Por Carmo Rodeia
“Quem a Deus tem, Nada lhe falta: Só Deus basta”. A frase de Santa Teresa de Ávila dá corpo a um dos cânticos de Taizé, que ouço quase diariamente, e que faz para mim, cada vez mais sentido. E hoje, em busca do tema para este Entrelinhas, depois de postar o essencial da homilia do Papa Francisco na Missa de Santa Marta, na qual apelou aos católicos para prepararem este Natal com a “coragem” da fé, evitando a superficialidade- “Fé em Ti, Senhor”, disse Francisco- deu-me vontade de escrever sobre este assunto. Não numa perspetiva teológica porque não tenho conhecimentos para tal, nem sequer numa perspetiva moralista, para a qual não há paciência, mas porque é algo que se torna cada vez mais essencial. Pelo menos para mim. E, entretanto, o cântico de Taizé prossegue, pedindo de empréstimo as palavras a Santa Teresa: Nada te perturbe/ Nada te espante/Tudo passa/ Deus não muda/A paciência tudo alcança/Quem a Deus tem/ Nada lhe falta/Só Deus basta”. E lá para o fim relembra “Quem a Deus tem/ Mesmo que passe por momentos difíceis/Sendo Deus o seu tesouro/ Nada lhe falta/SÓ DEUS BASTA!”.
Julgo que há quatro anos, justamente nesta altura, quando num encontro de Natal no Vaticano o Papa falou das 15 doenças que afetavam a Igreja, uma delas era a auto-referencialidade, a que acrescento de modo próprio a auto-suficiência, tão perniciosa quanto a primeira porque nos dá a sensação de que somos super-homens e super-mulheres que não precisamos de nada nem de ninguém. Já me aconteceu tantas vezes, sobretudo quando acho que estou de bem com a vida. E depois lá vem o tropeção e suplicamos a Deus e percebemos a nossa pequenez. Por vezes são mesmo necessários vários tropeções para percebermos o essencial: que a fé não é uma ideologia mas uma experiência, e que a nossa vulnerabilidade não é um defeito de fabrico mas uma condição essencial da nossa vida.
Talvez seja esta perceção aos 51 anos que falta aos jovens, como os meus filhos, que acham que tudo isto é “uma espécie de beatice”. A verdade, porém, é que esta consciência de vulnerabilidade faz-nos sair de nós próprios e coloca-nos perante uma pergunta fundamental posta também por Deus: onde está o teu próximo, igualmente vulnerável como tu? Onde e como o podes ajudar e completar?
Todos os dias sinto que não há fórmulas mágicas para chegar a Deus, nem receitas miraculosas que nos ditem o caminho. Apenas acompanho o que ouvi uma vez de viva voz ao então padre e agora arcebispo D. José Tolentino Mendonça: precisamos de nos reconciliar com o tempo para podermos olhar o modo como o simples da vida se torna uma epifania de Deus, que se dá a ver no mais ordinário dos nossos gestos do quotidiano.
E já que estamos à espera, como nos aconselha o Advento, que esta espera não seja tempo de imobilidade mas que se faça caminho para palmilhar e ir ao encontro Do que nos deve bastar.