D. Manuel Clemente fala em trabalho “providencial”. Políticos destacam simplicidade, frontalidade e inteligência do chefe da Igreja católica
O cardeal-patriarca de Lisboa elogiou o espírito de diálogo que tem marcado os primeiros anos do pontificado de Francisco, eleito a 13 de março de 2013, e o estilo de liderança do Papa argentino.
“Isso é muito próprio desta ‘governance’ do Papa Francisco, que tem como objetivo levar e ir com a Igreja no sentido da proposta evangélica, da exigência que isso implica para quem tem responsabilidades, mas não o que fazer sozinho”, referiu D. Manuel Clemente, num balanço destes dois anos.
Segundo o presidente da Conferência Episcopal Portuguesa, criado cardeal a 14 de fevereiro, o Papa tem promovido vários momentos de reflexão, como os sínodos dos bispos ou os consistórios, em que procura “ouvir” e, assim, comprometer também quem fala.
Francisco criou um Conselho de Cardeais, com membros dos cinco continentes, para o aconselharem no Governo da Igreja e na reforma da ‘Constituição’ do Vaticano, e aprovou legislação para regular a atividade financeira do pequeno Estado e da Santa Sé, com uma nova Secretaria para a Economia.
“Isso é muito típico, é o que está a ressaltar destes dois anos de trabalho providencial do Papa Francisco. Ele quase que faz um concílio permanente”, sublinha.
O bispo do Porto, que no ano passado presidiu às Festas do Senhor Santo Cristo dos Milagres, em Ponta Delgada, na ilha de São Miguel, afirmou, também, que os primeiros anos de pontificado de Francisco foram uma “bênção na Igreja e no mundo, promovendo a sua renovação através da simplicidade e serenidade”. O prelado destaca o “dom” que o Papa argentino é para a Igreja mas também de “bênção para o mundo”.
“Creio que estes dois anos estabelecem este diálogo aberto e vínculo com a sociedade civil. Hoje somos todos a gostar, a seguir, a amar o Papa e a dizer que estamos disponíveis para ao seu convite e orientação fazermos da alegria do Evangelho a nossa missão”, desenvolveu.
Neste contexto, D. António Francisco dos Santos, considera que o “cunho pessoal, especial e muito vincado” que o Papa está a deixar é uma caraterística pessoal que também “deixou” em Buenos Aires e na Companhia de Jesus (Jesuítas).
O grupo de leigos «Recasados na Igreja», nascido na Diocese de Aveiro, considera que o Papa Francisco “surpreendeu” todas as semanas desde o início do pontificado e espera que consiga “integrar os casais feridos”, sem abandonar a doutrina.
“A mensagem deste Papa é a da esperança, de que a Igreja consiga, no âmbito da pastoral familiar, abrir um pouco as portas e integrar esses casais feridos, sem abandonar a sua doutrina. E aqui a Igreja somos todos nós, sobretudo as igrejas locais e os seus responsáveis – bispos e sacerdotes”, refere por outro lado, em declarações à Ecclesia João Manuel Querido, do Grupo Recasados na Igreja.
No artigo de opinião sobre os dois anos de pontificado do Papa Francisco, que se completam esta sexta-feira, o grupo observa que para haver a mudança “não basta” que as ideias de Francisco sejam “escutadas e aplaudidas” por todos; é preciso pô-las em prática.
“Se não dermos a cara, qualquer reforma morrerá. Todos temos de ser o Papa Francisco!”, observa.
Neste contexto, João Manuel Querido destaca que uma ideia “fulcral” no discurso do Papa é “a misericórdia de Deus, que tudo perdoa” com preocupação para as pessoas “feridas” após uma “relação conjugal falhada”.
O grupo assinala que depois de Francisco se ter referido aos divorciados recasados no voo de regresso a Roma, da Jornada Mundial da Juventude em julho de 2013 no Brasil, “o caminho tem sido rápido”, nomeadamente com o Sínodo dos bispos sobre a família.
Segundo o grupo de leigos, os “gestos e opções” do Papa argentino merecem o respeito de todos – crentes e não crentes – e Francisco “recolocou” a voz da Igreja no centro do mundo, onde é ouvida apesar de por vezes “ser incómoda”.
Ouvidos também pela agência Ecclesia, os políticos e agentes sociais falam em “mudanças” na estratégia de comunicação da igreja.
Os primeiros dois anos do pontificado do Papa Francisco, que se completam esta sexta-feira, têm sido marcados por uma dinâmica de transformação da Igreja e da sociedade, a partir de uma mensagem de amor pelos mais necessitados.
“O Papa Francisco abriu por um lado uma janela de esperança para todo um mundo que estava eurocentrado, em que os problemas estavam muito centrados ainda na civilização puramente ocidental e europeia”, analisa o eurodeputado Paulo Rangel.
O político destaca a conceção de Francisco para a própria Igreja como um hospital de campanha junto das “pessoas que sofrem”, uma espécie de “atendimento de urgência”.
Paulo Rangel revela ainda que sempre viu na renúncia do Papa emérito Bento XVI uma “inspiração” que provocou este “movimento”, avaliando o atual pontificado em “função desse ato de sabedoria e generosidade”.
Já para o antigo presidente da República Portuguesa, o general Ramalho Eanes, Francisco tem sido o “Papa do amor”.
“Ele tem demonstrado ao longo do seu magistério que sabe que é essa a sua grande missão, ser para os homens o homem da compreensão, da bondade, da solidariedade, em suma do amor”, desenvolve.
Por sua vez, o presidente da União de Misericórdias, que esteve no Vaticano durante o mais recente consistório, em fevereiro, “a 20 metros do Papa”, destaca a forma “moderna e clara” como Francisco encara o “papel dos católicos no mundo”.
“Penso e tenho a certeza que também nas Misericórdias nos revemos muito no Papa Francisco”, acrescentou Manuel Lemos.
Para o padre Anselmo Borges, o Papa é também uma bênção não apenas para a Igreja Católica mas para as Igrejas Cristãs, para os crentes e para quem” não acredita em Deus” sendo hoje a “figura mais popular do mundo” porque é “um cristão”.
“Um católico ser cristão, um padre ser cristão, um bispo ser cristão já é uma coisa notável então quando aparece um Papa que é cristão que pratica o Evangelho é verdadeiramente extraordinário”, desenvolveu.
Segundo o teólogo, “Francisco pratica realmente o Evangelho” e as pessoas sentem que “ele gosta delas” na mesma linha de Jesus, que se fez próximo, e de São Francisco de Assis como “grande renovador” da Igreja.
À Agência Ecclesia, o sacerdote comenta como renovador fez “coisas verdadeiramente fundamentais” no mesmo sentido do Papa emérito Bento XVI, como “tolerância zero” para a pedofilia ou a “transparência no dinheiro” do Vaticano.
A renovação “profunda e duradoura” na Cúria Romana; o diálogo inter-cristão e inter-religioso, “sobretudo com o Islão”, uma Igreja “aberta aos mais pobres” mas também “mais aberta, acolhedora e hospitaleira” no domínio da família e da sexualidade, são outros fatores que o padre Anselmo Borges destaca de dois anos de pontificado do Papa argentino.
CR/Ecclesia