Pe Ricardo Henriques sublinha importancia das TICs mas lembra a necessidade da igreja oferecer “critérios de leitura” que “em papel tem outra marca”
A menos de 24 horas do inicio das Jornadas Diocesanas de Comunicação Social, promovidas no âmbito das comemorações do centenário do jornal A Crença, de Vila Franca do Campo, o responsável pela Pastoral das Comunicações Sociais da Igreja, na diocese de Angra avança ao Sítio Igreja Açores que a Comunicação Social “é um espaço de partilha e de evangelização”, que numa diocese descontinua, “ganha uma importância acrescida” e por isso “é importante ter um jornal”, embora reconheça que os critérios “financeiros sejam os que mais pesam”. Aborda a passagem de um jornal paroquial- A Crença- a jornal de ilha, mas lembra que um diocesano “é melhor ainda”.
Sítio Igreja Açores- O Serviço Diocesano que dirige vai realizar umas jornadas de comunicação social, que acontecem numa altura em que A Crença celebra 100 anos. O que é que se pretende com este encontro, momento propicio ao debate?
Pe Ricardo Henriques- Estas jornadas surgem por ocasião do primeiro centenário da Crença, o que só por si já, claramente, é assinalável e merecedor de ser celebrado. É uma iniciativa conjunta do jornal e do Serviço diocesano das Comunicações Sociais. Sem dúvida que é uma oportunidade para o debate e partilha de ideias que façam luz sobre o futuro da comunicação social da diocese, particularmente os jornais. A comunicação social é sempre um espaço de partilha e evangelização e actualmente o que não aparece não existe, pelo menos, não tem relevância pública. Em razão disso, estas jornadas fazem todo o sentido.
Sítio Igreja Açores- Os media da Igreja, e foram muitos, foram verdadeiras escolas de formação de profissionais da comunicação social. O que é que falhou para todos os outros jornais se irem aguentando e os da igreja falecerem?
Pe Ricardo Henriques- Os jornais da diocese fecharam portas claramente por razões económicas, porque não tinham capacidade de subsistir por si mesmos como empresas, as quais eram apoiadas por dinheiros públicos, como todos os outros jornais, mas esses apoios diminuíram substancialmente e por isso as empresas tornaram-se inviáveis. Durante anos a Diocese foi um suporte financeiro para que se pudessem manter mas chegou uma altura em que os responsáveis apreciaram e verificaram que eram inviáveis do ponto de vista económico, até porque a situação financeira da diocese é sempre deficitária. Essa vertente é aquela que mais pesa certamente.
È evidente que nestes 40 anos de regime político com liberdade de expressão muitos jovens começaram as suas actividades jornalísticas nos jornais diocesanos e aprenderam com sacerdotes que eram mestres na língua portuguesa e os efeitos dessas escolas felizmente ainda perduram hoje em vários meios de comunicação social públicos e privados.
Sítio Igreja Açores- Os Media de inspiração cristã no arquipélago têm uma expressão reduzida, já se disse. Os dois jornais impressos são quase paroquiais. Resta o Sítio Igreja Açores, que infelizmente deixa muita gente de fora ou porque não tem computador ou porque não acede à internet, ou porque não tem imprensa generalista que reproduza as notícias ali publicadas. Faz falta mais um jornal nos Açores, que seja marcadamente de inspiração cristã e possa fazer a diferença?
Pe Ricardo Henriques- Estranhamente ou não, a Igreja nos Açores nunca teve um jornal que se expandisse a toda a diocese. Apesar de estarmos numa época em que a circulação de informação é de uma grandeza tal que não há controlo sobre as possibilidades que ela representa, eu sou de opinião que era bom haver um jornal, uma publicação diocesana que fosse informativa e formativa, com opiniões construtivas, que fizesse a leitura cristã das realidades, à qual todos os católicos pudessem ter acesso nas suas casas. Penso que uma publicação dessa natureza poderia oferecer critérios diferentes na valorização dos acontecimentos, numa leitura inspirada pela Doutrina Social da Igreja que iluminasse as realidades temporais onde cada pessoa dá o seu contributo para a construção da História.
Sítio Igreja Açores- A Crença faz cem anos. O seu diretor e o Senhor Bispo já manifestaram publicamente interesse em que o jornal fosse um jornal de ilha. Faz sentido, no contexto atual, esta transformação?
Pe Ricardo Henriques- Apesar de cada pessoa hoje se sentir «jornalista» (“jornalismo de cidadão”) porque pode escrever livremente nas redes socias, e estas até são notícia nos órgãos generalistas, sobretudo na TV, é minha opinião que é melhor ter uma publicação de ilha do que não ter nada, tanto mais que S. Miguel tem a maioria da população da diocese. A questão que muitos se colocam e eu também coloco é esta: se não houve dinheiro para manter A UNIÂO em Angra (que quase não passava de um jornal de ilha, é verdade), vai haver dinheiro para transformar um jornal local num jornal de ilha? Aí entram as questões financeiras que me ultrapassam completamente. Em linha de princípio a ideia de jornal de ilha é óptima, mas a de um jornal diocesano é melhor ainda, porque a diocese são nove ilhas, e o Sitio Igreja Açores não entra em todas as casas, como a introdução da pergunta anterior constatava e bem.
Sítio Igreja Açores- Olhamos para a Ecclesia e vemos todos os dias produtos novos: escritos, na rádio, na televisão… Um projeto destes seria exequível na diocese de Angra?
Pe Ricardo Henriques- As plataformas digitais oferecem possibilidades quase infinitas, mas uma publicação em papel tem outra marca, é um registo que permite a releitura e a reflexão sobre os textos produzidos, e o seu papel formador é fundamental. Aliás, eu penso que faz parte da missão da Igreja oferecer critérios de leitura e de manuseamento livre, mas responsável e controlado, aos pais e educadores, para que crianças e adolescentes acedam às Novas Tecnologias de Informação como um contributo positivo no seu processo educativo e não como uma causa em que nada se articula. Se pensarmos no insucesso escolar que resulta dos gastos exagerados de tempo no computador penso que há aqui um campo imenso de reflexão para ensinar a ter critérios de escolha que sejam válidos e com outro nível de responsabilidade.