Mensagem de Natal do Bispo de Angra, D. António de Sousa Braga

A FESTA DO ENCONTRO.

Natal é a festa do encontro: no seio da família e entre os amigos; nas instituições, entre responsáveis e utentes. Na época natalícia, há campanhas que levam ao encontro dos que estão sozinhos, ou são abandonados, dos carenciados ou excluídos…

Critica-se e, às vezes com razão, que no Natal há demasiado consumismo. Por isso mesmo é pertinente, tanto mais neste momento de crise, a advertência de S. Paulo: procurai «viver, neste mundo, com sobriedade, justiça e piedade» (Tito, 2, 12).

1. Efectivamente, o Filho de Deus veio ao mundo, para fazer da humanidade uma família de irmãos, que cuidem uns dos outros. Isso implica solidariedade e partilha.

Antes de mais partilha de bens. Mas não esqueçamos: sem sobriedade não há partilha de bens. Como adverte o Papa Francisco, «as sucessivas crises económicas devem levar a repensar adequadamente os modelos de desenvolvimento económico e a mudar estilos de vida… É o desapego vivido por quem escolhe estilos de vida sóbrios e essenciais, por quem, partilhando as suas riquezas, consegue assim experimentar a comunhão fraterna com os outros…

«A crise actual, com pesadas consequências para as vidas da pessoas, pode ser também uma ocasião propícia, para recuperar as virtudes da prudência, temperança, justiça e fortaleza (…), necessárias, sobretudo, para construir e manter uma sociedade à medida da dignidade humana… É mais do que sabido – continua o Papa – que a produção actual é suficiente e, todavia, há milhões de pessoas, que sofrem e morrem de fome, o que constitui um verdadeiro escândalo», a que não podemos ficar indiferentes (Mensagem para o Dia Mundial da Paz 2014).

«Nem o Papa, nem a Igreja possuem o monopólio da interpretação da realidade social ou da apresentação de soluções para os problemas contemporâneos – adverte o Santo Padre. Posso repetir aqui o que indicava, com grande lucidez, Paulo VI: “perante situações, assim tão diversificadas, torna-se-nos difícil, tanto o pronunciar uma palavra única, como o propor uma solução que tenha valor universal. Mas isso não é ambição nossa, nem mesmo a nossa missão. É às comunidades cristãs que cabe analisar, com objectividade, a situação própria do seu país» (Evangelii Gaudium=EV, 2013, nº 184).

2. De Belém, põe-se em marcha uma nova sociedade, baseada na justiça, sem a qual não há verdadeiro amor ao próximo. Não se pode calar a consciência, dando as migalhas que caem das nossas meses. Urge actuar nas causas estruturais da pobreza. Como ensina o Vaticano II, compete aos fiéis leigos inserir-se e envolver-se nas realidades terrestres, qual fermento que leveda a massa, para que surjam «novos céus e uma nova terra, onde habite a justiça» (2 Ped., 3, 13).

Por isso, além de partilhar os bens, é preciso ser capaz de partilhar também o tempo, as próprias capacidades e competências, ao serviço do bem comum, da promoção da equidade e da justiça social. O Papa Francisco é peremptório, ao afirmar: «Enquanto não forem radicalmente solucionados os problemas dos pobres, renunciando à autonomia absoluta dos mercados e da especulação financeira e atacando as causas estruturais da desigualdade social, não se resolverão os problemas do mundo e, em definitivo, problema algum. A desigualdade é a raiz dos males sociais (…).

 

3. «É indispensável que os governantes e o poder financeiro levantem o olhar e alarguem as suas perspectivas, procurando que haja trabalho digno, instrução e cuidados de saúde para todos os cidadãos. E porque não recorrerem a Deus, pedindo-Lhe que inspire os seus planos? Estou convencido – afirma o Papa – que, a partir de uma abertura à transcendência, poder-se-ia formar uma nova mentalidade política e económica, que ajudaria a superar a dicotomia absoluta entre a economia e o bem comum social» (EG, 202 e 205).

Um tal desafio, lançado pelo Papa Francisco, está na linha da recomendação de S. Paulo, mencionada anteriormente: viver, não só com sobriedade e justiça, mas também com piedade, isto é, com fé no Messias-Salvador que veio estabelecer na terra o Reino de Deus, «Reino de Justiça, de Amor e de Paz».

É a esperança que vivemos e celebramos no Mistério do Natal de Jesus. O que pressupõe que não pode haver Natal, nem espírito de Natal, como Festa do Encontro, sem o encontro pessoal com a Pessoa de Jesus, lá onde Ele continua a salvar e a libertar: na Palavra e nos Sacramentos, na comunidade e no rosto de cada irmão.

Sobriedade, justiça e piedade são «presentes» que só o Deus-Menino nos pode dar. Aliás, Ele é a grande «prenda de Natal», que nos torna, cada vez mais humanos, justos e fraternos, para construirmos, nestes altos e baixos da história, a «Civilização do Amor».

São os meus votos de Bom Natal para todos: os de perto e os de longe, particularmente para aqueles/as que mais sentem o peso das dificuldades da vida. Coragem e esperança!

É Natal!

Angra, 19 de Dezembro de 2013.

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