Por Renato Moura
A propósito da peça “Contabilidade de gaveta”, partilhada a semana passada, um amigo questionou-me pelo facto de eu me ter referido à gestão, ou falta dela, de pequenos empresários privados e não referir os responsáveis a outros níveis. Bem observado. Quem já não é novo sempre se recorda de ser confrontado com situações improváveis, no tempo e na circunstância.
Há uns anos uma provedoria de uma Santa Casa da Misericórdia estava feliz com a sua gestão, com base no facto de o saldo da conta bancária ter aumentado! Nem explicando se convenceu que a gestão se avalia pela contabilidade.
Também um presidente de câmara municipal se prezava com o saldo bancário, esperando em fim do mandato ficar famoso com esse “brilharete”! E há quem decida vender tudo quanto pode duma entidade pública, pagando apressadamente dívidas, ou juntado dinheiro; mas desprotegendo interesses públicos! Há quem não perceba que se pode legar aos vindouros muito dinheiro, mas ainda assim deixar o futuro estruturalmente comprometido. Há erros crassos que fazem instituições perder dezenas de milhar de euros!
Hoje existem planos oficiais de contabilidade próprios para cada tipo de actividade, seja privada ou pública, muitos de aplicação obrigatória, outros facultativos, criados para fornecerem todos os elementos indispensáveis à compreensão da situação em cada momento e por confronto com períodos ou anos anteriores.
Naturalmente quem assume as principais responsabilidades em entidades públicas, em instituições de solidariedade, na Igreja, em associações, em colectividades, deveria ter conhecimentos que lhe permitissem perceber a contabilidade, para dela retirarem boas indicações e tomarem as melhores decisões. Mas não tendo essa habilitação era pelo menos indispensável terem sensibilidade para ouvirem os contabilistas e técnicos habilitados e deles obterem explicações úteis, capazes de facilitar a escolha das opções certas.
Infelizmente constata-se que o poder cada vez sobe mais à cabeça. À beira de cinquenta anos de democracia não se entende como é que um presidente – ou principal dirigente – não suporta ouvir opiniões contrárias e se amofina (para não dizer enfurece) quando é criticado pelo que fez ou por não ter agido.
Obviamente que é importante não ter a conta bancária a zero. Contrair dívida até pode ser justificável, se for para o investimento certo. Mas não é aceitável que com pessoal e instrumentos disponíveis se continue a gerir a olho. Quando se gere o que não é nosso, o cuidado e o rigor têm de ser supremos.