Delitos contra a vida, a dignidade e liberdade

 

Igreja Açores

Por Renato Moura

A imagem que ficou da conferência de imprensa resultante da última reunião da Conferência Episcopal Portuguesa, a propósito dos abusos sexuais de menores, foi muito má para as vítimas, para as pessoas em geral, para os fiéis em particular, para a Igreja e até para a generalidade dos bispos.

Tenho bons motivos para acreditar que D. José Ornelas se bateu pelo processo de purificação e conversão da Igreja. Por experiência própria conheço a dificuldade que se enfrenta quando temos – por dever de função – de falar em nome de maiorias, principalmente se delas não fizemos parte. Creio que a sua opinião e sensibilidade pessoal não serão conforme a imagem decorrente da conferência, onde se percebeu a amargura de tentar fazer a quadratura do círculo.

Outras declarações da hierarquia – Cardeal Clemente também – só contribuíram para agravar. O que sentirão as vítimas, as quais finalmente tiveram coragem e acreditaram na Comissão em quem a Igreja disse depositar toda a confiança e agora se deixou parecer que a validação dos seus testemunhos de pouco ou nada serviria?! Fosse por intenção ou ambiguidade, deixou-se parecer não se poder afastar ou proibir de exercício do ministério, clérigos alvo de denúncias, com risco de continuação da actividade criminosa, influência de testemunhas ou destruição de prova!

A ninguém é permitido sentar-se no poder terreno da Igreja, mesmo arrimando-se a um qualquer Código, sem a menor base no Evangelho! É que os bispos também podem ser destituídos!

Acredito, todavia, que muitos bispos portugueses, tal como o Papa, considerarão não bastar pedir perdão, mas agir na organização de processos que levem à aplicação da justiça, tomando imediatamente as medidas no sentido de evitar a repetição dos crimes. Terão de o demonstrar. E terão de se aplicar regras comuns em todas as Dioceses.

Registo, a propósito, com concordância e apreço as declarações do Bispo de Angra, logo após o conhecimento do Relatório da Comissão Independente, de “profunda vergonha e até dor, que não se compara em nada com a que será a dor das vítimas”, considerando que só “o pedido de perdão às vítimas é pouco coisa”.  Afirmou ainda “o que queremos é que não volte a acontecer” e declarou “tolerância zero”. E nos Açores deu exemplo abrindo processos e impedindo do exercício público do ministério dois padres. Aliás, nem por isso perdem o direito à sua defesa. A justiça aplicar-se-á: pelas vítimas; e a todos.

Atentar contra menores não é um erro, é um delito contra a vida, a dignidade e liberdade do homem.

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