote admite que os próximos dias serão muito emotivos, sobretudo na Basílica Romana onde se encontra o ícone de Nossa Senhora, Salus Populi Romani, com os preparativos do funeral.
Questionado sobre os alertas para dentro da igreja nomeadamente uma certa constestação ao designado mundanismo, Monsenhor António Saldanha ressalva que este Papa era particularmente sensível aos problemas da Igreja enquanto instituição.
“Ele coloca a Igreja no mundo, mas critica o contágio dos aspectos menos saudáveis, digamos assim, que o mundo sem Deus revela. E este mundo sem Deus pode encontrar-se numa sacristia, como pode encontrar-se numa rua, numa estrada qualquer. E ele, no fundo, quis alertar-nos para nos dizer que não há barreiras entre o bem e entre o mal e temos de estar e ser vigilantes”.
Também o reitor do Santuário do Senhor Santo Cristo já reagiu à morte do Papa Francisco. Na missa matinal no Santuário pediu “oração ao Senhor pela sua alma” deu graças pelo “enorme dom que foi a vida e o pontificado do papa Francisco”.
“Trouxe a Igreja para os nossos dias”, afirmou o cónego Manuel Carlos Alves; “continuemos a rezar para que o Espírito Santo continue a interceder pela Igreja”.
A diocese está em “comunhão com toda a Igreja Universal neste momento de luto, agradecendo a Deus o dom da sua vida e do seu pontificado, marcado pela misericórdia, pelo diálogo e pelo testemunho humilde do Evangelho” pode ler-se no comunicado emitido ao final da manhã.
“Convidamos todos os fiéis dos Açores a oferecerem orações pela sua alma, pedindo ao Senhor da vida que o acolha no Seu Reino de paz e luz” lê-se ainda. Esta segunda-feira, às 19h00, o bispo de Angra presidirá na Sé a uma missa de sufrágio; amanhã, terça-feira, pelas 18h00 terá lugar uma segunda celebração na Igreja Paroquial de São José, também presidida pelo bispo de Angra.