Participaram Isabel Capeloa Gil, Reitora da Universidade Católica Portuguesa, o padre Norberto Brum, Diretor diocesano da Pastoral Juvenil; Bento Aguiar, coordenador dos Professores de Educação Moral e Religiosa Católica e André Patrão Neves, investigador em Yale, nos EUA
Diante de uma clara alteração dos valores de referência das comunidades contemporâneas, a progressiva secularização da sociedade em que “já não se é cristão por geração espontânea e imitação familiar”, a Igreja para cativar os jovens deve utilizar “novas linguagens, novas formas de envolvimento” e, sobretudo uma nova abordagem menos catequética e mais testemunhal.
Esta é a principal conclusão tirada do programa da Série Igreja e Sociedade, sobre a Relação dos jovens com a Fé- Jovens hoje, que futuro- promovido esta quinta-feira pela RTP Açores, numa parceria com o Instituto Católico de Cultura, o Santuário do Senhor Santo Cristo e o Serviço Diocesano da Pastoral da Cultura.
“A estratégia não é colocar o ensino da tradição à frente, mas as questões a que os jovens são sensíveis” disse a Reitora da Universidade Católica Portuguesa, Isabel Capeloa Gil no referido programa, explicitando que questões como “a fraternidade social, o acolhimento dos migrantes, o acolhimento dos outros” são temas “caros aos jovens” com um enorme “potencial”.
“Fazê-los aproximarem-se da mensagem cristã a partir destes temas e não o contrário é o caminho” reitera Isabel Capeloa Gil.
“Os grandes valores daquilo que partilhamos como seja o direito à igualdade, à dignidade, em que a ciência esteja ao serviço da defesa do planeta, são valores profundamente cristãos” acrescenta ainda esclarecendo que “ há uma clara alteração dos valores de referência das nossas sociedade e o que nós precisamos é de lhes mostrar que aquilo que são as grandes agendas a que eles estão particularmente sensíveis, como sejam as questões climáticas por exemplo, não estão avessas àqueles que são os princípios do Cristianismo, da doutrina social da Igreja”, disse
“Já não estamos numa Igreja de massas, nem uma Igreja de geração espontânea, em que se pertencia por tradição. Quem hoje está na Igreja e diz-se Católico, está por escolha, compromisso, fidelidade, e projecto” refere por seu lado o padre Norberto Brum, Diretor diocesano da pastoral juvenil., a propósito da falta de compromisso dos mais novos para com a vida da Igreja.
“Há muita religiosidade que pode ser de um enorme potencial evangelizador; os jovens não estão afastados de Jesus; estão é afastados dos ritos”, assegura.
“Tudo o que é institucional, balizado, orientado liturgicamente com rito, o que é uma repetição, e depois o compromisso, cada vez cativa menos” disse ainda.
“Há uma falta de sentido de pertença e da comunidade que a pandemia veio agravar e estamos a ter dificuldade em `cativar´”, referiu ainda o sacerdote que, como os restantes membros de painel lembrou que a “linguagem” era uma das principais `armas´ para lidar com os jovens.
“Precisamos ser uma Igreja em saída; a partir das comunidades pequenas, dos párocos e dos movimentos, todos temos de falar uma linguagem acessível, simples envolvente que cative; que não tenha a preocupação de encher a Igreja de Jovens mas a de encher os jovens de Igreja, isto é, levar Jesus e a alegria do seu evangelho a todos”, refere o sacerdote.
“Não se trata de uma conversão generalizada mas de dizer a felicidade dos que estão dentro, adaptando a linguagem, os conteúdos e a simplicidade”, diz o padre Norberto Brum..
“Claro que isto só se consegue se a Igreja elencar prioridades” refere o padre Norberto Brum esclarecendo que a Igreja precisa de ser um espaço de acolhimento, aberta à escuta, que não julgue e não seja preconceituosa. Isto é: “uma igreja que dê espaço aos jovens para que eles se revelem, sem medos”, onde “a lei não seja mais forte que o amor”.
O sacerdote, que é o responsável da pastoral juvenil diocesana lembra que a Igreja tem de dar espaço aos jovens para que eles possam assumir o compromisso. Mas diante da falta de disponibilidade para esse passo, o que fazer?
“O problema vai para além da fé”, refere André Patrão Neves, jovem açoriano, investigador em Yale.
“O compromisso é uma dificuldade de um Ethos contemporâneo, em que valorizamos a mudança, mas é uma dimensão em que a Igreja tem muito para ensinar”, disse.
“A Igreja tem a capacidade de resistir a um dos pontos fracos deste Ethos contemporâneo, com este reforço do compromisso da decisão informada” ou seja “problematizar, discutir, analisar e clarificar questões “, o que ajuda a promover “uma fé mais esclarecida”.
“Já não somos cristãos por herança mas porque acreditamos e testemunhamos” disse ainda o jovem investigador.
“Hoje até é mais difícil ser-se católico e afirmar-se do que era antes quando se fazia por tradição ou herança cultural. Há estigmas, há mitos associados… Hoje até é um gesto de coragem” disse ainda.
Bento Aguiar, coordenador dos professores de Educação Moral e Religiosa Católica, lembra que a disciplina “é uma forma de orientar na fé”.
“Havia um tempo, que já não é atual, em que por influência dos pais fazia-se todo um percurso de vida sacramental”, refere lembrando que hoje “já não é assim”.
“A escola desempenha um papel fundamental de proporcionar às crianças e jovens o único momento de encontro com o que é espiritual ou Deus” afirmou.
“A crise de fé dos jovens não é só da sua exclusiva responsabilidade; são herdeiros de um certo secularismo, ou de uma permissividade que se deixou os jovens à deriva” disse ainda Bento Aguiar.
“Abandonar as receitas fáceis das redes sociais ou dos influencers é preciso” disse, alertando para o perigo inverso da Igreja se enclausurar nos seus dogmas e deixar de privilegiar o diálogo”, com uma linguagem mais próxima dos problemas concretos e reais dos jovens como sejam o trabalho, a formação, as dependências, entre outros assuntos.
O programa da RTP Açores pode ser visto na RTP Play ou aqui, no sítio Igreja Açores.
Na próxima quinta-feira, dia 19, o tema desta série de programas Igreja e Sociedade abordar a questão Quem são os pobres hoje, com Eugénio da Fonseca, professor e presidente da Confederação das Associações do Voluntariado de Portugal; José Júlio Rocha assistente da Comissão Diocesana Justiça e Paz e Teólogo; Maria do Céu Patrão Neves, professora catedrática de Ética e membro da direcção do Instituto Católico de Cultura e Fernando Diogo, investigador e especialista nas questões da pobreza nos Açores e em Portugal. O debate Igreja e Sociedade vai para o ar por volta das 21h15.