Duas católicas olham para a importância do feminino na sociedade e na Igreja
A prática da exortação apostólica «A Alegria do Evangelho», do Papa Francisco, é para Maria Teresa Vasconcelos o caminho que vai permitir a Igreja olhar de forma diferente para as mulheres.
“Se a Igreja quiser pôr radicalmente em ato a exortação apostólica do Papa, necessariamente vai emergir uma outra posição da Igreja em relação às mulheres”, afirma a professora aposentada, membro da direção do GRAAL à Agência ECCLESIA.
No âmbito do Dia Internacional da Mulher, que desde 1977 se assinala a 8 de março, a Ecclesia procurou perceber junto de duas católicas que olhar pode o feminino trazer à sociedade e à Igreja.
De acordo com a psicóloga Maria José Vilaça a mulher, na tentativa de “se tornar igual em tudo ao homem”, “esqueceu-se do que lhe é específico”.
“O corpo da mulher é um corpo que acolhe e o homem tem um corpo que dá. A consequência disto está na forma como nos relacionamos. Como mulher, compete-me acolher a vida dos outros e afirmar o seu valor”, afirma a presidente da associação de psicólogos católicos.
Para Teresa Vasconcelos, a “biologia” marca a “especificidade” da mulher, traduzindo uma maternidade que não implica “dar à luz um filho”.
“Nunca tive filhos, com pena, mas ao mesmo tempo muito contente com a vida que tive, sentindo que a maternidade se realiza de muitas maneiras. E na certeza de que, enquanto mulher, o meu contributo foi específico”, traduz a membro do movimento GRAAL.
Para a professora, a paridade “faz sentido” enquanto “justiça social, dignidade humana e oportunidades para todos”.
Maria José Vilaça gostaria de ver a mesma vontade em afirmar o “específico da vocação feminina”, tal como há anos atrás “se lutou pelo voto e por direitos iguais no mercado de trabalho”.
A especificidade feminina é notada pelas duas mulheres, escutadas pela ECCLESIA, na espiritualidade.
“A mulher, talvez porque tem mais consciência da sua fraqueza física, está mais apta a colocar-se como dependente de Deus. É uma forma de estar na relação com Deus que a Igreja pode aprender das mulheres, mas para isso tem que a reconhecer também”, explicita Maria José Vilaça.
Para Maria Teresa Vasconcelos, a mulher, “eventualmente por causa do seu corpo e da sua ligação à terra”, de uma “característica imanente que é o cuidar das coisas vivas”, tem “a nível espiritual, um grande contributo a dar à Igreja”.
De acordo com a psicóloga, “as mulheres apenas pedem à Igreja que as deixem ser mulheres”.
“As mulheres que eu conheço preocupam-se em afirmar o valor da Igreja e afirmar Deus através do seu trabalho e isso é que é o que é característico feminino. Não estão à procura de vitórias suas ou de lutas de poder, mas de afirmar um Outro, sempre”.
Maria Teresa de Vasconcelos gostaria que a Igreja “escutasse de forma atenta e em profundidade as mulheres”.
A professora aposentada aponta “excelentes teólogas” que estão a contribuir “de forma decisiva” para ajudar a mudar uma “teologia mais tradicionalmente praticada pelos homens” e afirma o desejo de uma Igreja “menos hierarquizada”: “Não me interessaria ter mais poder do que o que tenho nas estruturas presentes que são extremamente hierarquizadas e onde as questões da paridade muitas vezes terminam com uma palavra dogmática dizendo que nada vai mudar”.
Para Maria Teresa de Vasconcelos não é a instituição do sacerdócio feminino e a simples paridade que vai mudar as estruturas: “As estruturas mudarão se as mulheres, depois de uma profunda reflexão, também ética, sobre si mesmas, exercerem as suas funções de forma diferente e específica”.
Neste momento, o número de mulheres a trabalhar nas instituições da Cúria Romana e do Estado da Cidade do Vaticano aumentou em 90% nos últimos dez anos, revelou o departamento de pessoal da Santa Sé.
As mulheres representam cerca de 20% do total de funcionários ao serviço do Papa no Estado da Cidade do Vaticano, um aumento de sete pontos percentuais face a 2004 (13%).
A presença feminina na Santa Sé inclui responsabilidades nos departamentos da Cúria Romana e nas áreas dos arquivos, da história e da comunicação social.
Os organismos centrais de governo da Igreja Católica têm duas subsecretárias, ambas italianas: a irmã Nicoletta Spezzati, da Congregação para os Institutos de Vida Consagrada, e a leiga Flaminia Giovanelli, do Conselho Pontifício Justiça e Paz.
Segundo a Rádio Vaticano, a primeira mulher a ser empregada por serviços da Santa Sé foi Anna Pezzoli, em 1915, e a sua presença tornou-se mais notória após o Concílio Vaticano II (1962-1865).
O Dia Internacional da Mulher vai ser assinalado com a segunda edição da iniciativa ‘Vozes de Fé’ (Voices of Faith), na ‘Casina Pio IV’, do Vaticano, com transmissão em direto no site www.voicesoffaith.org.
O evento que vai reunir “mulheres católicas extraordinárias de todo o mundo” no trabalho/serviço “aos pobres, a defesa da dignidade humana e promover a igualdade”.
Durante a iniciativa, a confederação internacional da Cáritas vai entregar o prémio ‘Mulheres, Semeadoras de Desenvolvimento’, oferecendo 10 mil euros à Cáritas na Nicarágua, que promove um projeto de desenvolvimento agrícola, e à cooperativa ‘Basmeh Zeitooneh’, no Líbano, que ajuda refugiadas da Síria e da Palestina.
CR/Ecclesia