Em Junho de 1967, Israel atacara, em apenas seis dias, os Estados da Síria, Egito e a Jordânia.
Em Outubro, Che Guevara fora capturado e executado na Bolívia. No mesmo ano, a guerra fria continuava ameaçadora e angustiante. A guerra do Vietname prolongava-se há mais de 10 anos, sugando à América os seus jovens militares, sem fim à vista. O mundo juvenil imitava e fazia a cultura hippie, ao som dos Beatles, e preparava-se para uma revolução cultural, que viria a acontecer em maio do ano seguinte. Época de exageros, feitos de sonho e ingenuidade. Gritos de liberdade num mundo nunca tão acelerado e de uma paz constantemente ameaçada. Portugal, empalidecido pela ditadura, tentava reerguer-se aos tons de uma primavera marcelista e entusiasmado pelos ventos europeus. Sonhava-se com o fim de um regime que não acabaria de imediato.
A Igreja vivia o entusiasmo e o fervor dos primeiros anos do pós Concílio Vaticano II. Caíam ritos e leis antigas. Respira-se o ar novo do Espírito Santo, que aquece e desconcerta. Perdem-se paulatinamente as seguranças do passado. As estruturas tremem, grande número de sacerdotes abandona o ministério, os leigos tornam-se protagonistas, a Igreja abre-se ao mundo… É neste contexto, louco e imprevisível, que, no dia 8 de Dezembro, Paulo VI cria o Dia Mundial da Paz, a celebrar pela primeira vez no dia 1 de Janeiro de 1968.
O apelo de Paulo VI, revisitado 46 anos depois, enche-nos de emoção. O seu conteúdo continua tão próximo. “Dirigimo-nos a todos os homens de boa vontade, para os exortar a celebrar o Dia da Paz, em todo o mundo, no primeiro dia do ano civil… Desejaríamos que depois, cada ano, esta celebração se viesse a repetir, como augúrio e promessa, no início do calendário que mede e traça o caminho da vida humana no tempo que seja a Paz, com o seu justo e benéfico equilíbrio, a dominar o processar-se da história no futuro… Especialmente para nós, seguidores de Cristo, tenha a grande ideia da Paz o seu «Dia» solene, no princípio do novo ano de 1968. Com efeito, nós os que cremos no Evangelho, podemos enriquecer esta celebração com um maravilhoso tesouro de ideias originais e potentes: como, a da intangível e universal fraternidade de todos os homens, a qual deriva da única, soberana e amabilíssima Paternidade de Deus…”.
Este gesto tornou-se verdadeiramente profético e repetido ininterruptamente até ao presente. O mundo civil aderiu e deu-lhe credibilidade. Em cada ano, o Papa revive o mesmo desejo de paz, decifrando as cores que a pintam. O desafio é constante e urgente, correndo o risco de fazer cansar, mas isso não enfraquece a sua necessidade!
Não deixemos que os discursos e as comemorações nos façam indiferentes daquilo que nos querem dizer. “Já não escravos, mas irmãos”. Eis o tema que o Papa nos convida a refletir e a viver este ano!
Pe Hélder Miranda Alexandre