Psicóloga proferiu a segunda Conversa na Sacristia, na Igreja de São José e falou da misericórdia a partir da Carta de São Paulo aos Hebreus
A oradora da segunda Conversa na Sacristia, que decorreu esta quinta-feira na Igreja de São José em Ponta Delgada, afirmou que a indiferença diante do sofrimento impede o “sobressalto” social que a Páscoa de Cristo representa.
“Tenho a profundíssima convicção de que Jesus, o mais humanista dos seres, conhece muito bem este sobressalto. Mas nós ainda não” afirmou Renata Botelho Correia a partir de uma interpelação centrada na Carta de São Paulo aos Hebreus.
“Há tanto por cumprir da bondade de Cristo e do seu exemplo na nossa relação com os animais” disse a psicóloga ao propor uma reflexão sobre o cuidado dos mais frágeis, concretamente os idosos e os animais e do cuidado que uns têm pelos outros e que, muitas vezes está para além da cultura da indiferença que pauta a sociedade contemporânea.
“Como me comove e perturba saber que poucas ou nenhumas respostas socais há, neste país, para os idosos que querem envelhecer protegidos e com dignidade, mas juntamente com os seus animais (…) Como aceitar placidamente que são muitas vezes os mais pobres (pobres em comida, em saúde, em alegria) que cuidam e amparam, que dão do nada que têm, que pedem para outros (humanos ou animais) o que já nem pedem para si próprios?” interpelou a oradora para alertar para a ausência de compaixão social que atravessa a sociedade contemporânea.
“Que parte da misericórdia ou da bondade da sua Palavra é que ainda não compreendemos?” interpelou a oradora propondo uma reflexão para falar de “amor, de compaixão, da escuridão da pobreza” e do “sofrimento dos outros, homens e animais”.
Durante a conversa, uma iniciativa da equipa da pastoral da cultura da paróquia de São José, Renata Correia Botelho abordou a temática do sofrimento animal para falar dos “mais frágeis” a partir de uma experiência pessoal.
“Não é, sequer, das variantes mais radicais de defesa dos animais que vos falo. Mas de algo muito mais elementar, da indiferença com que os olhamos, da impassibilidade com que aceitamos que sejam tantas vezes maltratados, até da tortura gratuita e sanguinária que ainda não fomos capazes de banir e que continua a fazer cartaz, para gáudio das gentes, frequentemente sob a égide de santos padroeiros e a pretexto de festividades religiosas” disse.
“Este Cristo que me toca profundamente porque entende a dor dos doentes, dos velhos, dos mais frágeis dos frágeis, que entende a dor dos animais, igualmente frágeis e tantas vezes igualmente doentes, igualmente velhos, também eles os mais frágeis dos frágeis” prosseguiu deixando uma interpelação: “já observaram o desvelo com que os pobres tratam dos seus animais? Já vos aconteceu cruzarem-se na rua com alguém visivelmente pobre que traz consigo um cachorro, ou que alimenta um gato de rua? Ou que simplesmente pede dinheiro para comprar ração? Não vos coloca isto o coração em desordem?”
“Cristo generoso e terno que quero pensar de novo, este Cristo que se entrega, numa infinita compaixão, para poupar e salvar o outro (seja ele animal ou ser humano)”, concluiu.
Renata Correia Botelho nasceu em 1977, em Ponta Delgada, cidade em que vive e onde trabalha como psicóloga. “Jesus chama a si essa dor desmedida”
Na literatura, traduziu, entre outros, Marguerite Yourcenar. Como poeta, tem obra publicada a título individual e em edições colectivas. “Small Song” é o seu último livro de poesia.
As Conversas na Sacristia são Uma proposta de diálogo sobre a vida, a cultura e arte, nas suas diferentes expressões e manifestações, com crentes e não-crentes, em que cada convidado escolherá uma frase ou um texto bíblico, que servirá de pretexto ou de ponto partida para um diálogo na Sacristia da Igreja de São José, em Ponta Delgada.