Festas do Espírito Santo devem ser o exemplo de uma “cultura de proximidade” e de combate “à indiferença”

Vigário Episcopal para São Miguel faz conferência inaugural da XII Edição das Grandes Festas do Divino Espírito Santo de Ponta Delgada

A forma como as Festas do Divino Espírito Santo se organizam e se desenvolvem nos Açores, a partir das Irmandades e de um sentido de “partilha e fraternidade muito fortes” constitui um exemplo de “uma cultura de proximidade que não exclui ninguém”, disse esta quinta feira o Vigário Episcopal para a ilha de São Miguel, na conferência inaugural da XII Edição das Grandes Festas do Divino Espirito Santo de Ponta Delgada, que se realizam este fim de semana.

“Desde a revelação que o Espírito Santo foi derramado por todos, anciãos e novos, senhores e servos, como um dom divino que não está refém de ninguém; revelando um Deus de mãos largas” disse o Padre Cipriano Pacheco sublinhando que a forma como este culto é vivido nos Açores há 500 anos, através da realização das Festas do Divino Espírito Santo “é uma justa interpretação desta mensagem evangélica”.

O sacerdote que proferiu a conferência inaugural das Festas em que a Câmara Municipal de Ponta Delgada se apresenta como “mordoma” do “Império” de Ponta Delgada, reunindo à sua volta as 24 freguesias do concelho, com todas as suas irmandades, centrou a sua intervenção nos aspetos religiosos e doutrinais do culto, lembrando as suas origens. E, a partir daqui, procurou justificar as especificidades destas festas no arquipélago, um dos poucos lugares do país que mantém viva esta tradição.

O facto das festas “emanarem do povo”, que é “sujeito e protagonista” desta “expressão cultural e religiosa”, onde todos têm lugar “e até se mostra uma preferência pelos mais pobres com quem se partilham os bens” associados ao Espírito Santo (o pão, a carne e o vinho); o protagonismo assumido pelos leigos fora do controle da hierarquia eclesial, assumindo a sua condição sacerdotal pelo batismo e a ideia da Casa do Espírito Santo ser a de um irmão e não o templo, “constituem a prova de que o Espírito Santo é de todos”, ressalva o Pe Cipriano Pacheco.

“A simbologia destas festas está muito de acordo com aqueles que têm sido os desafios do papa Francisco no sentido de sermos capazes de ultrapassar uma cultura de indiferença, contribuindo para uma sociedade em que todos tenham lugar, de preferência os mais pobres”, frisou o sacerdote.

O Vigário Episcopal para São Miguel não ignorou as tensões existentes ao longo da história entre o Povo e a hierarquia da Igreja mas preferiu acentuar aquilo que une uns e outros porque “doutrinalmente é a mesma fé, afetiva e próxima, distante de moralismos ou de cultos mais penitenciais”.

De resto, lembrou, também, que sendo esta uma manifestação da religiosidade popular do povo açoriano, “onde a alegria e a partilha dominam” a igreja “não pode demitir-se de a acompanhar”, conciliando-a com a “religiosidade oficial”.

“A evangelização destas festas nunca poderá ser vista como uma critica à forma como se organizam nem como uma tentativa de controle ou domínio clerical, mas como um regresso à sua essência e à prática dos valores evangélicos”, resistindo “à tentação de fazer destas festas apenas um cartaz turístico ou etnográfico”.

A XII Edição das Grandes Festas do Divino Espírito Santo de Ponta Delgada arrancou ontem à noite. Antes da conferência as boas vindas foram dadas pelo Pe Nemésio Medeiros, pároco da Matriz de Ponta Delgada, paróquia que acolhe este “império”.

“É um momento de partilha e de valorização da dignidade humana que acolhemos todos os anos com muito gosto procurando dignificar ao máximo o espírito evangélico subjacente a estas festas” disse o sacerdote.

Também o Cónego João Maria Brum, pároco de São Pedro, uma das paróquias que alternadamente “empresta” o seu grupo coral à animação da Missa da Coroação(no domingo), juntamente, com as paróquias da Matriz, de São José e de Santa Clara, lembrou a importância deste culto, a festa que lhe está associada e, sobretudo, a fé no Espírito Santo “como sendo o grande obreiro de tudo na vida”.

Durante a sessão que terminou com um concerto da Banda Militar dos Açores, em parceria com o Conservatório Regional de Ponta Delgada, ainda falou o Presidente da Câmara Municipal que deu as boas vindas a estas festas, sublinhando a sua dimensão sobretudo “afetiva” que “liga Ponta Delgada ao resto do mundo neste dias onde quer que esteja um açoriano”.

Hoje realiza-se a procissão da Mudança da Bandeira do Divino do Centro Municipal de Cultura para o salão nobre dos Paços do Concelho, onde está instalado o “Quarto” do Divino Espírito Santo que, para além da Coroa da Câmara, tem expostas cerca de cem coroas de todas as irmandades dos vários impérios do Concelho; segue-se a bênção da “Despensa” e a “arrematação” do pão e da massa sovada das diferentes freguesias.

Amanhã, sábado, distribuem-se 37 pensões pelas Instituições Particulares de Solidariedade Social e servem-se as sopas do Espírito Santo, no campo de São Francisco.

À tarde há o cortejo etnográfico e no domingo a Missa, a Coroação e o Bodo de Leite, nas Portas da Cidade.

Scroll to Top