O presidente da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) alertou hoje para o clima de “revolta” e “conflitualidade social” que se vive no país, por causa da crise económica, agravada pela crise política dos últimos dias, com a demissão do primeiro-ministro.
“Para agravar a situação, quando pairava uma expectativa vacilante de eventuais acordos, mesmo que limitados, em setores fundamentais como o da saúde, da educação e outros, a crise surgida nos últimos dias no seio do governo veio trazer novos e sérios elementos de incerteza e preocupação quanto ao futuro de todos, com a possibilidade de agravamento de muitas situações”, indicou D. José Ornelas, no discurso de abertura da 208ª Assembleia Plenária do episcopado católico, em Fátima.
O bispo de Leiria-Fátima apontou a um cenário de tensão, no qual “cresce a frustração e a revolta, especialmente entre os mais vulneráveis, como também a desilusão e a apatia desmobilizadora”.
Segundo o presidente da CEP, este é um “campo fértil para manipulações e messianismos populistas que minam os fundamentos de uma autêntica democracia”.
A intervenção alertou para as dificuldades sentidas no acesso à saúde, educação ou habitação, com aumento do “fosso entre ricos e pobres”.
“Ficou na sombra quem é incapaz de recomeçar, de refazer vidas derrubadas pelo escalar das rendas de casa ou o aumento dos preços dos bens essenciais. Tudo isto fez crescer exponencialmente a conflitualidade social”, advertiu.
D. José Ornelas apelou ao “bom senso e boa vontade de todos”, desafiando os responsáveis políticos a “apresentar propostas e soluções”.
“Sim, o panorama em que nos encontramos comporta muitos desafios, dificuldades, percursos tortuosos e dolorosos. Mas tem igualmente possibilidades e dispõe de meios que é necessário utilizar, com responsabilidade, honestidade e criatividade, para o desenvolvimento do país e para garantir a todos uma vida justa e digna”, declarou.
“Já estão fixadas eleições para os próximos meses. É necessário o apuramento de responsabilidades, mas é sobretudo uma ocasião para discutir os verdadeiros problemas do país e afinar políticas de recuperação e melhoria, especialmente para os que mais estão a sofrer com estas sucessivas crises”.
O bispo de Leiria-Fátima lamentou ainda, “reiterada e profundamente” a legalização da eutanásia e do suicídio assistido pela Assembleia da República, promulgada a 16 de maio de 2023 pelo presidente da República.
“Com a legalização da eutanásia quebra-se o princípio fundamental da inviolabilidade da vida humana e abrem-se portas perigosas para um alargamento das situações em que se pode pedir a morte assistida”, apontou.
Para o presidente da CEP, entrada em vigor desta da lei representa “um claro retrocesso civilizacional”.
“Mantemos a esperança de que possa vir a ser revogada e que a vida humana, que é um dom inestimável, volte a ser valorizada e defendida em todas as suas fases”, acrescentou.
O discurso aludiu ao cenário internacional, num “mundo ferido por crescentes crises e guerras”, os desafios das migrações e das alterações climáticas.
D. José Ornelas mostrou-se particularmente preocupado com as situações na Ucrânia e o mais recente conflito entre Israel e Palestina.
“É preciso dizer que não vale tudo, nem mesmo na guerra, que não se podem usar vidas inocentes como reféns, como escudos ou como objetos de represália e de vingança. É preciso parar, antes de somar novas razões aos ódios e agravos já presentes que só levam a maior destruição e morte”, sustentou.
A Conferência Episcopal Portuguesa está reunida até quinta-feira, em Fátima, para a sua 208.ª Assembleia Plenária, que vai abordar a situação social do país, entre outros temas.
No final dos trabalhos, decorre uma conferência de imprensa, pelas 15h00, no Centro Pastoral Paulo VI.
A CEP, entidade representativa da Igreja Católica em Portugal, é definida pelos seus estatutos como “o agrupamento dos bispos das dioceses de Portugal que, em comunhão com o Santo Padre e sob a sua autoridade, ‘exercem em conjunto certas funções pastorais em favor dos fiéis do seu território, a fim de promoverem o maior bem que a Igreja oferece aos homens, sobretudo por formas e métodos de apostolado convenientemente ajustados às circunstâncias do tempo e do lugar, nos termos do direito’”, como determina o Código de Direito Canónico (cân. 447).
(Com Ecclesia)