Padre Ricardo Pimentel é um dos que não aderiu à celebração da Eucaristia com transmissão on line
Em isolamento total desde que foi decretada a cerca sanitária ao concelho da Povoação há três dias, o padre Ricardo Pimentel, diz-se “tranquilo”, “disponível” e “próximo, muito próximo de todos”.
Numa breve conversa com o Igreja Açores, o sacerdote que é ouvidor da Povoação e, pároco das Furnas, uma das freguesias mais movimentadas do concelho por ser uma atração turística, sublinha que está presente na vida da comunidade, através da oração e da celebração da Eucaristia, mas é dos poucos padres que não aderiu às redes sociais para “levar” a Eucaristia até à comunidade.
“Celebro a Missa de manhã, como sempre gostei, mas não o faço por motivos pastorais e para melhor servir as pessoas. Devo ser dos poucos que não aderi à esquizofrenia de transmissões por opção” reconhece, sublinhando que prefere que as pessoas “façam e encontrem o silêncio e formas de orar em família; prefiro que redescubram a essência de serem verdadeiras `igrejas domésticas´ e protagonistas dentro dos seus lares. A meu ver, já existiam celebrações muito boas em conteúdo e liturgia”.
“Encontro-me, tal como todos os cidadãos, em isolamento total devido à cerca sanitária decretada ao concelho da Povoação. Estou tranquilo e vivendo, ainda mais, a profunda solidão que vem do facto de ser padre. Tenho tempo para rezar, para ler, ver televisão, falar com a família e amigos mais próximos. Sinto que desta vez estou mesmo a fazer Quaresma a sério. Tem sido uma oportunidade para fazer um grande retiro”, diz ainda.
No entanto, o isolamento a que está confinado não o impede de estar próximo.
“Sinto-me próximo, muito próximo de todos, atento e disponível. Já fiz chegar a todos estes sentimentos. Com os meus colegas é mais fácil contactar e já o fiz várias vezes, até porque alguns, mais do que colegas são meus amigos. Com os meus irmãos das comunidades, estou presente na sua vida através da oração e celebração da Eucaristia”, garante.
“Embora, devido ao distanciamento social não nos seja possível o encontro físico, não têm faltado mensagens e telefonemas. Todos sabem que estou aqui na casa da igreja. Estou com todos. Tenho seguido a velha máxima: `mais vale uma recomendação a Deus do que um turbilhão de palavras´”, avança, por outro lado.
E, na Semana Santa, que começa no próximo domingo com a celebração do Domingo de Ramos, não alterará nada do seu esquema, pois o isolamento “tem servido para soprar o pó da rotina”.
“Tenho a certeza que este ano a Semana Santa e a Páscoa será bastante mais íntima e, por isso mesmo, mais profunda do que o costume” afirma; “será celebrada sem estarmos em comunidade; será celebrada em família, em igreja doméstica. Celebrarei cada dia do Tríduo Pascal com as intenções de cada pessoa destas paróquias em cima do altar. Nas outras comunidades não sei como celebrarão a Páscoa, mas julgo que não haverá grandes nuances”.
O sacerdote, que é pároco das Furnas, local que nesta altura do ano é visitado por milhares de pessoas que escolhem os Açores e a ilha de São Miguel, em particular, para passar as férias da Páscoa, elogia a atitude dos locais e enaltece a paciência, como uma virtude deste tempo.
“Noto, com muita satisfação, que se está a respeitar o confinamento obrigatório. As ruas estão vazias e a habitual agitação desapareceu. Vejo apreensão, não desespero; receio, não falta de esperança. As pessoas estão com as suas famílias aguardando dias melhores”, avança.
O isolamento social continuará ainda uns dias na primeira semana da Páscoa. O sacerdote deixa uma mensagem: que se aproveite este “tempo de deserto para encontrar o essencial”.
“Embora sem o rebuliço habitual, que nos ajuda a viver os momentos de festa, será bela a manhã de Páscoa, porque nos traz a notícia da Ressurreição de Jesus. A cruz dará para sempre lugar ao túmulo vazio e a morte fugirá sempre diante da vida” afirma.
“Nestes momentos de aparente escuridão, há certas palavras de Jesus que voltam a ter um novo sabor na nossa boca; tenho repetido, todos os dias, o pedido dos discípulos de Emaús e nunca me fez tanto sentido como agora estas palavras: “fica connosco Senhor, porque anoitece.” Cada vez que as repito encontro mais paz”, conclui com a promessa de que “estamos todos unidos na oração e no silêncio”.
As autoridades de saúde dos Açores colocaram o concelho de Povoação em cerca sanitária, por causa da pandemia de Covida-19 no passado dia 29. Só entra quem reside no concelho e fica obrigado a permanecer em quarentena durante duas semanas.
O concelho de Povoação tem seis mil habitantes e seis freguesias, onde se inclui as Furnas, o ex-libris turístico da maior ilha dos Açores.
Tiago Lopes, responsável pela Autoridade de Saúde Regional dos Açores justificou a medida com o argumento de que “há uma clara transmissão local” em função dos casos positivos que foram identificados, daí a opção pelo cordão sanitário na Povoação.
O responsável referiu que se pretende desta forma “conter a população, identificar os casos próximos e proceder à respetiva colheita de amostras” para posterior análise laboratorial.
Esta situação já tinha sido ponderada no primeiro caso suspeito nos Açores, na ilha Terceira. No caso concreto de São Jorge, também esteve em cima da mesa esta possibilidade, como, mais recentemente, também no caso de São Mateus, também na ilha Terceira. Ao contrário do que acontece na Povoação, derivado ao trabalho que se fez, logo de imediato, de identificação dos contactos próximos dos casos positivos, o seu número não justificava uma paragem da normal circulação daquelas comunidades, explicou ainda.
Até ao momento Santa Maria, Corvo, Flores e Graciosa são as ilhas onde não existe qualquer caso confirmado de COVID-19.