O Papa homenageou hoje em Bagdade as vítimas do atentado terrorista que matou 48 pessoas, na Catedral siro-católica de Sayidat al-Nejat (Nossa Senhora da Salvação), a 31 de outubro de 2010.
“A sua morte lembra-nos fortemente que o incitamento à guerra, os comportamentos de ódio, a violência e o derramamento de sangue são incompatíveis com os ensinamentos religiosos”, declarou Francisco, na mesma igreja, perante cerca de uma centena de bispos, sacerdotes, religiosas, seminaristas e catequistas.
As vítimas do ataque da Al-Qaeda têm aberta a causa de beatificação.
“Que a recordação do seu sacrifício nos inspire a renovar a nossa confiança na força da Cruz e da sua mensagem salvífica de perdão, reconciliação e renascimento”, referiu o pontífice.
O Papa sublinhou que as dificuldades fazem parte da “experiência diária” dos cristãos iraquianos, cujas comunidades perderam mais de 80% dos seus membros, nas últimas duas décadas, por causa da emigração, da guerra e do terrorismo.
“Nas últimas décadas, vós e os vossos concidadãos tivestes de enfrentar os efeitos da guerra e das perseguições, a fragilidade das infraestruturas básicas e uma luta contínua pela segurança económica e pessoal, que muitas vezes levou a deslocamentos internos e à migração de muitos, inclusive cristãos, para outras partes do mundo”, assinalou.
Francisco foi recebido pelo patriarca de Antioquia dos sírios, Inácio III Younan, e outros responsáveis católicos, tendo cumprimentado um grupo de pessoas com deficiência que o esperava junto à igreja – com lotação limitada devido à pandemia de Covid-19.
A Catedral de Nossa Senhora da Salvação, uma das maiores da capital iraquiana, tem hoje um memorial dedicado às vítimas.
O Papa recordou todos os que morreram por causa da violência e da perseguição, “pertencentes a qualquer comunidade religiosa”.
“Amanhã, em Ur, vou encontrar-me com os líderes das tradições religiosas presentes neste país, para proclamarmos mais uma vez a nossa convicção de que a religião deve servir a causa da paz e da unidade entre todos os filhos de Deus”, apontou.
Num território marcado pela diversidade de ritos católicos e comunidades cristãs, “com o seu secular património histórico, litúrgico e espiritual”, a intervenção destacou a necessidade de uma “união fraterna”.
“Que o vosso testemunho, amadurecido nas adversidades e fortalecido pelo sangue dos mártires, seja uma luz que resplandece dentro e fora do Iraque, para anunciar a grandeza do Senhor e fazer exultar o espírito deste povo em Deus nosso”, desejou Francisco.
A assembleia dos bispos católicos do Iraque reúne responsáveis da Igreja de rito caldeu, siro-católico, arménio-católico, melquita e latino, sendo presidida pelo cardeal Louis Sako, patriarca de Babilónia dos Caldeus
Este responsável recordou o ataque “criminoso” de 2010 e sublinhou que, quatro anos depois, o Estado Islâmico obrigou à fuga de todos os 120 mil cristãos da planície de Nínive e Mossul.
“Agradecemos a Deus, porque essas áreas foram libertadas em 2017 e quase 50% dos seus habitantes regressaram”, realçou o cardeal Sako.
Já o patriarca Inácio III apelou ao Papa para “acelerar” o processo de beatificação dos “48 mártires massacrados durante a celebração da Divina Liturgia dominical”, nesta catedral.
A viagem de Francisco ao Iraque, que começou esta tarde e decorre até segunda-feira, tem como lema ‘Sois todos irmãos’, passagem do Evangelho de São Mateus.
À chegada, Francisco condenou o fundamentalismo religioso, evocando vítimas da guerra e do terrorismo no Iraque, falando em Bagdade, no primeiro discurso da sua viagem ao país do Médio Oriente, que se iniciou esta tarde.
“Chega de violências, extremismos, fações, intolerâncias! Dê-se espaço a todos os cidadãos que querem construir juntos este país, no diálogo, no confronto franco e sincero, construtivo”, declarou, no Palácio Presidencial, perante cerca de 150 pessoas, reunidas no grande salão do palácio: autoridades políticas e religiosas, membros do corpo diplomático, empresários, representantes da sociedade civil e do mundo da cultura.
Francisco citou a declaração sobre a fraternidade humana, que assinou em 2019 com Ahmad Al-Tayyeb, grande-imã de Al-Azhar, sublinhando que “o nome de Deus não pode ser usado para justificar atos de homicídio, de exílio, de terrorismo e de opressão”.
“Deus, que criou os seres humanos iguais em dignidade e direitos, chama-nos a difundir amor, benevolência, concórdia”, prosseguiu.
O discurso evocou todos os que perderam familiares e entes queridos, casa e outros bens “por causa da violência, da perseguição e do terrorismo”, bem como quem procura segurança e os meios necessários para sobreviver.
“Venho como penitente que pede perdão ao Céu e aos irmãos por tanta destruição e crueldade. Venho como peregrino de paz, em nome de Cristo, Príncipe da Paz”, assinalou.
O primeiro Papa a visitar o Iraque sublinhou que este país tem sido vítima da violência, apontando o dedo a um “fundamentalismo incapaz de aceitar a convivência pacífica de vários grupos étnicos e religiosos, de ideias e culturas diferentes”.
O discurso deixou uma palavra particular à minoria yazidi, “vítima inocente duma barbárie sem sentido e desumana”, que colocou em risco a sua própria sobrevivência.
Francisco defendeu que todas as comunidades religiosas tenham igual “reconhecimento, respeito, direitos e proteção”, para quem ninguém seja “cidadão de segunda classe”.
“Nestes anos, o Iraque procurou lançar as bases para uma sociedade democrática. Neste sentido, é indispensável assegurar a participação de todos os grupos políticos, sociais e religiosos e garantir os direitos fundamentais de todos os cidadãos.”, observou.
Hoje o Iraque é chamado a mostrar a todos, especialmente no Médio Oriente, que as diferenças, em vez de gerar conflitos, devem cooperar harmoniosamente na vida civil”.
O Papa falava depois de uma audiência privada com o presidente do Iraque, Barham Ahmed Salih Qassim.
Francisco admitiu que esta é uma viagem “longamente esperada e desejada” ao berço duma civilização “estreitamente ligada, através do Patriarca Abraão e de numerosos profetas, à história da salvação e às grandes tradições religiosas do Judaísmo, Cristianismo e Islão”.
O discurso deixou saudações aos católicos, às outras comunidades cristãs, aos muçulmanos e representantes de outras tradições religiosas.
“Que Deus nos faça caminhar juntos, como irmãos e irmãs”, desejou o pontífice.
A intervenção aludiu à crise provocada pela Covid-19 e pediu “esforços conjuntos” para a superar, “incluindo uma justa distribuição das vacinas para todos”.
O Papa destacou o papel da comunidade internacional para assegurar a paz no Iraque e no Médio Oriente, elogiando quem presta assistência aos refugiados e deslocados internos, com uma palavra de estímulo às organizações católicas “que há anos assistem com grande empenho as populações civis”.
O presidente Barham Ahmed Salih Qassim saudou, na sua intervenção, o “esforço” do Papa em favor do diálogo e da convivência pacífica, recordando as audiências no Vaticano, com Francisco, e a atenção que este dedica ao Iraque.
“O Oriente não pode ser imaginado sem os cristãos”, sustentou.
A agenda do Papa nesta sexta-feira conclui-se na Catedral siro-católica de Sayidat al-Nejat (Nossa Senhora da Salvação), também em Bagdade, uma das maiores igrejas da cidade.
(Com Ecclesia)