Por Renato Moura
Alguns analistas, ao tentar descortinar consequências eleitorais de maiorias de direita ou esquerda, ficam-se por análises económicas e algumas poucas sociais. Mas há objectivos e caminhos distintivos de esquerda e direita. Instigam-nos a pensar que as ideologias já não interferem. O carácter distingue as decisões. Não são todos iguais.
Tratando-se de certos valores e princípios as consequências são bem diferentes: atente-se na legislação dos últimos anos da tão propalada maioria de esquerda. Ainda agora e à pressa, antes da dissolução oficial do Parlamento, usando (ou abusando) da composição parlamentar de esquerda, desfeita e sem força para suportar o Governo, se voltou a tentar legislar sobre eutanásia e suicídio medicamente assistido.
O Presidente da República não promulgou o decreto, com base em extensa e sólida fundamentação, cuja apreciação se aconselha. Um anterior decreto sobre o tema já tinha sido devolvido com base em acórdão do Tribunal Constitucional.
O decreto agora votado, refere o Presidente da República, “aproveita para aditar novas normas, que suscitam inesperadas perplexidades” e explica: “o novo texto do diploma ora usa «doença grave ou incurável», o que quer dizer uma ou outra, ora define aquela como grave e incurável, o que quer dizer, além de grave, também incurável, ora usa «doença grave e fatal», o que quer dizer que, além de grave e incurável, determina a morte”.
Nove meses depois parece evidente ter-se optado agora por uma solução mais radical e drástica, descartando protestos da sociedade e pareceres abalizados fundamentados, o que leva justamente o Presidente a inquirir os deputados: como antes se exigia doença fatal e se passaria agora a dispensar tal exigência?
Está-se perante uma matéria de valores e da mais alta sensibilidade: está em confronto a protecção da vida humana e a liberdade de autodeterminação. Ao contrário do que aconteceu em 2019, importa que os partidos e os candidatos obtenham a clarificação sobre a sensibilidade da população. E é crucial que, tendo em conta o sentimento dominante, assumam os seus compromissos futuros com clareza.
Mesmo sem ter em conta convicções religiosas, ultimamente, em muitas matérias, nas quais se exigia uma visão humanista da vida, está-se a manipular – até sob a manta alegadamente educativa –, a intoxicar, a empurrar para um delírio ideológico com consequências cívicas e morais, umas já palpáveis, outras imprevisíveis!
Que a aspiração por direitos sem limites, não espezinhe valores que também são um direito.