Jovens e menos jovens participam na festa do Senhor Santo Cristo da Caldeira, em São Jorge. Pregação deste ano está centrada no valor da oração, afirma pregador, padre Dinis Silveira
A festa do Senhor Santo Cristo da Caldeira mobiliza toda a ilha de S. Jorge, pelo que os fiéis acorrem em número elevado à Fajã do Santo Cristo, zona de reserva natural. A festa decorre entre 30 de agosto e 5 de setembro e volta a atrair muitas pessoas; às quais se deve dar uma atenção especial.
“É necessário prover às necessidades espirituais dos devotos, mesmo em tempo de pandemia. Aliás, é urgente ultrapassar a ideia de que a pandemia serve de justificação para que pouco ou nada se faça” afirma o padre Dinis Silveira, pregador, ao Igreja Açores.
“Naturalmente, observando as normas de saúde pública, a festa irá acontecer, realizando-se os atos que a caracterizam e que forem possíveis, com absoluta responsabilidade por parte de todos” garante o sacerdote, doutor em Direito canónico pela Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma e pároco do Topo e Santo Antão, na ilha de São Jorge,
Os dias festivos têm início na segunda-feira, dia 30 de agosto, com a pregação preparatória que se estende pela semana inteira, sendo que a quinta-feira, dia 2 de setembro, será dedicada a Nossa Senhora. Os últimos dois dias de preparação terão uma dimensão eucarística com exposição do Santíssimo Sacramento e a celebração do Sacramento da Confissão. No domingo, dia maior, será celebrada por duas vezes a Santa Missa na parte da Manhã, a que se seguirão as arrematações e, se for possível, uma pequena procissão.
Segundo informação obtida pelo Igreja Açores, junto do sacerdote “ao longo dos dias de preparação para a festa, o tema da oração será abordado sob duas perspectivas diversas: o lugar de Deus na oração e o lugar da pessoa na oração, a partir dos mestres da vida espiritual da escola do Carmelo, S. Teresa de Ávila, S. João da Cruz e S. Teresinha do Menino Jesus e os autores contemporâneos Camille C., Cardeal José Tolentino de Mendonça e Tomáš Halík”.
Esta é uma festa muito participada por jovens e faz convergir muitas pessoas de fora de São Jorge. Interpelado sobre o que pode a igreja dar a estes jovens para que a sua participação na festa possa dar frutos mais duradouros, o padre Dinis Silveira recorda que esse “é o maior desafio que a Igreja tem no que toca à Piedade Popular”.
“Entendo que as manifestações da Piedade Popular, nomeadamente este tipo de festividades, estão sub aproveitadas como momento de excelência de evangelização” refere embora reconheça que esta não é a sua área de investigação.
“A adesão e interesse que elas despertam têm de ser aproveitados para a formação daqueles que lá acorrem, pela pregação, pela oração, pela liturgia e beleza da mesma, pelo são convívio e sobretudo por uma presença pessoalíssima junto dos fiéis” esclarece ainda.
“ Penso não haver outro modo eficaz de tornar esta realidade verdadeiramente fecunda, pois a Piedade Popular está de tal modo enraizada na alma e na vida do Povo de Deus que seria temerário não fazer dela um meio de evangelização”, acrescenta .
No caso concreto, “há que despertar as consciências, de novos e velhos, para a centralidade da Pessoa de Nosso Senhor Jesus Cristo e para a redenção por Ele operada, Cristo é o Homem perfeito que traz perfeição à humanidade, isto é central na vida cristã”, afirma.
“Novos e velhos têm de descobrir a força do Evangelho que se traduz no amor indizível manifestado na Paixão do Senhor, de tal forma que a ida à Caldeira, nos seus cerca de quatro quilómetros, tantas vezes feitos descalços, seja preito de gratidão a Deus pelo amor com que Deus nos ama. Desta feita, a Caldeira e o grande amor a este Passo da Paixão de Cristo hão-de tornar-se para a ilha de São Jorge um centro de espiritualidade profunda e formação. Há que aproveitar mais do que nunca”, conclui.
A lenda que deu origem ao culto conta que um pastor deixou o seu gado a pastar, descendo a uma lagoa onde apanhou lapas e amêijoas. Ao parar para descansar contemplou um objecto na água a flutuar e viu que era uma imagem em madeira do Senhor Santo Cristo. Surpreendido com o achado, pegou na imagem, molhada e inchada de estar na água, e levou-a para terra seca. Ao fim do dia, quando voltou para casa fora da fajã, levou a imagem e colocou-a em local de destaque numa das melhores salas da sua casa. No outro dia de manhã a imagem tinha desaparecido. Depois de procurarem por toda a casa e de já terem dado as buscas por terminadas, ele foi de novo encontrado, dias depois, na mesma fajã e local onde tinha sido encontrado da primeira vez. Foi levado várias vezes para o povoado fora da rocha, e durante a noite a imagem voltava sempre a desaparecer, até que alguém disse: “O Santo Cristo quer estar lá em baixo na fajã à beira da caldeira, pois que assim seja”.
A Lenda da Caldeira de Santo Cristo é uma tradição da ilha de São Jorge e relaciona-se com as crenças populares numa terra onde a luta do homem com a natureza foi constante e onde, por séculos, as necessidades básicas do dia-a-dia foram prementes, conforme é referido no sítio da Igreja Açores.